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Crise argentina ameaça comércio já desaquecido com o Brasil

De janeiro a junho deste ano, as exportações do Brasil para a Argentina caíram 19,8% 

Economia|Da Agência Brasil

A perspectiva de aprofundamento da turbulência econômica na Argentina, caso se confirme a possibilidade de um novo calote da dívida externa do país, causa apreensão pelos efeitos que pode trazer para o Brasil. De acordo com analistas, uma reedição do default de 2001 traria desconfiança e restringiria ao extremo o crédito para os argentinos.

O financiamento de exportações e importações seria prejudicado. Haveria piora de uma situação já evidenciada há alguns meses na balança comercial brasileira: a retração no fluxo comercial com o país vizinho, um dos principais parceiros do Brasil, e dificuldade em compensar, direcionando as vendas para outros mercados.

Após o calote de sua dívida há 13 anos, a Argentina renegociou com 93% dos credores No último dia 26, o país depositou US$ 1 bilhão destinados a pagar quem aceitou a reestruturação. Entretanto, o juiz norte-americano Thomas Griesa ordenou a restituição da verba ao país, entendendo que os argentinos devem pagar primeiro a fundos especulativos, conhecidos como fundos abutres, que reclamam 100% do valor nominal dos títulos.

Para evitar um novo default, os argentinos precisam negociar com esses fundos. Griesa nomeou um mediador para acompanhar o diálogo.


Na última quinta-feira (3), a Organização dos Estados Americanos aprovou uma declaração de respaldo à posição argentina, destacando que a intervenção judicial no processo de reestruturação da dívida de um país soberano traz instabilidade ao sistema financeiro internacional.

O documento não foi apoiado pelos Estados Unidos e o Canadá. O Brasil é favorável à Argentina. O chanceler argentino, Héctor Timerman, discursou no encontro, afirmando que o país negociará com os credores, mas “não abandonará seu povo para favorecer os fundos abutres”.


Caso não se alcance uma solução negociada e haja default, a relação da Argentina com instituições financeiras e parceiros comerciais será penalizada. Ex-secretário de Comércio Exterior, Walber Barral, da Barral M Jorge Consultoria, falou sobre o assunto.

— Em um país que está em default, os bancos são mais resistentes a abrir linhas de crédito. O custo, por exemplo, de financiamento de exportações, ficará mais caro.


Já o acrescenta presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, José Augusto de Castro, acrescentou.

— Empresas terão dificuldade em receber por eventuais exportações [para a Argentina]. Vão exigir que as vendas sejam feitas a partir de pagamentos antecipados.

Segundo Castro, em um cenário de calote, o Brasil sentirá diretamente os efeitos. Ele ressalta que a dificuldade em vender industrializados para mercados como os Estados Unidos e a União Europeia está principalmente no preço elevado. No Mercosul, as tarifas mais baixas permitem valores competitivos, mesmo com custo alto de produção no Brasil.

— A Argentina é o principal destino dos manufaturados [brasileiros]. Um total de 50% [desses produtos] vai para a América do Sul, principalmente a Argentina. [O Brasil] não tem competitividade para exportar para outros mercados.

Na avaliação de Castro, as elevações nas exportações brasileiras para os EUA, que subiram em nove dos últimos 12 meses, e a mais recente recuperação nas vendas para a União Europeia, não significam necessariamente que o Brasil esteja conquistando mais fatias desses mercados.

— No caso dos Estados Unidos, o principal responsável foi a venda de aviões de dois, três, até cinco anos atrás. Até maio, [a comercialização de aviões] cresceu 223% [em relação ao mesmo período de 2013]. Não é coisa que se venda de forma contínua. No caso da União Europeia, [uma eventual] recuperação econômica [do bloco] ajuda, mas não temos preço para participar desse mercado.

Em um cenário de incertezas, Walber Barral e José Augusto de Castro concordam que o acordo automotivo renovado recentemente entre o Brasil e a Argentina ajuda a diminuir a insegurança. Barral diz.

— O acordo automotivo foi extremamente importante para dar previsibilidade a esse mercado.

“O acordo não tem nada de novo, mantém o ritmo [do comércio]. Se não houvesse [renovação], [o setor] teria forte impacto”, acrescenta Castro.

O acordo, por si só, no entanto, não resolve os problemas do setor automotivo, que já sofre há algum tempo com a queda da demanda de consumidores por veículos, tanto do lado brasileiro quanto argentino. A Argentina também impôs restrições à compra de dólares no país, o que tem afetado o comércio bilateral de maneira geral.

Assim, na hipótese de não haver calote, as perspectivas para as relações comerciais entre o Brasil e a Argentina melhoram, mas permanece o cenário de desaquecimento na economia argentina. Walber Barral comenta o cenário.

— Há uma expectativa do mercado de que haja acordo. [Mas] a balança comercial [com os argentinos] vem caindo desde o ano passado. O que normalizaria é ter crescimento econômico. Depende do cenário mundial, mas a previsão é que não tenha no curto prazo.

De janeiro a junho deste ano, as exportações do Brasil para a Argentina caíram 19,8% em relação ao mesmo período do ano passado. O fluxo comercial entre os dois países recuou de US$ 524 milhões, de janeiro a maio de 2013, para US$ 385 milhões nos cinco primeiros meses deste ano.

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