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Falhas no sistema tornam comuns partos em presídios, denunciam pesquisadoras da UFRJ

Para juiz, decisão de diretora do presídio foi incompreensível e contra dignidade humana

Rio de Janeiro|Do R7

Presas grávidas são levadas para presídio Talavera Bruce, diz Seap
Presas grávidas são levadas para presídio Talavera Bruce, diz Seap

No dia 11 deste mês, uma presa grávida de nove meses estava em uma cela de isolamento, quando começou a pedir gritar, dizendo que daria à luz. Segundo as presas, outra detenta realizou o parto e a ajuda dos funcionários do presídio chegou só depois. Bárbara Oliveira de Souza foi encaminhada a um hospital ainda com o recém-nascido preso pelo cordão umbilical. Por meio de uma denúncia anônima, a Justiça soube do caso e começou a investigar. A notícia só veio a público na segunda-feira (26).

O juiz Eduardo Oberg da VEP (Vara de Execuções Penais) concluiu que a mulher não teve o atendimento necessário e que a decisão da diretora do presídio Talavera Bruce foi, no mínimo, incompreensível. Analisando os documentos e testemunhos de outras detentas, Oberg determinou que a diretora fosse afastada temporariamente do cargo.

O magistrado disse ao R7 que a profissional agiu errado, colocando a presidiária na solitária por ter problemas psicológicos.

— A diretora entendeu equivocadamente que ela deveria estar lá, já que a grávida precisava ser levada para o hospital psiquiátrico. Ainda será verificado se foi cometido um crime. Eu vislumbro que sim.


Segundo o juiz, com a decisão, não foi respeitado o princípio da dignidade humana previsto pela constituição. 

A ex-presidente do Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro Maíra Fernandes concorda com Oberg e afirma que todo parto dentro do sistema penal é de risco. A melhor possibilidade, segundo Maíra, seria a prisão domiciliar para as detentas em estado avançado de gravidez. A advogada diz que o Código Penal prevê a possibilidade de que ocorra essa determinação. 


Sobre o caso da detenta Bárbara, o juiz Oberg diz que ela foi condenada por tráfico de drogas e que, por isso, não deveria ficar em prisão domiciliar. Ele reforça que não pode ocorrer a falta de zelo pela dignidade humana, como na situação descrita.

Em pesquisa feita com detentas de unidades prisionais do Rio, Maíra relata que casos como esse não são raros. Ela conta que as grávidas presas chegam a parir algemadas, dentro dos presídios e até em veículos do SOE (Serviço de Operações Especiais), que é o transporte usado nesses casos. Além disso, elas reclamam, por exemplo, da falta de médicos nas unidades e da demora dos carros que levam para hospitais.


— A saúde dessa presa é uma responsabilidade do Estado. Ela não poderia ter sido colocada sozinha em uma cela. A prisão deve ser evitada em casos de gravidez avançada. Parece-me bastante claro que uma mulher em gravidez avançada não poderia estar no isolamento. 

A professora de Direito Penal da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Luciana Boiteux também concorda que a prisão domiciliar deveria ser uma alternativa para que não ocorram casos como esse. Luciana também diz que já ouviu relatos de presas que, por demora no atendimento, são obrigadas a parir em condições inadequadas, como as citadas pela advogada Maíra. 

— Há, nesses casos de mulheres grávidas, muitos abusos. Certamente, uma cela pode causar danos à saúde das detentas prestes a parir. É uma falta de respeito aos direitos humanos.

Além disso, a professora sugere mudanças no protocolo de atendimento a grávidas da Seap (Secretaria de Estado de Administração Penitenciária). Segundo ela, o modo de transporte deve ser alterado para que ocorra de forma mais rápida e essas mulheres precisam estar sob constante observação para que a, qualquer momento, sejam atendidas. Além disso, recomenda que elas não sejam encarceradas.

Os relatos das detentas grávidas e sugestões para melhorar o atendimento dessas mulheres em penitenciárias estão em pesquisa desenvolvida no âmbito da UFRJ, da qual participaram Maíra e Luciana. O levantamento será divulgado no próximo mês.

Seap relata que presa foi transferida para hospital

Em decisão que afastou a diretora do presídio do Talavera Bruce após uma presa dar à luz em uma solitária, o juiz cita relatório de assistente social da unidade prisional de Bangu (zona oeste do Rio) que diz que a detenta apresentava sintomas de abstinência de crack. Segundo o mesmo documento, um laudo médico aponta que a mulher sofre de "depressão profunda" e que, por isso, precisa do uso de medicamentos controlados.

Por meio de nota, a Seap informou que a detenta Bárbara Oliveira de Souza já foi transferida para o Hospital Psiquiátrico Roberto Medeiros e uma sindicância foi aberta para apurar o modo como ocorreu o parto. Também disse que, atualmente, há 30 internas grávidas na penitenciária — três são sentenciadas e as outras, provisórias. A secretaria também relatou que as gestantes presas são encaminhadas para a Talavera Bruce e ficam divididas em duas celas. Ainda de acordo com a Seap, todas são acompanhadas, fazem o exame pré-natal e são atendidas por um ginecologista, uma enfermeira e duas técnicas de enfermagem.

As presas fazem ultrassonografia na UPA Dr. Hamilton Agostinho de Castro, no Complexo Penitenciário de Gericinó. As que estão prestes a dar à luz são encaminhadas para o Hospital da Mulher Mariska Ribeiro, em Bangu, ou para o Hospital Estadual Albert Schweitezer, em Realengo. Ambos ficam na zona oeste do Rio.

Após darem à luz, elas são transferidas para a UMI (Unidade Materno Infantil), localizada ao lado do presídio. Lá, ficam durante o período de amamentação junto com seus bebês por até um ano. Depois desse tempo, a criança é entregue à família da presa. 

Diretora do presídio foi afastada temporariamente 

O juiz Oberg determinou o afastamento provisório da diretora e da subdiretora da penitenciária a fim de investigar o caso no dia nesta segunda-feira (26). De acordo com a sentença, Bárbara pariu dentro da cela com a ajuda de uma detenta. Depois, foi levada para um hospital. Por ser paciente psiquiátrica, ela foi separada do filhoque, inclusive, tentou agredir a criança. O bebê foi encaminhado para um abrigo municipal.

Ainda segundo o juiz Oberg, a gestante estava sozinha em cela, pois era agressiva e sofria com a abstinência de drogas. Assim, poderia machucar as outras presas.

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