Fim do Mercosul por crise com a Venezuela “seria uma insanidade completa”, diz especialista
Para Daniel Coronato, crise na presidência do bloco "é uma situação muito maluca"
Internacional|Do R7*
A troca no comando do Mercosul vem causando atritos entre os principais chefes de Estado latino-americanos. Os presidentes Mauricio Macri, da Argentina, Horacio Cartes, do Paraguai, e o presidente interino do Brasil, Michel Temer, se recusam a passar a presidência do bloco econômico para a Venezuela de Nicolás Maduro — o que vem gerando medo de que a crise diplomática possa precipitar o fim prematuro da entidade. No entanto, para o doutorando do programa San Tiago Dantas e coordenador do NEAI (Núcleo de Estudos e Análises Internacionais da UNESP), Daniel Coronato, o desmantelamento do bloco seria “uma insanidade completa”.
— A Venezuela é hoje um empecilho para o projeto liberal que Argentina, Brasil e Paraguai querem para o Mercosul. Agora, essa situação vai causar uma reação do Maduro, talvez até forçar uma saída do bloco.
Coronato afirma que a própria entrada da Venezuela no Mercosul em 2012 já foi conturbada, tendo acontecido em meio ao polêmico processo de impeachment do presidente do Paraguai, Fernando Lugo — que fez com que o país ficasse suspenso do bloco por alguns meses.
O especialista lembra que a entrada da nação bolivariana no Mercosul não foi consensual (os congressos brasileiro e paraguaio se opuseram), e o país de fato não cumpriu alguns requisitos obrigatórios do bloco, como a adequação tarifária — o que deverá ser usado como justificativa para impedir a ascensão de Maduro à presidência da entidade.
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— É uma situação muito maluca. O Uruguai já disse que passou a presidência para a Venezuela, e o Maduro diz que está no comando, mas os outros países dizem que não está. Isso vai acabar sendo decidido de forma não consensual.
Mesmo com os protestos da “Tríplice Aliança” — como Maduro denominou a união dos três países que querem impedir sua liderança —, o governo da Venezuela içou a bandeira do bloco na capital, Caracas, e proclamou-se presidente pro tempore do Mercosul na sexta-feira (5).
Polêmica
Pelas normas do Mercosul, a presidência do bloco deve ser passada de país em país, por ordem alfabética, a cada seis meses. O próximo na linha sucessória seria a Venezuela — cujo governo afirma que Argentina, Brasil e Paraguai pretendem “tomar de assalto” o comando do bloco, com o apoio dos Estados Unidos.
Já o ministro interino das Relações Exteriores do Brasil, José Serra, justificou sua posição contrária à presidência de Maduro no bloco em uma entrevista recente a um jornal carioca, na qual afirmou que “não há democracia plena” na Venezuela — o que fere a cláusula democrática presente no estatuto do Mercosul.
No entanto, para a professora de Relações Internacionais da UniSantos (Universidade Católica de Santos), Natalia Fingermann, a retórica usada pelo ministro “é incoerente” e "truculenta".
— Como o Brasil pode questionar a democracia na Venezuela se o País tem passado por um processo de impeachment que vem sendo questionado internacionalmente? Fica difícil colocar um questionamento desse com um governo interino.
A especialista acredita ainda que, com a eleição de Macri na Argentina e a troca de poder no Brasil, está havendo um “esfriamento” do Mercosul, com esses governos priorizando estabelecer acordos de comércio bilateral com países do norte, como os Estados Unidos.
* Por Luis Felipe Segura
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