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Mulheres com deficiência sofrem até sete vezes mais violência que homens, diz estudo

Segundo Atlas da Violência 2024 deficiência intelectual tem maior número de vítimas entre as pessoas com deficiência

Brasília|Edis Henrique Peres, do R7, em Brasília


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Mulheres com deficiência sofrem mais violência que homens Pedro Ventura/Agência Brasília - 23/04/2015

Mulheres com deficiência sofrem até sete vezes mais violência que homens PCDs. Os dados são do Atlas da Violência 2024 e revelam que enquanto 3.064 mulheres foram abusadas sexualmente em 2022, o número no caso de homens com deficiência foi de 442 ocorrências. A diferença, no entanto, não se restringe apenas a violência sexual. Segundo o Atlas, as mulheres são as mais afetadas em todos os grupos de deficiência. Sendo que as mulheres com deficiência intelectual, por exemplo, enfrentam taxas que ultrapassam mais que o dobro a dos homens na mesma condição. No caso de violência doméstica, as mulheres tiveram um registro 2,6 vezes maior do que os homens.

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O estudo avalia que para as mulheres com deficiência existem especificidades como isolamento social, dependência de cuidadores e a incapacidade de se defender fisicamente, que contribuem para o maior risco a violência. Atualmente, o Brasil tem cerca de 18,6 milhões de pessoas com dois anos ou mais com alguma deficiência, o que representa 8,9% da população, segundo a PNADc (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) de 2022.

Para a professora da Universidade Federal do Ceará e advogada da BMC Advogados Associados Joyceane Bezerra de Menezes, a legislação oferece um suporte necessário à proteção das pessoas com deficiência, mas “falta capacitação profissional e fiscalização da sua aplicação”.

Há uma interseccionalidade de fatores de vulneração atingindo a mulher com deficiência. A limitação permanente, seja ela de natureza física, intelectual ou psíquica somada às barreiras sociais gera impedimentos graves ao exercício dos direitos, o que implica a maior suscetibilidade a lesão e, portanto, maior vulnerabilidade

(professora da UFC, Joyceane Bezerra de Menezes)

A professora acrescenta que o gênero é um fator de vulnerabilidade. Ou seja, ser mulher e ter deficiência potencializa o risco de sofrer violência. “Elas estão sujeitas as variadas formas de discriminação e opressão decorrentes do sexismo, capacitismo e violência de gênero que, uma vez sobrepostas, potencializam o estado de vulneração”, diz.


Joyceane explica que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº13.146/2015) impõe ao Estado e à sociedade o dever de proteger a pessoa com deficiência de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, tortura, crueldade, opressão e tratamento desumano ou degradante e que a norma “considera especialmente vulneráveis, as crianças, os adolescentes, as mulheres e as pessoas idosas”.

Violência dentro de casa

A violência é mais difícil de deter quando as agressões são cometidas pelos próprios cuidadores e familiares. Segundo o Atlas, a violência doméstica lidera o número de notificações, com 8,3 mil registros. A tipificação é seguida pela violência comunitária (3.481), enquanto a violência institucional foi responsável por 458 notificações em 2022. Nos dados, as pessoas com deficiência física (65,4%) e visual (63%) registraram o maior percentual de violência doméstica, em relação aos demais tipos de violência.


A professora da Universidade do Ceará acrescenta que “falta a inclusão efetiva e a garantia da acessibilidade a todos os direitos, em igualdade de condições com as demais pessoas”.

Não é raro que a própria família esteja imersa em uma postura capacitista que descrê na possibilidade de favorecer uma educação para a cidadania e autodefesa, mantendo essas pessoas como mero objeto de proteção. Nesse sentido, é importante o apoio às famílias para que possam reconfigurar a percepção da deficiência. De todo modo, a fundamental o aprimoramento da legislação e capacitação profissional para proteção das pessoas com deficiência contra a violência e discriminação”, disse.

Lacunas nas políticas públicas

Professor da Escola Superior de Advocacia do DF e mestre em direito empresarial e governança Watson Silva observa que a discussão sobre os direitos das pessoas com deficiência e as políticas públicas revelam importantes avanços, “mas também inúmeras lacunas que precisam ser preenchidas para garantir uma sociedade verdadeiramente inclusiva e equitativa”.


O especialista observa, por exemplo, que a acessibilidade costuma ser um desafio. “Seja a acessibilidade física, comunicacional ou digital. Muitos espaços públicos e privados ainda não estão adequadamente adaptados para receber pessoas com deficiência. É necessário um investimento contínuo em infraestrutura acessível, bem como na sensibilização de gestores públicos e privados sobre a importância de ambientes inclusivos”, diz.

