Um ano após começar a valer a Reforma da Previdência, que criou regras mais rígidas para a aposentadoria, 10 estados do país e o Distrito Federal ainda não realizaram reformas locais para atualizar ou, a exemplo da reforma federal, tornar mais duras as normas para servidores e tentar, dessa forma, reduzir o déficit do sistema. A Reforma da Previdência trouxe novidades como as idades mínimas de aposentadoria de 65 anos para homens e 62 para mulheres. Elas valem para quem contribui com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), como os trabalhadores formais da iniciativa privada e os que recolhem como autônomos. Tire 29 dúvidas sobre a Reforma da Previdência e entenda as mudanças A lei abrange ainda os funcionários públicos federais, mas por falta de acordo deixou de fora os estaduais e de municípios que contam com regimes próprios. Uma Proposta de Emenda Constitucional que ficou conhecida como "PEC Paralela" chegou a ser mandada para o Congresso para tentar incluir essas categorias, mas empacou na Câmara. Os estados que não aprovaram reformas ainda têm regras antigas para a aposentadoria de servidores. A maioria permite, por exemplo, aposentadorias de homens aos 60 anos e mulheres aos 55 anos, considerando o tempo de contribuição. Em alguns deles, ainda há benefícios como integralidade - aposentadoria com o último salário - extinto no plano federal para quem passou em concursos após 2003. Desde que a reforma foi promulgada, em 12 de novembro do ano passado, 16 estados alteraram as regras de aposentadoria de servidores, segundo o Ministério da Economia. Foi o caso de São Paulo. Outros 7 não o fizeram. (veja abaixo). Boa parte dos estados que fizeram reformas adotou regras semelhantes à da Reforma da Previdência, com algumas diferenças. Em relação à idade mínima, o estado da Bahia, por exemplo, adotou as idades mínimas de 64 anos e 61 anos para homens e mulheres, respectivamente. Já Sergipe estabeleceu 65 anos e 60 anos. Em geral, adotam-se idades especiais para categorias como professores e policiais. Por outro lado, as iniciativas pouco avançaram em alguns estados. Em Santa Catarina, o então governador em julho, Carlos Moisés (PSL), retirou da pauta da Assembleia o projeto de reforma da previdência feito pelo Executivo após entender que modificações dos deputados estaduais reduziam a economia pretendida pelo governo. Em agosto, foi a vez do projeto do Amapá sair da pauta por falta de acordo. Em outros estados, caso do Rio de Janeiro, o projeto não chegou nem sequer a ser enviado ao Legislativo. Já no Rio Grande do Norte, que está incluso entre os estados que não fizeram reforma, segundo o ministério, um projeto de reforma foi aprovado em setembro. A norma eleva as idades mínimas de aposentadoria para 65 (homens) e 60 (mulheres), e entra em vigor em dezembro.Alíquota Outra medida introduzida pelo governo na Reforma da Previdência diz respeito à alíquota previdenciária cobrada dos servidores estaduais. O governo estabeleceu que o percentual mínimo precisa ser de 14%, ou então que seja adotado um modelo progressivo, de acordo com o salário, variando entre 7,5% a 22%. A adaptação deve ser feita até o final do ano, e apenas Amapá, Roraima e Tocantins ainda não adotam o modelo determinado.Déficit Especialistas ouvidos pelo R7 afirmam que a demora dos estados para se adaptarem às novas regras complica as contas desses entes federativos, ainda mais num momento em que acumulam dívidas por conta da pandemia.Déficit da Previdência chega a R$ 225 bilhões e supera total de 2019 Segundo Josué Pellegrini, diretor do IFI (Instituto Fiscal Independente), órgão ligado ao Senado, a previdência é deficitária não só no plano nacional, mas também nos estados, o que significa que o governo precisa de recursos não vinculados à Previdência para cobrir o rombo deixado pela verba destinada às aposentadorias. "Ao tirar verba do Tesouro estadual, os governos deixam de fazer mais investimentos em saúde, educação e segurança, atribuições constitucionais dos estados", afirma. Além disso, segundo Pellegrini, o déficit tem crescido em razão do envelhecimento dos servidores e das regras "generosas", segundo ele, como integralidade e paridade - quando reajuste dos funcionários da ativa vale também para os inativos. A afirmação de Pellegrini sobre os déficits são confirmadas por números do Tesouro Nacional. Em 2019, as previdências dos estados registraram um rombo de R$ 111,6 bilhões, 7% mais que o contabilizado em 2018, quando o buraco foi de R$ 100,5 bilhões. Apenas Amapá e Roraima não apontaram ter que retirar dinheiro extra do caixa do estado para cobrir valores de previdência não pagos pelas fontes próprias do sistema. O especialista em Previdência Carlos Heitor Campani, professor do Coppead/UFRJ, explica que a previdência no Brasil foi pensada décadas atrás considerando uma sociedade em crescimento. Hoje, no entanto, esse aumento da população é menor e ocorre o envelhecimento da população, com cada vez mais pessoas sendo sustentadas pela classe economicamente ativa. Ele explica que o modelo também se sustentou em razão dos juros altos que o Brasil praticava, o que permitia um ganho para o futuro sobre o valor descontado do funcionário. Isso, porém, não ocorre atualmente, já que o Brasil tem sua menor taxa de juros da história, com a Selic em 2%. "É um sistema que deu 'burn out', saiu fora do controle e não tem como se pagar", afirma Campani. Na opinião de Campani, o fato de a discussão ocorrer em um ano eleitoral favorece o adiamento da questão para 2021, já que a discussão da reforma previdenciária tem potencial para causar conflitos com os servidores. "Ano de eleição mexer nisso é muito complicado. O político tende a perder apoio e a sofrer impacto em relação à imagem do governo", afirma.Entenda ponto a ponto da reforma da Previdência de São PauloGoverno defende ajuste nos estados A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia, afirma que o aumento do déficit "comprime os orçamentos públicos". A secretaria afirma que a pandemia potencializou a dificuldade financeira e defende que o país caminhe no sentido de convergência entre os benefícios dos setores público e privado. Defensor do ajuste em todo o país, o governo incluiu os estados na proposta original de Reforma da Previdência enviada ao Congresso em 2019. O presidente Jair Bolsonaro e parlamentares da base aliada cobraram que governadores se posicionassem publicamente a favor da inclusão dos estados na reforma para que dividissem com a União o desgaste político junto aos servidores. Isso, porém, não ocorreu de forma ampla, levando à retirada dos estados do texto.Estados O governo do Distrito Federal afirma que ao atualizar a alíquota de previdência cobrada dos servidores para 14% já garantirá a saúde financieira do sistema. O valor passa a incidir sobre a folha de novembro. O governo do Maranhão informou que já houve adequações tanto no regime dos servidores civis quanto dos militares, por meio de leis votadas na Assembleia Legislativa. Destaca que foi criado o Comitê de Adequação do Regime Próprio de Previdência Social que está estudando outras propostas e que a pandemia do coronavírus impôs restrições e outras prioridades. O governo de Santa Catarina afirma que a intenção do Executivo é de reenviar o projeto em um momento "mais adequado, a fim de cumprir seu objetivo de trazer mais equilíbrio para a previdência estadual no longo prazo". O R7 procurou os demais governos estaduais que não fizeram reformas, segundo o Ministério da Economia, e não obteve respostas até o fechamento desta reportagem.