Mesmo sob críticas, Randolfe quer insistir em manobra contra maioria conservadora no Senado
Randolfe é a favor de que eleitores votem em apenas um candidato nos anos em que cada unidade da Federação elege dois senadores
Brasília|Do R7
Líder do governo no Congresso Nacional, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) pretende insistir, em 2025, no projeto de lei que pode mudar a forma como o eleitor escolhe os senadores nas eleições para renovação de dois terços da Casa. O texto foi apresentado pelo parlamentar em 2 de dezembro, mas foi retirado por ele próprio na segunda-feira (9). A partir do próximo ano, ele pretende trabalhar a proposta dentro do novo Código Eleitoral, que tramita na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado.
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A proposta do senador recebeu críticas no Congresso, e especialistas entendem que a mudança que Randolfe quer implementar é inconstitucional, pois pode diminuir o poder do voto do eleitor.
A sugestão do parlamentar prevê que, nos pleitos em que são eleitos dois senadores por unidade da Federação (o que acontece de oito em oito anos), cada eleitor vote apenas em um candidato, e não em dois, como ocorre atualmente. Continuariam sendo eleitos os dois nomes mais votados por estado.
Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro consideraram a medida uma tentativa de impedir uma maioria conservadora no Senado depois de 2026, ano em que cada unidade da Federação vai escolher dois novos senadores. O ex-presidente tentará eleger a maior bancada conservadora no próximo pleito.
Atualmente, o PL, de Bolsonaro, tem 14 senadores, sendo a segunda maior bancada da Casa. O partido pretende lançar ao Senado, inclusive, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
Na justificativa da proposta que acabou retirando depois de apresentar, Randolfe usou como justificativa a polarização na política.
“Imaginemos uma unidade da Federação em que os eleitores se dividam no apoio a dois partidos, em percentuais de 60% e 40%. A renovação de dois terços do Senado feita sob as regras atuais permite que os três representantes de cada unidade da Federação na Câmara Alta sejam do mesmo partido, ainda que mais de um terço dos eleitores tenha outra preferência política. Em um ambiente polarizado como o atual, mecanismos que contribuam para estimular a diversidade da representação política são essenciais”, argumentou o senador.
O novo Código Eleitoral que Randolfe quer usar para levar a proposta adiante já tramita no Senado. A matéria é relatada pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI). O parlamentar já apresentou duas versões do relatório na CCJ e ainda busca um acordo para a votação.
Filho do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) criticou a proposta, que classificou como “oportunista”. “Essa é a regra moral da extrema esquerda: se não dá no voto, muda a regra… ou compra o juiz, sei lá?”, escreveu o senador nas redes sociais.
Especialistas criticam proposta
O advogado constitucionalista André Marsigla classificou a proposta como “inconstitucional”, pois alega que ela “diminui o poder do voto do eleitor, restringindo seu alcance, e o direito ao voto é cláusula pétrea”. “Se é pétreo, o direito não pode ser diminuído ou restringido”, disse.
“O efeito pretendido pelo senador me parece ser impedir que a maioria dos eleitores vote em um mesmo partido para mais de uma vaga, criando uma reserva de mercado a partidos menos convincentes. Além de pouco republicano, essa reserva poderia ser um impeditivo a partidos e candidatos de direita, em franco crescimento no gosto popular”, ponderou.
Ex-ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o advogado Admar Gonzaga disse que a intenção de propor tal mudança pode “transparecer casuísmo de quem eventualmente se sinta eleitoralmente fragilizado”.
Além disso, ele destacou que, em virtude do teor do projeto, a proposição deveria ser submetida a uma Assembleia Nacional Constituinte ou tramitar via PEC (Proposta de Emenda à Constituição).
O cientista político Murilo Medeiros declarou que o projeto já “nasceu com uma vertente política muito clara, de tentar brecar o avanço de parlamentares mais à direita no Senado”. Além disso, destacou que, qualquer mudança eleitoral, para valer em 2026, precisa ser aprovada até outubro de 2025.
“Dificilmente um tema dessa envergadura vai conseguir avançar até lá”, pontuou. Ele explicou que, desde as eleições de 2018, houve um crescimento da centro-direita e da direita no Congresso.
“É muito provável que, em 2026, quando serão renovados dois terços das cadeiras do Senado, o voto conservador cresça ainda mais na Câmara Alta do Parlamento Brasileiro. É muito provável que legendas de centro-direita e de direita cresçam na sua representação no Senado Federal e conquistem maioria”, continuou.
Ele explicou ainda que o próprio PT, o PSB e o PDT, partidos de esquerda e de centro-esquerda, vão ter uma “alta taxa de renovação”. O especialista disse ainda que o projeto não é eficaz para impedir o aumento da ala conservadora no Congresso.
“O que o campo progressista brasileiro precisa fazer não é alterar as regras do jogo no meio da jornada, e sim convencer o eleitorado de que seu projeto político e que as diferenças são necessárias para ocupar o Senado Federal. O jogo se vence na urna, no debate de ideias de propostas e não com alterações casuísticas da regra eleitoral”, finalizou.