Padre sequestrado por ditadura argentina diz estar “em paz” com papa
Antes dele, Nobel da Paz argentino negou envolvimento de Francisco com ditadura
Internacional|Do R7
A ordem jesuíta na Alemanha comentou nesta sexta-feira (15) a polêmica pela suposta colaboração de Jorge Mario Bergoglio, o agora papa Francisco, com a ditadura na Argentina. Em comunicado escrito, o sacerdote sequestrado pelo governo argentino na década de 70 afirmou estar "em paz" com o líder dos católicos, a quem deseja um bom pontificado.
Franz Jalics foi sequestrado em 1976, junto com o também padre jesuíta Orlando Yorio, quando ambos atuavam em uma favela portenha na época da ditadura argentina (1976-1983). Eles foram presos clandestinamente por cinco meses, período em que foram torturados.
Desde a quarta-feira (13), quando o cardeal Jorge Mario Bergoglio foi escolhido papa, vieram à tona na imprensa argentina antigas acusações de que o agora papa Francisco teria sido cúmplice do sequestro dos dois padres.
Hoje, Jalics, que é húngaro mas se aposentou na cidade alemã de Wilhelmsthal, divulgou uma nota pelo site da ordem jesuíta da Alemanha dizendo que "está em paz" com o papa e que "essa questão [o sequestro] já foi esclarecida".
"Desejo ao papa Francisco a bênção de Deus em seu pontificado", diz a nota.
Na declaração, Jalics explica que foi viver em Buenos Aires em 1957 e que, em 1974, "por vontade própria", decidiu exercer sua tarefa evangélica no meio da "horrível miséria", em um bairro portenho, e com a permissão de Bergoglio.
Jalics lembra ainda que o governo argentino da época desencadeou uma situação "similar a de uma guerra civil", que em dois anos assassinou 30 mil pessoas, incluindo "inocentes", e afirma que em sua favela não tiveram contato "nem com a guerrilha" e nem com os militares.
No entanto, explica Jalics, o governo manteve um colaborador dos padres preso por nove meses. Segundo Jalics, o homem, que tinha vínculos com guerrilhas de esquerda, provavelmente foi torturado e, com isso, deve ter colocado os dois padres em situação delicada.
Segundo Jalics, o sequestro desse homem causou sua detenção, seguida de um interrogatório durante cinco dias e da prisão de cinco meses, "com os olhos vendados e atados".
Jalics afirma que não poderia fazer "declaração alguma" sobre o papel de Bergoglio nesse período. O padre húngaro explica que, após sua libertação, deixou a Argentina.
Ele acrescenta ainda que, anos depois, quando Bergoglio se tornou arcebispo de Buenos Aires, ambos conversaram sobre "o ocorrido". Segundo o jesuíta, a viagem foi realizada a convite do arcebispado portenho. "Me reconciliei com os envolvidos e encerrei o assunto", disse o religioso.
Livro
A polêmica da suposta colaboração do papa Francisco com a junta militar foi abordada anos atrás pelo jornalista argentino Horacio Verbistky e agora ressurgiu após a eleição do pontífice.
O próprio Bergoglio contestou as acusações em 2010, no livro El Jesuita (O Jesuíta) e refutou a colaboração.
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O ativista de direitos humanos e Prêmio Nobel da Paz argentino Adolfo Pérez Esquivel rejeitou esses dias taxativamente tais acusações na rede britânica BBC, onde disse que "houve bispos que foram cúmplices da ditadura argentina, mas Bergoglio não".
O novo papa "é questionado porque dizem que não fez o necessário para tirar da prisão dois sacerdotes. Sei pessoalmente que muitos bispos pediam à junta militar a libertação de prisioneiros e sacerdotes e não se lhes concedia", lembrou Esquivel.
Os dois jesuítas foram libertados após cinco meses de torturas. Yorio morreu em 2000 no Uruguai e Jalics se refugiou na meditação e na reza para aguentar a experiência sofrida.
O sacerdote, de origem húngara, foi viver à Alemanha em 1978 e aí escreveu um livro sobre sua retirada espiritual, situação na qual segue.
O sacerdote tem atualmente 85 anos e continua se dedicando aos exercícios espirituais contemplativos, conta a rádio pública bávara "Bayerische Rundfunk" (BR).
Jalics está agora de viagem na Hungria, para onde partiu "recentemente", aparentemente para uma estadia de vários meses largamente planejada, indicaram as fontes jesuítas à emissora pública bávara.
O porta-voz da ordem deixou claro, ainda, que Jalics não se "escondeu" para evitar o frenesi da mídia, que sua viagem não tem nada a ver com a eleição do papa e que se espera retorne à Alemanha em 10 de maio.
De acordo com esse porta-voz, Jalics não tem intenção de fazer declaração alguma sobre Bergoglio.
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