Minerais estratégicos e terra rara: saiba o que são as riquezas naturais de interesse dos EUA
Governo de Trump sinalizou para empresários brasileiros interesse em minérios do Brasil; Lula descarta negociação dos recursos
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Os chamados minerais estratégicos e terras raras estão no centro de um novo embate entre Estados Unidos e Brasil. O encarregado de negócios da Embaixada americana no Brasil, Gabriel Escobar, em reunião com empresários do Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração), manifestou interesse nas reservas brasileiras desses recursos.
O diálogo, entretanto, ocorreu com representantes do setor privado, e não com o governo brasileiro.
Em resposta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva descartou usar a exploração desses minérios como moeda de troca para redução das tarifas de 50% impostas por Trump. Lula declarou que essas riquezas pertencem ao Brasil e devem ser exploradas pelo povo brasileiro (veja posicionamento abaixo).
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Professor e doutor em relações internacionais, Guilherme Frizzera afirma que o interesse dos Estados Unidos pelos minerais estratégicos brasileiros se insere em um contexto mais amplo de disputa global por recursos essenciais à transição digital e energética.
“Minerais como terras raras, lítio e nióbio são insumos centrais para tecnologias de ponta, da produção de semicondutores à defesa cibernética, e sua escassez relativa os transforma em ativos geopolíticos”, aponta Frizzera.
Para ele, a América do Sul, e o Brasil em particular, emergem nesse cenário com uma nova centralidade, não como polos tecnológicos, mas como fontes dessas matérias-primas críticas.
“Essa posição confere visibilidade internacional, mas também eleva a vulnerabilidade geopolítica da região, tornando-a alvo preferencial de pressão na política externa”, explica.
Para Frizzera, a sinalização do presidente Lula de que esses recursos não serão utilizados na negociação das tarifas revela uma “escolha estratégica”.
Quando um país opta por mapear e proteger essas riquezas, indica que sua inserção internacional será pautada pela defesa de interesses próprios, e não por alinhamentos impostos de fora.
“Isso implica fortalecer sua capacidade de regulação, desenvolver competências tecnológicas associadas a esses insumos e proteger as infraestruturas digitais que os tornam exploráveis”, diz.
Segundo o professor, a medida busca evitar que recursos nacionais sejam incorporados a cadeias globais em termos desfavoráveis.
“Ao recusar o uso dos minerais como instrumento de barganha, o Brasil se posiciona de forma mais autônoma diante da pressão internacional, preservando sua margem de decisão em um cenário de competição cada vez mais assimétrica”, observa.
O que são esses minerais?
O diretor-presidente do SGB (Serviço Geológico do Brasil), Inácio Melo, explica que os elementos de terras raras correspondem a um grupo de 17 elementos químicos encontrados em algumas associações minerais, principalmente de nióbio e fosfato.
“Esses elementos são essenciais em diversas tecnologias modernas, como ímãs, baterias, lasers, telas de LCD, turbinas eólicas, equipamentos eletrônicos e, obviamente, transição energética”, afirma.
Ele destaca que o Brasil possui a segunda maior reserva de terras raras do planeta.
“Equivalente a 23% do total de reservas globais. O primeiro país nesse ranking é a China, segundo dados dos serviços geológicos dos Estados Unidos. Isso mostra o potencial do país para esses elementos”, ressalta Inácio Melo.
A principal reserva brasileira está em Minas Gerais, segundo Melo, no município de Araxá, no Alto Paranaíba, também detentor da maior reserva mundial de nióbio.
O diretor-presidente do SGB informou ainda que o país avança na produção em Goiás, no município de Minaçu.
“Temos uma mina em operação do tipo argila iônica. Os elementos raros presentes nesse tipo de argila são os de maior valor agregado. São semelhantes aos depósitos do sul da China, por exemplo. O destaque é que essa é a primeira mina do Brasil e a primeira fora da Ásia para depósito desse tipo”, explica.
Ele acrescenta que “há um empenho do governo federal para fortalecer toda a cadeia de valor de terras raras”.
Esses elementos são muito importantes para a indústria de alta tecnologia, de energia limpa e também para a indústria de defesa. Por isso, o mundo inteiro está de olho neles.
