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Índios de SP preparam ato após demarcação ser revogada

Ministro da Justiça anulou demarcação de terra equivalente à área de Cumbica

São Paulo|Gustavo Basso, do R7

Com a anulação da demarcação, indígenas temem ações de reintegração de posse e invasões dos territórios
Com a anulação da demarcação, indígenas temem ações de reintegração de posse e invasões dos territórios Com a anulação da demarcação, indígenas temem ações de reintegração de posse e invasões dos territórios (eduardo enomoto)

“Vamos mostrar para esse governo que somos um povo de luta, resistente, e que vamos lutar até o fim das nossas vidas. A terra não é nossa, Nhanderu [Deus, em guarani ‘mbyá] a deixou para nós cuidarmos”, afirma Mateus Vidal, ou Wera Xondaro, cacique da aldeia guarani Tekoa Itakupé, no Jaraguá, zona norte de São Paulo.

A Tekoa Itakupé é a maior das cinco aldeias da região, cuja população indígena foi impactada na última segunda-feira (21) com a decisão do Ministério da Justiça de revogar a demarcação de terras na região.

Os cerca de 700 guaranis agora planejam protestos e ações na Justiça contra a decisão do ministro Torquato Jardim, com a participação de comunidades de outras cidades e Estados.

“Estamos esperando gente de outras aldeias [para essa luta]; também é preciso rezar muito, pedir muito para Nhanderu [Deus]”, comenta o pajé José Fernando Soares, ou Guira Pepó, de 61 anos, que trabalha como o único guia de povos guaranis de toda América do Sul.

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Foi marcada para a próxima quarta-feira (30) uma manifestação no Masp, na avenida Paulista, com o lema de “O Jaraguá é Guarani”.

Ataque

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Os guaranis que vivem na região criticam o que consideram uma agressão. “A gente esperava ataques deste governo, mas não que eles agissem de forma criminosa”, comenta Thiago Karai Djekupé, presidente do conselho de saúde da comunidade. Ele garante que as famílias não abandonarão as áreas já ocupadas.

"A gente não vai abrir mão do nosso território. Se tiver que se enterrar vivo aqui, a gente vai fazer, não vai negociar. O que está em risco é todo território. A gente não tem 1,7 hectares, a gente tem 532", diz Djekupé.

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O Ministério da Justiça publicou nesta segunda-feira (21) uma Portaria (683/2017) que anula a declaração de posse permanente de 532 hectares de terras indígenas na região do Jaraguá, na zona norte de São Paulo.

Os guaranis que vivem na região voltam, agora, a ter direito legal a somente 1,7 hectares homologados por decreto de 1987.

Os 532 hectares haviam sido demarcados pelo então ministro da Justiça Eduardo Cardozo em 2015, por meio da Portaria 581, e aguardava demarcação administrativa e homologação pela Funai.

A área equivale aproximadamente ao espaço ocupado pelo Aeroporto de Guarulhos. Os 1,7 hectares homologados em 1987 equivalem a dois campos de futebol.

Precedente

Djekupé avalia que a publicação abre precedente para que o governo faça isso com outras áreas indígenas pelo país.

Para Sonia Barbosa Ara-Mirim, a Portaria publicada nesta segunda-feira fere diretamente a população local. "Chamamos de ataque porque é algo feito sem nenhuma atenção, sem vir aqui conversar, ver a situação da comunidade. Eles fazem essas coisas, mas não oferecem solução. A gente já vive uma situação difícil por ser uma área pequena, agora retiram essa área", diz.

Segundo a assessoria jurídica da Comissão Guarani Yvyrupa, que dá suporte à comunidade, entre outras aldeias da etnia, a decisão do Ministério da Justiça é ilegal, por retirar direitos adquiridos, e demonstra alinhamento do ministério com o governo paulista.

Privatização

Os índios afirmam que a portaria atende a um interesse do governo do Estado, que pretende conceder o parque do Jaraguá — cuja área integra a região demarcada — à iniciativa privada.

“O governo do Estado tem a ideia de privatizar 25 parques, entre eles o do Jaraguá. Parte dos 532 hectares do território tradicional guarani tem área sobreposta à do parque”, afirma Djekupé.

“O governo do Estado diz que não foi procurado para a demarcação, mas o que a gente sempre procurou como comunidade foi a gestão compartilhada [da terra indígena com o Parque Estadual do Jaraguá]. O governo se recusou a ter esse diálogo”, diz.

A lei 16.260/2016, sancionada por Geraldo Alckmin, autoriza o governo a conceder “áreas, ou parte de áreas, inerentes ao ecoturismo e à exploração comercial madeireira ou de subprodutos florestais, pelo prazo de até 30 (trinta) anos”. Os índios temem que esta exploração madeireira prejudique a cobertura vegetal da região. A lei exige planos de manejo ambiental para a exploração, mas não menciona a reposição de espécies nativas.

Questionado sobre o conflito de interesses entre a privatização do Parque Estadual e a manutenção dos direitos indígenas, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente comentou: "A concessão do Parque para atividades de ecoturismo é do interesse de toda a sociedade, inclusive dos indígenas, na medida em que deverá gerar oportunidades de emprego, renda e melhoria de qualidade de vida. O governo mantém diálogo permanente com a comunidade."

Procurado na terça-feira (22), o Ministério da Justiça não se manifestou sobre a portaria.

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