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R7 Brasília

AGU recorre de decisão do TCU e pede que presentes recebidos por Lula sejam auditados em 2026

Advocacia-geral argumenta que determinação de fiscalizar itens ganhados por presidentes ao fim do mandato é do próprio TCU

Brasília|Ana Isabel Mansur, do R7, em Brasília

Pedido de fiscalização em 2023 partiu da oposição
Pedido de fiscalização em 2023 partiu da oposição Ricardo Stuckert/Presidência da Repúlica - 07.02.2024

A AGU (Advocacia-Geral da União) recorreu da decisão de auditar e fiscalizar os presentes recebidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2023. O pedido da AGU, feito ao TCU (Tribunal de Contas da União) na última sexta-feira (2), solicita que o processo ocorra apenas em 2026. A advocacia-geral argumenta que a determinação de auditar os itens ganhados por presidentes da República apenas ao fim do mandato é do próprio TCU.

A AGU informou que a fiscalização antes do término da gestão seria inédita. A decisão do tribunal de fiscalizar os presentes recebidos por Lula no ano passado partiu de um pedido de parlamentares da oposição e foi dada pelo ministro da Corte Augusto Nardes, em dezembro de 2023. 

Os advogados-gerais defendem que a auditoria antes do fim do mandato representa "gastos desnecessários e inoportunos de tempo, força de trabalho, tanto da Corte de Contas, quanto da Presidência da República, tornando inócuos recursos públicos tão caros à sociedade brasileira". Para o órgão, a decisão do TCU de adiantar a fiscalização mostra "omissão e obscuridade".

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Para decidir que a auditoria fosse feita em 2023, o ministro Nardes afirmou que a fiscalização ao fim do mandato presidencial não impediria "a realização imediata de solicitações do Congresso Nacional".


Lula recebeu 1.150 presentes desde 1º de janeiro até 22 de agosto de 2023, como mostram dados obtidos pelo R7 via Lei de Acesso à Informação (LAI). Os objetos vão desde suplemento alimentar até esculturas, vasos ornamentais, cachaça e um violão autografado por Chris Martin, vocalista da banda britânica Coldplay. Durante pouco mais de oito meses, o petista recebeu itens de pelo menos 41 países, como China — que ocupa a primeira posição da lista —, Rússia e Estados Unidos.

Legislação

As normas brasileiras que regem os presentes dados a autoridades públicas deixam margem para interpretações diversas sobre o conceito de "patrimônio pessoal", dizem especialistas ouvidos pelo R7.


Na prática, todos os presentes recebidos por presidentes da República devem ser incorporados ao patrimônio público brasileiro porque os itens são, em regra, endereçados à nação brasileira e não à pessoa física do presidente.

"Todavia, tal prática não tem sido observada, gerando questionamentos judiciais e determinações de devolução de presentes e incorporação deles ao patrimônio da União", aponta o advogado Antonio Carlos de Freitas Júnior, especialista em direito constitucional e eleitoral.


O conceito de patrimônio pessoal na legislação é aberto a interpretações. É razoável entender que podem ser considerados públicos itens de vestuário, como camisas, gravatas e chapéus, e também itens personalizados, como seria o caso de uma medalha com o nome do então presidente. Isso quer dizer que os demais bens, valiosos ou não, devem ser incorporados ao patrimônio público, uma vez que são entregues ao chefe do Poder Executivo justamente em função daquilo que representa, e não dados à pessoa do presidente em si.

(ADVOGADO ANTONIO CARLOS DE FREITAS JÚNIOR, ESPECIALISTA EM DIREITO CONSTITUCIONAL E ELEITORAL)

A única lei específica sobre o tema é de 1991 e trata da preservação, organização e proteção dos acervos documentais privados dos presidentes da República. O texto não tem como objeto os itens em si, mas a memória do país — o que deixa brechas para interpretações diversas. A lei não chega a citar presentes em nenhum dos artigos.

Em 2002, essa norma foi regulamentada por meio de um decreto presidencial. Foi a primeira vez que a legislação tratou do recebimento de presentes por chefes do Executivo federal. O regulamento considerou de propriedade da União os itens "bibliográficos ou museológicos" produzidos em cerimônias de troca de presentes, visitas oficiais ou viagens de Estado do presidente da República ao exterior e nas visitas oficiais de chefes de Estado e de governos estrangeiros ao Brasil.

"Assim, era entendido pelos presidentes que apenas os presentes recebidos nessas ocasiões eram públicos, enquanto os itens que não fossem 'bibliográficos nem museológicos' ou que fossem recebidos em outras ocasiões seria patrimônio privado deles", acrescenta Freitas.

Em 2016, o TCU publicou acórdão para determinar que todos os presentes e documentos recebidos pelos presidentes, independentemente da ocasião, devem ser incorporados ao patrimônio público, excluídos os itens de natureza "personalíssima", como medalhas personalizadas, ou de consumo direto, como bonés, camisetas e gravatas.

De acordo com o advogado, quaisquer itens podem ser recebidos. "Não é possível regulamentar a vontade e as ações daqueles que entregam presentes. O que diferencia cada presente recebido é a destinação", explica.

"Qualquer servidor público — do mais baixo ao presidente da República — é proibido de receber presentes de pessoas que tenham interesse em decisões, ou seja, os destinatárias dos atos administrativos", afirma o advogado e professor de direito João Pedro Mello.

Os presentes diplomáticos, que não podem ser recusados, são divididos em duas categorias: os personalíssimos e os que não se enquadram nessa categoria. "O TCU tem entendido que os objetos recebidos nessas circunstâncias diplomáticas pertencem à União, não à autoridade — a não ser que o presente seja considerado de caráter personalíssimo. E esse conceito de caráter personalíssimo é um conceito aberto, que precisa ser avaliado caso a caso", argumenta.

De acordo com o Palácio do Planalto, ao fim da gestão cabe à Presidência da República providenciar a mudança do ex-presidente e o envio da parte pessoal do acervo recebido. "Nesse caso, o ex-titular passa a ser o responsável pelos itens e ter a obrigação de preservá-los", diz.

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