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Uma força de quase 1.000 policiais, metade deles da Polícia Civil, participou do desmonte da antiga Cracolândia, no centro de São Paulo, no dia 21 de maio de 2017. A operação que expulsou usuários de drogas, moradores de rua e traficantes da área próxima à esquina da rua Helvétia com a alameda Dino Bueno terminou com dezenas de pessoas detidas, mudança no local de consumo e venda de drogas e levantou discussões sobre a região e as formas de lidar com os usuários.
Veja a seguir os principais acontecimentos da Cracolândia desses 30 diasWerther Santana/Estadão Conteúdo
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O saldo da megaoperação foi a prisão de 53 pessoas e a apreensão de 12,3 kg de crack, além de outras drogas em quantidades menores. Segundo o Denarc (Departamento de Narcóticos da Polícia Civil paulista), a maioria dos detidos eram grandes traficantes, incluindo dois chefes do PCC que controlavam a atividade criminosa na região. Semanas depois foi detido um militar que havia desertado e fazia a segurança da facção no local
Leonardo Benassatto/Framephoto/Estadão Conteúdo
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Outro saldo da operação foi a dispersão do antigo ‘fluxo’ pelo centro de São Paulo, resultando na formação de 22 novas minicracolândias. A maior delas, e hoje chamada de Nova Cracolândia, fica na praça Princesa Isabel, a 400 metros da antiga concentração. Dias após a dispersão causada em 21 de maio, centenas de pessoas se reuniam na praça formando um acampamento denso, com dezenas de barracas e tendas, em um labirinto quase impenetrável de lonas. A venda e consumo de crack na praça assumiu o padrão de ‘normalidade’ que era observado na antiga Cracolândia
Eduardo Enomoto/R7
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No nova Cracolândia, usuários afirmaram à reportagem do R7 que traficantes chegaram a distribuir a droga, para aumentar a aglomeração de pessoas, permitindo a montagem das barracas que funcionam como comércio de crack, bebidas, cigarros e até alimento no interior da praça. Nos primeiros dias do novo fluxo, houve relatos também da venda da droga a preços menores que os praticados na alameda Dino Bueno
Paulo Whitaker/Reuters
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O deslocamento do fluxo de usuários e moradores de rua mudou a rotina dos vizinhos da praça Princesa Isabel que relatam a intimidação de traficantes. A sujeira e mau cheiro também eram foco das reclamações. Os moradores se opõem à permanência dos usuários na Princesa Isabel e impediram a montagem de um centro de acolhida a uma quadra da praça. Escolas da região também mudaram a rotina, terminando as aulas mais cedo ou evitando aulas noturnas, e orientando alunos a se deslocarem em grupos por segurança
Felipe Rau/Estadão Conteúdo
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Logo após a operação, ao longo de uma semana, o governo municipal travou uma disputa com a Justiça para liberar a internação compulsória de dependentes químicos. A medida foi anunciada ainda no dia 23 de maio, quando a prefeitura solicitou à Justiça a internação de cerca de 400 dependentes químicos da região. O pedido foi contestado pelo MP. Em sua primeira decisão foi autorizada a internação forçada de usuários de crack. A liminar, no entanto, foi cassada alguns dias depois. Segundo a Defensoria Pública, as internações compulsórias são de caráter excepcional e só podem acontecer quando todas as outras opções forem esgotadas. Após novos recursos, em 30 de maio, a Justiça confirmou o veto à internação compulsória de dependentes químicos
Felipe Rau/Estadão Conteúdo
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Neste último mês, ao menos três novas operações foram realizadas na praça Princesa Isabel, envolvendo confusão entre policiais e dependentes. Na maior delas, em 11 de junho, o fluxo de usuários, traficantes e moradores de rua foi expulso da praça pela Polícia Militar, em uma operação para a retirada de tendas e barracas, que segundo as autoridades abrigam o tráfico de drogas. Os usuários voltaram ao local horas depois, e a limpeza da praça é feita diariamente desde então, contando com a saída do fluxo do local
Agência Estado
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A alameda Dino Bueno, entre a rua Helvétia e a alameda Glete, passou a ser conhecida como a antiga Cracolândia. Lá, no dia 23 de maio, a prefeitura iniciou a demolição de um imóvel com pessoas na região — três ficaram feridas. Secretários explicaram a ação, chamada inicialmente de acidente, afirmando que os ocupantes entraram clandestinamente no imóvel. Funcionários, no entanto, reclamam que o local funcionava desde 2015 como pensão. No dia seguinte, a Justiça proibiu a remoção de pessoas e demolições na região até que fosse feito um cadastramento dos moradores
Márcio Fernandes de Oliveira/Estadão Conteúdo
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Comerciantes da antiga Cracolândia local também foram afetados. A maioria deles deixou a região, fechando bares e pensões, com medo de despejos e novas ações policiais, consideradas por eles violentas. Além disso, quatro imóveis tombados foram ‘emparedados’ em uma ação criticada pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo). Em reunião no conselho, o secretário municipal de Justiça, Anderson Pomini, disse que “em período de guerra nós não podemos levar em consideração o valor histórico de uma fachada”
Gustavo Basso/R7
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No dia 9 de junho a prefeitura inaugurou o Centro de Acolhida Emergencial, montado próximo à estação Julio Prestes. O centro, que foi doado por empresas, é composto por 25 contêineres e tem capacidade para alojar 100 dependentes químicos durante a noite. Além do abrigo, o centro oferece alimentação e banho, com capacidade para atender 150 pessoas durante o dia. Com pouca adesão no começo, o centro vem trabalhando em sua capacidade máxima desde o dia 15 de junho. O governo federal anunciou no dia 9 de junho o repasse de R$ 25 milhões para atender o programa Redenção, sem prazo anunciado. Segundo balanço oficial da prefeitura, desde o dia 21 de maio foram feitas 25.235 abordagens por assistentes sociais na região da Luz. Deste total, houve 10.786 encaminhamentos para acolhimento nos equipamentos da rede assistencial, 7.719 atendimentos na Unidade Emergencial de Atendimento, e 6.730 recusas de atendimento
Amanda Perobelli/Estadão Conteúdo
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A operação também causou discordância dentro da prefeitura. No dia dia 25 de maio, Patricia Bezerra, então secretária municipal de Direitos Humanos, anunciou sua renúncia à pasta após criticar a operação. “Nós não temos como partilhar disso sendo quem somos", afirmou ela. A secretaria também chegou a falar que outros membros do governo municipal afirmam terem sido pegos de surpresa com o aviso na sexta-feira da operação estadual, realizada na madrugada de sábado para domingo
NELSON ANTOINE/ESTADÃO CONTEÚDO
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Mesmo com algumas polêmicas, segundo pesquisa do instituto Datafolha, 60% da população paulistana apoia a ação, que era planejada há oito meses, e segundo fontes, teria ocorrido no fim de semana da Virada Cultural devido à morte de um socorrista na região. Ele teria sido confundido com um membro do Comando Vermelho e morto por criminosos ligados ao PCC. A mesma pesquisa revelou ainda que 80% das pessoas é a favor da internação a força de dependentes químicos
Werther Santana/Estadão Conteúdo