Um mês de Brumadinho: moradores não sabem como recomeçar a vida
Tragédia que devastou a cidade, no dia 25 de janeiro, já deixou 179 mortos e 131 desaparecidos; prefeitura diz que teme consequências econômicas
Brasil|Pablo Nascimento, do R7
Um mês após o rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, os moradores da cidade ainda não sabem como se reerguer. A incerteza assombra desde as famílias das vítimas a representantes do poder público, que têm a responsabilidade de tentar colocar a cidade de volta ao eixo.
A empregada doméstica Iolanda de Oliveira da Silva só teve coragem de lavar os uniformes do filho desaparecido na tragédia no último sábado (23). Robert Ruan Oliveira Teodoro, de 19 Anos, trabalhava há 7 meses como ajudante geral em uma empresa que prestava serviço para Vale, na mina Córrego do Feijão.
O jovem estava em campo no final da manhã do dia 25 de janeiro, quando a estrutura ruiu e engoliu funcionários da mineradora, moradores da região e as casas que havia no caminho. Teodoro e outras 130 pessoas ainda não foram encontradas. O número de mortes confirmadas chegou a 179.
Iolanda desabafa que, desde o dia da tragédia, a vida dela não foi mais a mesma. As consultas médicas se tornaram frequentes. Além disso, a família, que mora de aluguel, precisou se mudar de casa por causa da dor da lembrança de Teodoro.
— Agora, eu preciso tomar sete compridos de calmante por dia. Nem sei se quero ter forças para reerguer a minha vida.
Teodoro foi o terceiro filho que a doméstica perdeu. Em 2015, um de seus “meninos” morreu com leucemia aos 16 anos. Em outubro passado, o gêmeo de Teodoro foi morto a tiros em Brumadinho. Iolanda conta que a sucessão de “tragédias” só piora com a falta de informações sobre o paradeiro do corpo do caçula.
— Nos primeiros dias, eu caminhava 30 minutos para ir até o local das buscas para saber se ele havia sido encontrado. Hoje, eu já não tenho forças.
“Força” é o que a dona de casa Flávia Coelho, de 32, também tenta encontrar para superar a morte do pai — Olavo Henrique Coelho, então com 65. Conhecido como “Lau”, ele era um dos funcionários mais velhos da mina Córrego do Feijão. A barragem foi construída há 43 e o técnico operacional atuava nela há 40.
Depois do rompimento, Flávia deixou o emprego de agente de vigilância sanitária na Prefeitura de Brumadinho para cuidar das duas filhas pequenas. A mãe dela, que olhava as crianças durante a manhã, entrou em um quadro de depressão com a morte do marido.
Mesmo recebendo assistência por parte da Vale, Flávia conta que a sensação de angústia paira no ar, principalmente, pela falta de clareza sobre o que causou o estouro da represa. O irmão dela também trabalha na mineradora e foi uma das testemunhas ouvidas pelo Ministério Público nas investigações sobre o crime.
O depoimento dele foi um dos responsáveis por culminar na prisão de oito funcionários da empresa no último dia 15. Na conversa, o homem relatou que o pai foi chamado por engenheiros da Vale há 8 meses para ver a estrutura da barragem que estaria “brotando lama do talude”. Coelho teria dito que não havia conserto e que a empresa deveria ser evacuada.
— A Vale tem nos mostrado, diariamente, laudos atestando a estabilidade da barragem. Mas se, de fato, houve a inspeção correta, por que ela caiu?
Cidade em luto
O sentimento de dor que mina os familiares das vítimas é percebido nas casas, nos comércios e nas ruas de Brumadinho. Na prefeitura não é diferente. O vice-prefeito da cidade, Leônidas Vicente da Silva Maciel (PR), revela que o trabalho foi difícil no último mês.
A equipe tem dividido o pesar das perdas com a preocupação sobre o futuro do município. Segundo Maciel, a paralisação da mina da Vale pode causar um rombo de 40% na arrecadação de Brumadinho. A previsão é de que o estrago seja maior caso os funcionários da mineradora fiquem sem emprego, uma vez que a empresa é a segunda maior contratante da cidade.
A Vale se comprometeu a repassar à prefeitura o Cfem (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais) pelos próximos dois anos, mesmo que as atividades fiquem paradas. Quanto ao emprego dos trabalhadores, a companhia garantiu estabilidade até dezembro deste ano. Ainda assim, Maciel afirma que a preocupação é com o que acontecerá depois deste período.
— Nós já tivemos o maior prejuízo que foi o humano. Agora, as perdas financeiras vão ser sentidas a longo prazo.
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A prefeitura tenta solução para o impasse com os governos federal e estadual, mas as negociações ainda estão em fase de conversa. Enquanto isso, Maciel lembra de como era a cidade antes para encontrar forças para continuar o trabalho.
— Brumadinho sempre foi linda, com muita área verde. Hoje ela está triste e é uma cidade inteiramente em luto.
Mortes, prisões e luto marcam um mês de tragédia em Brumadinho: