Mais de 600 cidades podem ficar sem médicos após saída de cubanos
Conasems alerta que cubanos foram os únicos a aceitar trabalhar em unidades de saúde localizadas nas cidades mais distantes
Brasil|Do R7
Com a saída dos 8.332 médicos cubanos que integram o programa Mais Médicos, ao menos 611 cidades brasileiras podem ficar sem médicos a partir do próximo ano, de acordo com estimativa de secretarias municipais de saúde.
O alerta foi feito neste sábado (17), por Mauro Junqueira, presidente do Conasems (Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde).
Segundo Junqueira, os médicos cubanos foram os únicos a aceitar trabalhar em unidades de saúde localizadas nas cidades mais distantes, isoladas ou pobres do País.
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O presidente do Conselho afirma que dificilmente será possível substituir todos os profissionais nessas localidades, tendo em vista que os médicos brasileiros preferem trabalhar nos grandes centros urbanos.
O Conasems calcula que os médicos cubanos representam mais da metade dos profissionais contratados pelo programa, que permitiu acesso à saúde a cerca de 29 milhões de brasileiros.
No Brasil, 58,2% dos municípios (3.243 de 5.570) são beneficiados pelo Mais Médicos e os cubanos representam 90% dos profissionais que aceitaram atuar em postos de saúde em aldeias indígenas. Além disso, compõem 100% do quadro em 611 cidades.
"O cancelamento abrupto de seus contratos representará uma perda cruel para toda a população, especialmente a mais pobre", alertou, em comunicado, o Conasems.
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"Algumas regiões provavelmente ficarão sem médico por um período entre 60 e 90 dias. Tudo vai depender da rapidez do Ministério da Saúde para contratar os substitutos. O Conselho Federal de Medicina assegura que há médicos disponíveis no Brasil. Vamos rezar para que todos se inscrevam", afirmou Junqueira.
A possibilidade de que milhões de brasileiros fiquem sem assistência médica levou a Defensoria Pública da União a apresentar um recurso na última sexta-feira (16) à Justiça Federal para obrigar o governo a manter as regras atuais do programa.
Na última quarta-feira (14), o governo de Cuba anunciou a decisão de abandonar o programa após declarações do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). Ele afirmou que os profissionais trabalham em condições de escravidão e condicionou a permanência do programa à realização do processo de revalidação do diploma. Também falou que o acordo poderia ser renovado se os profissionais pudessem trazer a família ao Brasil e recebesse pagamento integral — sem repasses ao governo cubano. Os médicos cubanos devem sair do Brasil nas próximas semanas.
O Ministério da Saúde anunciou que vai lançar, ainda neste mês, um edital para contratação de médicos brasileiros e de outros países que possam substituir os cubanos.
Soluções emergenciais
A AMB (Associação Médica Brasileira) emitiu uma carta onde apresenta soluções emergenciais para evitar que pacientes fiquem sem assistência médica no País. A entidade foca em três pontos: a reformulação do PAB (Piso de Atenção Básica), o reforço no atendimento em áreas indígenas e de difícil acesso e o incentivo à adesão ao programa por profissionais jovens.
No que diz respeito ao PAB, a associação sugere que a União aumente o valor repassado para que os municípios possam contratar profissionais da região e que o cálculo seja reformulado para que municípios menores recebam mais recursos.
Para as áreas mais remotas, a proposta é aumentar o investimento nas Forças Armadas, que, segundo a entidade, tem experiência em regiões de difícil acesso e poderia levar "não somente médicos para esses locais, mas toda a infraestrutura necessária para a saúde: transporte de medicamentos, deslocamento de profissionais hospitais de campanha, helicópteros e barcos para remoção em locais de difícil acesso. Para isso, usaria o efetivo atual de médicos das Forças Armadas, incrementaria o efetivo por concurso e selecionaria também novos Médicos Oficiais Voluntários para atuarem de forma temporária."
No caso dos profissionais em início de carreira, a proposta da AMB seria a criação de subsídios e incentivos aos jovens médicos com dívida no Fies (Fundo de Financiamento Estudantil).
"Durante o período em que os médicos atuarem no programa, as parcelas do financiamento ficam suspensas. Além disso, haverá o benefício de descontos no montante geral da dívida, de acordo com o tempo de permanência e o município ou região escolhido (quanto menor o município ou de mais difícil provimento, maiores os descontos). Também é preciso garantir as mesmas condições ofertadas aos cubanos hoje: moradia, alimentação e transporte."
Em seu posicionamento, a AMB criticou o programa e o classificou como "eleitoreiro". Afirmou que o problema da assistência médica no Brasil não está relacionada à falta de médicos, mas de "políticas públicas que atraiam e fixem esses médicos nos municípios". Para a entidade, a solução definitiva para o problema seria a criação de uma carreira médica de Estado. Segundo a AMB, há 458.624 médicos no País e esse número é suficiente para as demandas da população.