Toffoli: julgamento não se refere a nenhuma situação particular
Apesar de 4,9 mil presos poderem deixar a cadeia após decisão sobre 2ª instância, um deles, o ex-presidente Lula, é o beneficiado mais ilustre
Brasil|Do R7 com Agência Estado
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, aproveitou a sessão plenária desta quinta-feira (17) para avisar que o julgamento sobre a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância não "se refere a nenhuma situação particular".
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Dentro do STF, o comentário de Toffoli foi interpretado como uma forma de afastar as especulações de que o julgamento pode beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso e condenado no âmbito da Operação Lava Jato.
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"Que fique bem claro que as presentes ações e o presente julgamento não se referem a nenhuma situação particular. Estamos diante de ações abstratas de controle de constitucionalidade. O objetivo é, dada a provocação que vem — pois o Judiciário não age de maneira próprio, de ofício - dar o alcance efetivo e a interpretação a uma das garantias individuais previstas na nossa Constituição Federal. Esse entendimento se estenderá a todos os cidadãos brasileiros sujeitos à sua eventual aplicação, sem distinção", disse Toffoli, no início da sessão.
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"Gostaria de inicialmente destacar que se trata de julgamento que versa sobre o alcance do princípio da presunção de inocência previsto em nossa Constituição Federal. As ações ora submetidas a julgamento conjunto definirão o alcance dessa norma constitucional e o entendimento que daqui emanará, independentemente no sentido da sua conclusão, servirá de norte para a atuação de todos os magistrados do país e todo o sistema de justiça."
De acordo com Toffoli, a defesa da Constituição é o "que tem norteado a atuação republicana deste Supremo Tribunal Federal ao longo de sua história". "E hoje, e nas próximas sessões, não será diferente."
Retrocesso
A Procuradoria-Geral da República (PGR) alertou os ministros do Supremo que derrubar a possibilidade de prisão após a condenação em segunda instância representaria um "triplo retrocesso", atingindo inclusive a credibilidade depositada pela sociedade brasileira no STF.
Segundo a PGR, seria um retrocesso para o sistema de precedentes do sistema jurídico, que perderia "em estabilidade e segurança jurídica e teria sua seriedade posta em xeque"; "para a persecução penal no país, que voltaria ao cenário do passado e teria sua efetividade ameaçada por processos infindáveis", recursos protelatórios e "penas massivamente prescritas"; e "para a própria credibilidade da sociedade na Justiça e nessa Suprema Corte, como resultado da restauração da sensação de impunidade".
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O tema deve mais uma vez rachar o plenário do Supremo, opondo de um lado o grupo dos legalistas - que defendem uma resposta rápida da Justiça no combate à corrupção - e, de outro, os garantistas - chamados assim por destacar o princípio constitucional da presunção de inocência e os direitos fundamentais dos presos.
A sessão desta quinta-feira conta com as sustentações orais da Procuradoria-Geral da República, Advocacia-Geral da União (AGU), de entidades e dos autores das três ações que pretendem barrar a execução antecipada de pena – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Patriota e o PCdoB.
O voto do relator, ministro Marco Aurélio Mello, só deve ser lido na próxima quarta-feira (23), em sessão extraordinária convocada para o período da manhã. Depois dele, se posicionarão os outros 10 integrantes da Corte, em uma discussão que deve se estender por ao menos três sessões plenárias.
Os 11 ministros do plenário podem manter a compreensão em vigor ou voltarem à pratica anterior, que seguia o artigo 283 do Código de Processo Penal, de 2011, que diz: "Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva".
Votação no STF
Na configuração dos votos do STF, a tendência é que Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux peçam para continuar tudo como está. E vão querer mudança Celso de Mello, Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
Se Rosa Weber, que já se posicionou de formas diferentes sobre o tema, votar pela alteração, o placar fica 5 a 5 e caberá ao presidente, Dias Toffoli, o voto de minerva.
Ele já se pronunciou contra a prisão antes do último recurso e é possível que opte por uma sugestão intermediária, determinando que ela poderá ocorrer após recursos ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Impacto
Além de Lula, cerca de 4,9 mil presos podem ser beneficiados com uma mudança de entendimento do Supremo sobre o tema, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). De 2016 para cá, o STF já entendeu em quatro julgamentos que é possível a prisão após condenação em segunda instância — a última delas foi na análise de um habeas corpus do petista, que acabou negado pelo apertado placar de 6 a 5. Faltava, no entanto, o julgamento de mérito das três ações, formando o entendimento que deve ser aplicado para todas as instâncias judiciais do país.
A execução antecipada de pena era permitida até 2009, quando o STF mudou de jurisprudência para admitir a prisão apenas depois do esgotamento de todos os recursos. Em 2016, a Corte voltou a admitir a medida, considerada fundamental por procuradores e juízes na punição de criminosos do colarinho branco.