“A aplicação de terras raras é ampla, indo de ímãs superpotentes a componentes de alto desempenho em produtos eletrônicos. Para se ter uma ideia, um ímã de neodímio, sendo um dos elementos de terras raras, pode armazenar cerca de 18 vezes mais energia magnética do que um ímã de ferro do mesmo volume”, afirma Inácio Melo.
Ele defende que a chave para colocar o Brasil como principal produtor mundial de terras raras está na superação de limitações tecnológicas dos recursos atualmente conhecidos.
Desafios de extração
Geólogo do Seridó Unesco Global Geopark e mestre em geociências, Silas Costa aponta que o principal desafio é a extração.
“Eles ocorrem em baixíssimos teores, principalmente em rochas ígneas, nos granitos, mas também em capas lateríticas ou em argilas iônicas. É necessária uma tecnologia mais apurada, uma tecnologia ambiental capaz de suportar esse tipo de exploração mineral”, diz.
Ele acrescenta: “As terras raras existem em teores que variam de 30 ppm até 140 ppm, ou seja, 0,003% a 0,010% de material por minério. Então, a cada tonelada retirada, obtém-se cerca de 0,003% de elementos. Realizar o extrativismo e a metalurgia extrativa desses elementos é o desafio”.
Minerais críticos
Os minerais críticos ou estratégicos variam conforme o país.
“Eles são estratégicos para o desenvolvimento de cada nação. Na economia global vigente, estão associados à transição para a economia verde, à nanotecnologia e à mudança da matriz energética. Entre eles estão o nióbio, o lítio e o berílio”, ponta.
Cada país ou região tem sua lista. Os Estados Unidos classificam como críticos o lítio, a grafita, os elementos de terras raras, o cobalto, entre outros.
A União Europeia também inclui o lítio, o cobalto e os elementos de terras raras, mas mantém uma lista com 34 minerais, entre eles tungstênio, níquel e cobre, que não constam na lista norte-americana.
“Isso varia conforme a necessidade de cada mercado”, explica Silas Costa.
O geólogo avalia que minerais críticos e terras raras são fundamentais para o avanço tecnológico.
“As próximas tendências — computadores, celulares, processadores, microprocessadores — dependerão do avanço tecnológico e das técnicas extrativistas e metalúrgicas. São essenciais porque a tecnologia e o mercado demandam intensamente esses elementos para uso industrial”, analisa.
Comissão Especial
No fim do mês passado, Lula anunciou a criação de uma “comissão ultra-especial” para mapear as reservas do Brasil e reforçou que nenhuma empresa pode explorar o recurso sem anuência do governo federal. A declaração foi feita em resposta ao interesse norte-americano nas reservas brasileiras.
“Agora inventaram uma coisa chamada minerais críticos e terras raras. Para um geólogo isso já era discutido, mas para o resto [das pessoas], é um assunto novo. E eu fiquei sabendo que os Estados Unidos quer auxiliar a Ucrânia, mas está querendo ter privilégio nos minerais críticos ucranianos. Esses dias, li outra matéria sobre o interesse [dos EUA] nos minerais críticos do Brasil”, afirmou Lula.
Em seguida, o presidente questionou: “Por que vou deixar outro [país] pegar [esses recursos]? Estamos construindo uma parceria no governo, com a criação de uma Comissão Ultra-Especial, primeiro para a gente fazer o levantamento de todo tipo de riqueza que o Brasil tem no solo e no subsolo”.
Lula explicou que o país conhece cerca de 30% das riquezas do território nacional.
“Ou seja, temos 70% das nossas riquezas ainda não pesquisadas e precisamos autorizar a empresa a pesquisar sob nosso controle. Não podemos relaxar, nem [os empresários] vender sem conversar com o governo e muito menos vender a área onde está o minério. Aquilo é nosso, é do povo brasileiro”, reforçou.
Durante o discurso, o chefe do Palácio do Planalto acrescentou que o Brasil pode liderar avanços na transição energética usando, inclusive, esses recursos.
“Nesse momento em que o mundo vive, em que a energia passa a ser o ouro do momento, porque só se fala em transição energética, energia renovável e sustentável, etanol, biodiesel e hidrogênio verde… e todas essas coisas no Brasil temos de sobra. É aí que o Brasil pode ser o país mais importante dessa questão da transição energética”, disse.
Lula concluiu afirmando que “em se tratando de transição energética, o Brasil pode ser um país imbatível”.
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