Outro ponto levantado pelo especialista é que falta inclusão no mercado de trabalho.

A Lei de Cotas (Lei nº 8.213/1991) estabelece a obrigatoriedade de contratação de pessoas com deficiência, mas a realidade mostra que muitas empresas ainda não cumprem essa determinação de forma efetiva. Programas de capacitação profissional e incentivos para a contratação de pessoas com deficiência são essenciais para promover a inclusão no mercado de trabalho

(Professor da Escola Superior de Advocacia do DF, Watson Silva)

O Atlas da Violência mostra, por exemplo, que a autonomia é um fator de prevenção contra a violência contra PCDs. Por isso, mulheres com maior escolaridade conseguem se defender melhor, assim como quem está inserido em movimentos associativos de pessoas com deficiência e tem emprego remunerado fora de casa. A pesquisa observa que, por outro lado, o recebimento de benefícios financeiros do governo pode representar um fator de risco para a violência doméstica e sexual para essas mulheres, porque os agressores muitas vezes controlam os recursos econômicos de suas parceiras

Participação

Para Silva, as pessoas com deficiência também devem ter a oportunidade de participar da elaboração e avaliação das políticas pública que os atendem. “Isso inclui a criação de conselhos, comitês e outras formas de participação que assegurem a representatividade e a voz das pessoas com deficiência nas decisões que afetam suas vidas”.

O especialista afirma que, “embora o Brasil tenha avançado significativamente na proteção e promoção dos direitos das pessoas com deficiência, há ainda um longo caminho a ser percorrido”.

É imprescindível que o poder público, a sociedade civil e o setor privado trabalhem juntos para eliminar barreiras e construir um país mais justo e inclusivo para todos. O compromisso com a efetividade das leis, a acessibilidade, a educação, a inserção no mercado de trabalho, a saúde, a segurança e a participação social deve ser contínuo e robusto para garantir que as pessoas com deficiência possam exercer plenamente seus direitos e viver com dignidade

(Professor da Escola Superior de Advocacia do DF, Watson Silva)

O que dizem os dados

Segundo o Atlas, as pessoas com deficiência sofrem diversas violências ao longo da vida, “incluindo tipos específicos relacionados à deficiência e ao gênero, como retenção de medicamentos, o excesso de medicação e a negligência das necessidades básicas diárias, como higiene pessoal e cuidados médicos e violência sexual”.

De acordo com o estudo, a desigualdade é o principal motivo de violência. “Processos como institucionalização, segregação, estigmatização, preconceito e discriminação, que culminam em exclusão social, permeiam as experiências de opressão e violência direcionadas a esse grupo. Além disso, a interseccionalidade da deficiência com outras características sociais, como gênero, raça/etnia, idade e classe social, amplifica a vulnerabilidade de certos indivíduos dentro dessa população”, diz.

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência determina que casos suspeitos ou de confirmação de violência contra PCDs devem ser notificados de forma compulsória pelos serviços de saúde público e privado à autoridade policial, ao Ministério Público e aos Conselhos dos Direitos de Pessoa com Deficiência.

As estatísticas mais alarmantes de violência notificada estão ligadas às pessoas com deficiência intelectual. Os dados revelam que a taxa de violência contra esse grupo é de 36,9 por cada 10 mil indivíduos com deficiência, enquanto para aqueles com deficiência física é de 12 para cada 10 mil e para os com deficiência auditiva é de 3,8 (para cada 10 mil) e para os com deficiência visual é de 1,5 (para cada 10 mil).

Em relação ao tipo de deficiência, o transtorno mental é que o tem o maior número de vítimas, com 3.662 notificações, seguidas por pessoas com deficiências múltiplas (1.425) e física (1.403).

Violência física

A violência mais relatada, conforme o levantamento, foi a violência física (55,3% dos registros). Em seguida, está a violência psicológica, com 31,7% do total de notificações, seguida pela violência sexual, com 23%. Em relação à idade, as pessoas entre 10 a 19 anos são as maiores vítimas, com 21,3% do percentual de registros, depois vem a faixa etária de 20 a 29 anos (15,8%); 30 a 39 anos (14,7%), 40 e 49 anos (13,9%), 0 a 9 anos (7,9%) e acima de 80 anos (4,4%).

Os homens tiveram maior número de registros (34,6%) apenas nas notificações de abandono e negligência dos responsáveis.

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