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Assustados com a violência, dentistas de SP terão “aplicativo antipânico”, diz Conselho de Odontologia  

Segundo presidente da entidade, com um toque no celular será possível comunicar emergência

São Paulo|Fernando Mellis e Márcia Francês, do R7

Dois homens armados invadiram o consultório de Alexandre Gaddy (foto) para assaltá-lo, na noite de segunda-feira (27), em São José dos Campos, interior de São Paulo
Dois homens armados invadiram o consultório de Alexandre Gaddy (foto) para assaltá-lo, na noite de segunda-feira (27), em São José dos Campos, interior de São Paulo

A preocupação dos dentistas com a incidência de assaltos a consultórios e também com a crueldade dos criminosos fez com que o Crosp (Conselho Regional de Odontologia de São Paulo) desenvolvesse, em parceria com uma empresa, um aplicativo para celulares e tablets que possa ser usado em momentos de emergência. Segundo o presidente da entidade, Claudio Miyake, os profissionais estão assustados, principalmente, após o que aconteceu com a dentista Cinthya Moutinho, em abril, quase se repetir na segunda-feira (27). Outro profissional, Alexandre Peçanha Gaddy, teve 60% do corpo queimado durante um roubo ao consultório dele, em São José dos Campos. Ele permanece internado, em estado grave, na UTI (Unidade de Terapia Intensiva).

No dia 25 de abril, Cinthya foi queimada viva durante um assalto dentro de seu consultório em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. A dentista disse que estava com pouco dinheiro, mas forneceu o cartão do banco e a senha aos bandidos. Porém, segunda a polícia, os quatro criminosos decidiram atear fogo na vítima após perceber que ela só tinha R$ 30 na conta. 

Ao R7, Miyake falou sobre os assaltos a consultórios odontológicos e sobre iniciativas que o Conselho pretende tomar para colaborar com a segurança pública e minimizar os crimes contra dentistas, como a campanha “Vamos nos proteger”, que inclui a distribuição de cartilha com dicas de segurança e a criação de um aplicativo para celulares e tablets que vai permitir avisar uma rede de contatos em caso de emergência. Ele também destacou a necessidade de troca de informações entre as vítimas e a polícia, para mapear os roubos e identificar as características dos criminosos. 

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Leia a íntegra da entrevista:


R7: A recorrência desse tipo de caso assusta a categoria?

Claudio Miyake: Com certeza. Desde a outra ocorrência, em São Bernardo, a classe já ficou bastante assustada. O que nós notamos é que como os dentistas trabalham muitas vezes sozinhos no consultório, ou com alguma secretária ou auxiliar. Isso despertou um interesse nos marginais que fazem esse tipo de abordagem. Solicitamos uma audiência com o secretário da Segurança Pública, Fernando Grella. A princípio está agendada para semana que vem no dia 7 de junho, porém, isso foi antes de ocorrer esse caso em São José dos Campos. Agora, nós já protocolamos um pedido para que antecipem essa reunião, para que nós possamos colaborar da melhor maneira com a secretaria.


R7: O que está gerando essa violência toda, de forma banal? 

Miyake: Em casos como esses [dos dentistas queimados], em casos semelhantes, nós notamos que a grande epidemia do momento é as drogas. Às vezes nós temos relatos de colegas que o assaltante queria R$ 50 para comprar droga na esquina. A banalização da violência e essa questão do caso dos dentistas, de colocar fogo ou não, acaba sendo reflexo desse problema social. Diferente de ir num banco, onde eles vão para roubar milhares de reais, no consultório, ele quer algum dinheiro para resolver o problema dele naquele momento. Infelizmente, hoje, somos a bola da vez. Mas nós queremos, rapidamente, com orientações, com movimentação, com manifesto diminuir essa ação que tornou-se violenta, ao ponto de termos uma morte no mês passado e hoje com um risco, um colega que está na UTI em São José dos Campos e estamos torcendo para que ele se recupere.

R7: Haverá algum trabalho específico com a Secretaria da Segurança Pública para prevenir esse tipo de crime? O que será tratado com o secretário Fernando Grella?

Miyake: Nós temos consciência de que ir lá pedir para o secretário que semana que vem tenha milhares de policiais a mais na rua é uma coisa que, na prática, é complicada. É claro que nós vamos solicitar uma ampliação na presença de policiais nas ruas. Mas o principal é que nós queremos colaborar, sem querer substituir a polícia, com informações para que, em determinadas regiões, onde há uma maior incidência desses casos, possa haver um reforço policial e uma colaboração de informações na investigação dos fatos já ocorridos. Também, se possível, a criação de um atendimento especial para crimes com essas características, para se evitar que caia no crime comum e que a coisa não avance em termos de investigação.

R7: O que foi feito pelo Conselho de Odontologia logo após o caso da dentista morta em São Bernardo?

Miyake: De imediato, nós criamos um e-mail (vamosnosproteger@crosp.org.br) para que a classe fizesse uma comunicação direta com o conselho. A intenção foi exatamente de que outros colegas pudessem relatar o que havia ocorrido com eles. Desde então, recebemos vários relatos, de diversas regiões, de São Paulo e da Grande São Paulo. Não havíamos ainda recebido algum do interior. São casos que os próprios colegas relatam de ocorrências de assalto.

