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Comissão do Senado planeja votar marco temporal nesta quarta, mas governo quer frear discussão

Uma audiência com representantes indígenas vai preceder a votação, o que pode levantar novas questões para arrastar decisão

Brasília|Bruna Lima, do R7, em Brasília

Indígenas protestam contra marco temporal em Brasília
Indígenas protestam contra marco temporal em Brasília

O projeto do marco temporal das terras indígenas deve ser votado nesta quarta-feira (23) na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado. Existe um acordo de líderes para isso, mas o governo tenta frear o andamento da matéria. Uma audiência pública com representantes dos povos originários vai ser realizada antes da votação, e a avaliação de parlamentares contrários à proposta é que o debate pode trazer elementos para arrastar a discussão. 

O marco temporal cria a tese jurídica de que os povos indígenas têm direito a terras que ocupavam ou já disputavam na data de promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. O tema é controverso, e a bancada ambientalista teme a perda de direitos fundamentais dos povos originários. 

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A audiência foi um pedido do senador Beto Faro (PT-PA) com a justificativa de encontrar um meio-termo entre o pleito dos indígenas e o do mercado ligado ao agronegócio. "É um tema extremamente polêmico e sobre o qual nós precisamos achar uma solução definitiva não radicalizada, nem de uma posição, nem de outra", disse. 

Relatora da proposta, a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) apresentou um parecer favorável ao texto, tal como ele veio da Câmara. O movimento atende à bancada ruralista, que quer acelerar a tramitação e evitar que o projeto volte para uma nova análise dos deputados. 


"A aprovação do projeto corresponderá, por uma parte, à solução mais adequada para viabilizar a resolução das questões legais e constitucionais envolvendo demarcação de terras indígenas no Brasil e, por outra, a melhor forma para garantir previsibilidade, segurança jurídica e desenvolvimento ao país", defendeu Thronicke. 

Na Câmara, o projeto foi aprovado em regime de urgência, sem passar pelas comissões, o que, politicamente, foi um recado ao governo sobre a falta de uma base consistente. Já no Senado, o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) prometeu a tramitação normal. "Prudência é submeter à comissão antes de submeter ao plenário, permitindo a quem queira debater o tema que também debata no Senado", afirmou. 


Leia mais: Sete pontos para entender o projeto de lei do marco temporal

Ainda assim, a bancada ruralista quer que, após aprovação na CRA, o texto não seja votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e vá diretamente para a deliberação em plenário. Mas não há sugestão por parte de Pacheco e dos líderes para que isso ocorra. 

A sinalização, inclusive, é oposta. Mais audiências públicas devem ser realizadas na CCJ. Outra estratégia avaliada pela bancada ambientalista é segurar a votação até que haja uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), onde o julgamento do tema só deve ser retomado em setembro. O ministro André Mendonça fez um pedido de vista. 

Bancada ambientalista

Na CCJ, a base governista tem nas mãos um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que mostra inconstitucionalidade da proposta de "diversos dispositivos do projeto, que necessitam de aprimoramento, para adequarem-se às normas constitucionais", diz o documento ao qual a reportagem teve acesso. 

Uma nota técnica do Ministério dos Povos Indígenas também embasará os argumentos dos senadores contrários ao marco temporal. Como a proposta regulamenta o artigo 231 da Constituição Federal, a pasta compreende que o referido trecho é cláusula pétrea, o que justificaria a inconstitucionalidade. "Porquanto a matéria nele versada é de todo intangível, não podendo ser alterada nem mesmo por emenda constitucional", argumenta a nota. 

"O projeto visa transformar as terras indígenas em objetos de mercantilização, afeta a organização social dos povos indígenas e suas relações sagradas com o território, compromete a vida de todos nós diante da tragédia climática anunciada que anda de mãos dadas com o referido projeto, bem como contraria os compromissos assumidos pelo Brasil com o Acordo de Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, o que poderá acarretar, inclusive, a perda de investimentos internacionais", sustenta o ministério ao recomendar a rejeição integral do texto. 

Bancada ruralista

Já o grupo favorável ao projeto argumenta a necessidade de definir o marco como forma de trazer segurança jurídica e fortalecer o direito à propriedade. A bancada ruralista é a maior no Congresso e, por isso, tem peso em articulações como essa. 

Na avaliação do senador Marcio Bittar (União-AC), há uma "questão ideológica clara" por trás do debate e que relativiza o direito à propriedade privada. "Essa insegurança é a tentativa de setores, no Brasil, de relativizar o direito à propriedade no país. Se nós não ratificarmos esse projeto, nós vamos colocar todo o produtor rural brasileiro, pequeno, médio e grande, na insegurança jurídica", alegou. 

A senadora Tereza Cristina (PP-MS) argumenta que o tema é de Estado, e não de governo. "Esse é um assunto que perpassa governos e que há muitos anos precisava ser resolvido. Esta Casa, o Congresso Nacional, primeiramente na Câmara e agora no Senado, coloca esse assunto em discussão, em votação, e eu espero que a gente o leve ao plenário o mais rapidamente possível", pressionou.

O próprio presidente da CRA, senador Alan Rick (União-AC), quer despachar o tema da comissão já na quarta-feira (23) sob a alegação de dar uma resposta à sociedade. 

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