Presidente da França, Emmanuel Macron
Olivier Hoslet/Reuters - 11.12.2020O presidente da França, Emmanuel Macron, admitiu nesta quinta-feira (27) a "responsabilidade" do seu país no genocídio perpetrado em Ruanda em 1994, mas negou ter qualquer cumplicidade no massacre de cerca de 800 mil tutsis e hutus moderados.
Qual a relação do genocídio em Ruanda com Bélgica, França e EUA?
"Os assassinos que percorriam os pântanos, as montanhas, as igrejas, não tinham rostos da França. Ela não foi cúmplice", disse Macron em um discurso solene no Monumento ao Genocídio em Kigali, onde são guardados os restos mortais de cerca de 250 mil vítimas.
"Mas a França tem um papel, uma história e uma responsabilidade política em Ruanda. E tem um dever: enfrentar a história e reconhecer a quantidade de sofrimento que infligiu ao povo de Ruanda, fazendo prevalecer o silêncio sobre o exame da verdade durante demasiado tempo", reconheceu.
"A França não ouviu a voz daqueles que a tinham advertido, ou então superestimou sua força ao pensar que podia parar o pior. A França não compreendeu que, ao querer evitar um conflito regional ou uma guerra civil, estava de fato do lado de um regime genocida", acrescentou.
"Ao ignorar os avisos dos observadores mais lúcidos, a França assumiu uma responsabilidade esmagadora em uma espiral que levou ao pior, mesmo procurando justamente evitá-lo", completou o presidente francês, que depositou uma coroa de flores no monumento, perante o qual se curvou logo em seguida.
Macron chegou esta manhã a Kigali em uma histórica visita de Estado que busca normalizar as relações bilaterais, abaladas pelo genocídio de 1994 depois de Ruanda ter acusado a França de cumplicidade no massacre.
O presidente francês foi recebido por seu homólogo ruandês, Paul Kagame, ao lado de quem irá realizar mais tarde uma coletiva de imprensa.
A visita acontece dois meses após a publicação de um relatório oficial de uma comissão de peritos formada pelo Palácio do Eliseu sobre o papel da França no genocídio ruandês.
O relatório observou que a política externa francesa, então sob a presidência de François Mitterrand, cometeu erros "esmagadores" e foi "cega", mas não foi cúmplice do massacre no pequeno país africano.
A França não tem embaixador em Ruanda atualmente, embora sua legação diplomática esteja funcionando normalmente e haja planos de nomear em breve um embaixador para concluir esta "fase final da normalização" das relações bilaterais.
O último presidente francês a viajar para Ruanda foi Nicolas Sarkozy em fevereiro de 2010, em uma visita durante a qual admitiu "graves erros políticos" do seu país antes e durante o massacre, embora não tenha visitado o Memorial do Genocídio.
França e Ruanda retomaram as relações diplomáticas no final de 2009 após uma interrupção de três anos depois de Paris ter acusado Kagame e nove funcionários do governo de abaterem o avião que transportava o então presidente ruandês, Juvénal Habyarimana, e seu homólogo burundês, Cyprien Ntaryamira, ambos de etnia hutu, em 6 de abril de 1994.
O genocídio começou no dia seguinte após os assassinatos dos presidentes (pelos quais o governo ruandês acusou os rebeldes tutsi da Frente Patriótica de Ruanda de Kagame), que desencadearam o massacre de cerca de 800 mil tutsis e hutus moderados em pouco mais de três meses, em um dos piores genocídios da história recente.