R7: Como vai funcionar esse canal de comunicação e a campanha “Vamos nos proteger”?

Miyake: Estamos aguardando a audiência com o secretário para poder definir uma estratégia de integração com a Secretaria da Segurança Pública. Notamos que apenas alguns dentistas fazem o boletim de ocorrência, muitos acabam não fazendo. Então, a ideia é que nós possamos criar um canal mais próximo para encorajar o colega a relatar, mesmo que seja um crime mais simples, para então identificarmos as características e regiões onde as ocorrências estão acontecendo. Na verdade, o Conselho vai servir como um acolhedor para os dentistas que sofrerem algum tipo de situação nesse sentido.

R7: Baseado nesse serviço, já existe alguma estatística de assaltos a consultórios?

Miyake: Desde que nós abrimos esse canal, no começo de maio, ainda não temos uma estatística, mas notamos que as ocorrências que foram relatadas têm ocorrido em vários tipos de consultório. Desde consultórios mais simples até clínicas na [avenida Brigadeiro] Faria Lima. Então, realmente, há uma preocupação grande. Nós estamos nos mobilizando para criar uma cartilha com orientações básicas de segurança e também estamos finalizando com uma empresa um aplicativo que poderá ser instalado em celulares e em tablets que vai criar uma rede de comunicação.

R7: O que será, exatamente, esse aplicativo?

Miyake: Todo inscrito no Conselho poderá baixar gratuitamente e por meio desse aplicativo, em situações de perigo, com um toque no celular, uma rede de pessoas que a própria pessoa escolher vai ser avisada de que o colega está em uma situação de alerta. É claro que isso não vai evitar ações mais ousadas, mas em caso de sequestro relâmpago, ou em alguma situação mais demorada, algumas pessoas serão avisadas de que há uma situação específica de perigo.

R7: Como esse serviço vai funcionar?

Miyake: Em linhas gerais, cada um cria a sua rede de contatos, de dez a 12 contatos que você mesmo escolhe e ao dar um toque, ao acessar o aplicativo, essas pessoas automaticamente saberão que você está em uma situação anormal. E aí, cria-se uma rede de comunicação imediata para essas situações. Esperamos que, em alguns casos, elas sejam interceptadas e até solucionadas.

R7: Como será a cartilha com orientações que será distribuída?

Miyake: O Conselho está trabalhando em parceria com a Associação de Cirurgiões Dentistas a fim de elencar características específicas dos consultórios odontológicos. A cartilha vai trazer com orientações de segurança para esse tipo de ambiente. Acreditamos que nas próximas semanas possamos fazer essa divulgação.

R7: O dentista hoje está mais vulnerável à violência?

Miyake: Uma análise que nós estamos fazendo é de que os assaltantes a cada hora buscam uma alternativa. Se nós voltarmos alguns anos, tínhamos notícia de assalto a banco praticamente todos os dias. Hoje, já não se houve mais quase falar em assalto a banco. Agora, passamos a ouvir assalto a caixas eletrônicos, mas já têm diminuído. Então é isso, os marginais acabam migrando para outras ações. Acho que é essa questão de uma nova oportunidade que eles estão vendo. Tem a questão da droga. É aquele tabu que existe é de que dentro do consultório de um dentista tem dinheiro, acham que tem até ouro, o que não acontece. Uma junção de vários fatores é que está ocasionando tudo isso.

R7: Tem alguma característica do trabalho do dentista que o torna mais vulnerável?

Miyake: O fato do consultório odontológico, assim com alguns outros consultórios, terem um atendimento a portas fechadas. É diferente de assaltar uma loja que está com as portas para a rua. Acaba encorajando os assaltantes a fazer esse tipo de abordagem.

R7: Dentistas que trabalham em casa correm mais riscos?

Miyake: Comparativamente a um prédio comercial, que tem uma portaria, uma recepção, é mais perigoso. Agora, nós temos relatos de assaltos, inclusive, em prédios. Hoje tem que ter cuidado e instalar equipamentos de segurança, se possível, câmeras. Por exemplo, é muito comum o ladrão ir uma semana antes, faz uma consulta, observa até a agenda, escolhe horários em que não vai ter muito movimento.

R7: Quais são cuidados básicos que o dentista deve ter?

Miyake: O principal seria realizar consultas com referência. Hoje em dia, confesso que em muitos casos isso não é tão simples, porque o dentista hoje vive em um mercado de trabalho altamente concorrido. Muitas vezes ele acaba sendo mais flexível, relaxando mais nesses cuidados, para ter um novo paciente na sua cadeira. O ideal é, sempre que possível, buscar referência, pegar o maior número de dados possíveis da pessoa que vai fazer exame ou um orçamento. Evitar que nos últimos horários fique sozinho. Criar uma espécie de comunicação com alguém próximo, nos horários em que estiver saindo do consultório, para evitar uma invasão nesse momento. Não deixar a chave do consultório na própria porta. Assim, quando invadir, o ladrão não tem como trancar a porta por dentro. São cuidados básicos, que não têm um investimento específico e que podem minimizar a ação de criminosos. 

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