Beatriz Matos em fala durante Comissão Temporária sobre a Criminalidade na Região Norte
Divulgação/TV SenadoA antropóloga Beatriz Matos, viúva do indigenista Bruno Pereira, disse, durante audiência pública da Comissão Temporária sobre a Criminalidade na Região Norte, que o marido e o jornalista Dom Phillips foram assassinados por exercerem um trabalho que deveria ser política pública do governo. Ela e o líder indígena e ex-coordenador da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) Jader Marubo foram ouvidos pela comissão na manhã desta quinta-feira (14), no Senado.
"Há essa falta de ação do poder público em proteger as terras indígenas e dos povos que ali vivem", afirmou. Comovida com o reconhecimento que o marido ganhou dos povos indígenas pelo seu trabalho, Beatriz ressaltou a importância da comissão acompanhar os desdobramentos da investigação.
Marubo disse que tem medo do que pode vir acontecer com ele e com a população da região por causa das ameaças. Segundo ele, a Funai não se pronunciou em relação aos últimos assassinatos. “ Não houve nem uma nota de solidariedade para quem está fazendo um trabalho efetivo.”
Jader Marubo durante audiência
Divulgação/TV Senado
Mais de um mês depois do assassinato, Beatriz disse que até então nenhum plano emergencial foi executado para a proteção da região do Vale do Javali, enfatizando que os funcionários da Funai, os moradores, o movimento indígena e os próprios indígenas continuam desprotegidos.
"Ações de estímulo e incentivo deveriam ser entregues, para que as pessoas tenham alternativas de vida naqueles lugares, que possam viver normalmente sem ter medo de serem mortas", falou.
A audiência pública foi para discutir sobre ações da Funai e sobre o apoio às famílias de vítimas da violência na região.
Beatriz acentuou que o crime não pode ficar impune, relembrando o assassianto de Maxciel Pereira dos Santos. Amigo e colega de trabalho de Bruno, Maxciel foi morto em setembro de 2019, com dois tiros na nuca na Avenida da Amizade (AM), e até hoje, o crime não foi esclarecido pela Polícia Federal do Amazonas.
A antropóloga concluiu sua fala pedindo que o legado de seu marido seja respeitado, apesar de gerar indignação as declarações que menosprezem o trabalho de Bruno.
O indigenista brasileiro Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips desapareceram no dia 5 de junho, após terem sido vistos pela última vez na comunidade São Rafael, nas proximidades da entrada da Terra Indígena Vale do Javari, região com o maior registro de povos isolados no mundo. A área sofre pressão há anos pela atuação de narcotraficantes, pescadores, garimpeiros e madeireiros ilegais que tentam expulsar povos tradicionais da região.
Bruno era servidor da Funai, mas estava licenciado desde que foi exonerado da chefia da Coordenação de Índios Isolados e de Recente Contato, em 2019. Dom morava em Salvador, na Bahia, e fazia reportagens sobre o Brasil havia 15 anos para os jornais The New York Times, The Washington Post e The Guardian.
No dia 15 de junho, a Polícia Federal localizou os restos mortais dos dois. A corporação encontrou os cadáveres depois de o pescador Amarildo da Costa confessar os assassinatos e levar policiais até o local onde havia enterrado os cadáveres.
*Estagiária sob supervisão de Fausto Carneiro.