Amigos fazem vaquinha para pagar advogado e querem a liberdade do tatuador que torturou rapaz no ABC
Companheiros defendem músico: "Não é porque cometeu um crime que é um criminoso"
São Paulo|Gustavo Basso e Juca Guimarães, do R7
Amigos do tatuador Maycon Wesley Carvalho dos Reis, de 27 anos, preso pelo crime de tortura por ter mantido em cárcere privado, filmado e escrito na testa de um jovem de 17 anos a frase "Sou ladrão e vacilão", fizeram uma vaquinha para contratar um advogado.
"Do mesmo modo que não é porquê alguém toca violão que é músico, não é porque ele cometeu um crime que é criminoso. Esse episódio foi uma fatalidade, tanto para ele quanto para o jovem", defende Marcos Andrade, 30 anos, músico, amigo de Maycon há seis anos e considerado uma espécie de irmão do tatuador, que também é conhecido como Tato Reyz.
Na segunda-feira (19), o advogado deve entrar com um pedido judicial para alterar a acusação de tortura para lesão corporal grave, assim o tatuador poderia ser libertado para aguardar o julgamento em casa.
"O caso está enquadrado como tortura, porém, o advogado vai pegar todos os fatos, todas as provas e tudo que tem e tentar quebrar esse enquadro de tortura e passar para lesão corporal", explica Andrade.
Marcos faz parte do grupo de WhatsApp e do círculo de amizade para quem o tatuador enviou o vídeo com as cenas onde ele aparece rindo, fazendo ameaças e escrevendo a frase na testa do rapaz que tentava furtar a bicicleta de um vizinho de pensão de Maycon.
Para Marcos, um histórico de violências sofrido pela mãe de Maycon teria deixado ele mais suscetível ao episódio. "A mãe do Maycon sofreu um sequestro relâmpago quando ele tinha 16 anos, era um adolescente, e ela sofreu muitos abusos morais. E recentemente a casa dela foi invadida. Conhecendo como eu o conheço, e somos muito parecidos de personalidade, acredito que fica a marca do que foi sofrido pela mãe dele", comentou o amigo.
O amigo do tatuador não sabe como as imagens da sessão de tortura viralizaram pela internet. Entre os amigos que viram o vídeo em primeira mão, a impressão foi de preocupação com a atitude do tatuador.
— Todos sentiram, ao receber, que era algo muito pesado, inclusive ele. Mas ele disse 'eu fiz isso porque to indignado, não aguento injustiça'.
O amigo conta ainda que quando a polícia o procurou, Maycon não resistiu ou tentou fugir, e só foi perceber a magnitude da agressão após a prisão. "Ele (Maycon) disse que estava em casa descansando em casa e dois caras foram lá roubar a bicicleta. Ele estava na casa dele descansando por que a gente estava juntos na noite anterior até às 6h da manhã. Então, por volta das 9h, dois rapazes entraram lá para roubar a bicicleta. Era no segundo andar do prédio, então a intenção era mesmo roubar, não dá pra falar que entraram por engano. Então ele pegou esse rapaz e o outro conseguiu fugir", contou Marcos.
— Ele nunca aceitou bem injustiça. Como exemplo: eu tenho paralisia facial, e sempre sofri com piadas ou preconceito. E a forma como o Maycon me abraçou desde que me conheceu nunca me permitiu que eu me sentisse inferior a ninguém.
Andrade define Maycon como uma pessoa brincalhona e cheia de amigos, mas que já houve situações em que ele se envolveu em brigas. "Acredito que sim [que houve brigas]. Ele já trabalhou como segurança há algum tempo atrás e pode ter ocorrido briga sim. Mas é algo assim comum numa situação do dia-a-dia", disse.
Página de apoio
A página de apoio ao tatuador no Facebook foi criada por Messias Rodrigues, 34 anos. “Acho uma sacanagem o que estão fazendo com o Maycon, porque você nisso vê uma inversão de valores", disse o empresário e músico que conhece o tatuador há dez anos.
"Nós sabemos que o garoto tatuado tem um histórico de problemas, de furtos na vizinhança. E está sendo considerado um anjo por parte das pessoas, enquanto que o Maycon, que sempre batalhou para ser honesto, íntegro, é visto como criminoso da história", reclama Rodrigues.
Até a manhã deste domingo, a página de apoio ao tatuador tinha 830 curtidas.
— Faz um mês ele tatuou minha esposa, e havia confirmado presença no aniversário dela antes de ser preso.
Rodrigues defende a atitude do tatuador. "Se fosse meu filho tentando furtar um deficiente e fosse tatuado, eu teria a mesma opinião", afirmou.
— Eu mesmo já quebrei uns quatro ou cinco 'noias' que estavam mexendo no meu carro ou no da vizinha. A diferença é que o Maycon gravou o que ele fez, e eu não.
Para Rodrigues, educação familiar foi essencial para levar o jovem tatuado ao vício e o crime. "Na minha casa, minha mãe sempre nos fez segurar nosso BO. Meu irmão mais velho teve uma época que ia muito a bar, e arranjava confusão. Numa dessas, a polícia veio atrás e ele pediu abrigo para minha mãe. Ela disse ‘fica ai no quarto, que eu tranco e quando chegarem, falo que você não está e procurarão em outro lugar’. Quando chegaram, ela atendeu a porta e disse: ‘tó, aqui está a chave, ele está lá no quarto’", contou.
Parceiro de gravação
Ambos amigos do tatuador entrevistados afirmam que o pedreiro Ronildo Moreira de Araújo, 29 anos, que gravou toda a ação, e Maycon não são amigos. "Eles se conhecem há uns 10 meses, quando o pedreiro se mudou para a pensão onde eles moram. Se cruzam no corredor, conversam um pouco, mas não se pode dizer que são amigos", afirma Rodrigues
O advogado contratado pela vaquinha de amigos não cuida da defesa do vizinho. Marcos Andrade diz não ter certeza sobre o caso, mas que a Defensoria Pública estaria responsável pela defesa de Ronildo. O pedreiro que apoiou a tatuagem "sou ladrão e vacilão" foi preso em 2008 por roubo e condenado a 5 anos e 4 meses de prisão, que ele cumpriu nos regimes semiaberto e aberto.
"Eu acho isso uma ironia e uma grande hipocrisia", comenta sobre isso Messias Rodrigues, que defende Maycon. "Temos que ver se ele sabia disso, né? Porque não fica claro quem já foi ou não preso, eles se conheciam há pouco tempo".