Parlamentares pressionam por votação na Câmara sobre redução dos poderes de ministros do STF
Deputados cogitam paralisar votações caso Lira não acelere proposta de emenda à Constituição sobre o tema
Brasília|Bruna Lima e Plínio Aguiar, do R7, em Brasília
Parlamentares garantem que o movimento em busca da redução dos poderes de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) volta depois do recesso parlamentar, que termina em 1º de fevereiro. A proposta de emenda à Constituição (PEC) 8/2021, que limita decisões individuais dos ministros do Supremo, está pendente de despacho do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para começar a tramitar. Uma obstrução, ou seja, paralisação das votações, está no radar caso não seja dada rapidez à discussão na Casa.
Deputados e senadores que integraram, em setembro de 2023, o "blocão" no Congresso para impedir votações como forma de protesto a decisões do STF afirmam que haverá uma obstrução ainda mais longa em 2024 se não avançarem projetos visando retomar o protagonismo do Congresso perante ao Judiciário.
"Caso isso não avance, com certeza haverá uma obstrução que será maior, com mais intensidade, do que a que fizemos no ano passado. Tanto na Câmara quanto no Senado", afirmou ao R7 o líder da oposição na Câmara, deputado Carlos Jordy (PL-RJ).
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O "blocão" foi formado por deputados e senadores do PL, do Novo e de pelo menos 22 frentes parlamentares. Na época, houve acordo entre o grupo, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Lira pela desobstrução. Depois disso, a PEC que diminui o poder de os ministros do STF decidirem individualmente foi aprovada pelos senadores.
A própria oposição segurou a discussão da proposta na Câmara em 2023. Isso porque o texto precisará passar pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) que, no período, era comandada pelo PT. "Nós, fatalmente, seríamos atropelados e a proposição seria rejeitada. Melhor então esse ano", afirmou Jordy.
Para o líder, o apelo ganha ainda mais força com o intercâmbio de figuras importantes entre o Judiciário e o Executivo — referindo-se à confirmação do ministro aposentado do STF Ricardo Lewandowski para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública e de Flávio Dino ocupando uma vaga no Supremo a partir de 22 de fevereiro.
O deputado Rodrigo Valadares (União-SE) afirma que "o atual governo governa o Brasil mais do lado do Judiciário do que do Legislativo". "Os Poderes constituídos no Brasil precisam entender o seu papel e respeitá-los diante da Constituição. Toda vez que o PT ameaça perder uma votação na Câmara, os Deputados vão à tribuna ameaçar entrar com ações no Supremo — o que é uma conduta que apequena o Parlamento. O presidente Lira precisa, urgentemente, pautar a PEC 8 para começarmos a trilhar um ambiente com mais segurança jurídica, previsibilidade e respeito ao ordenamento jurídico nacional."
Além da PEC sobre as decisões monocráticas, o grupo também tem como pauta estabelecer mandato fixo aos ministros e garantir a elevação da idade mínima para indicação ao STF. Retomar a discussão de temas que estão sendo conduzidos pela Corte, como crime de aborto, descriminalização de drogas e marco temporal para demarcação de terras indígenas também é prioridade.
"É fato que a PEC [da decisão monocrática] não resolve os problemas de maneira definitiva, mas consegue apontar um caminho para podermos reequilibrar a balança. O Legislativo não pode ficar à mercê de qualquer outro Poder como observamos nos últimos tempos", disse o deputado Sargento Gonçalves (PL-RN).
Na avaliação do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, não há uma crise da Corte com o Congresso Nacional, mas a necessidade de relações e diálogo. "O que existe é a necessidade de relações institucionais pautadas pela boa-fé. Não tenho nenhuma dúvida de que ocorrerá", disse já no primeiro dia como presidente do STF.
Entenda o impasse
Em novembro do ano passado, o Senado aprovou em dois turnos a proposta de emenda à Constituição que limita poderes individuais dos integrantes do STF. A matéria impede que decisões tomadas por um único ministro da Corte, chamadas de decisões monocráticas, suspendam a vigência de leis ou atos do presidente da República, do Senado e da Câmara.
Pela matéria, as decisões monocráticas serão permitidas apenas em situações de urgência ou risco de dano irreparável durante o recesso do Judiciário. Mesmo assim, a Corte deverá julgar o caso em até 30 dias após a retomada dos trabalhos, sob pena de perda da eficácia. Atualmente, a maioria dos ministros adota a prática de, após deferir a decisão monocrática, enviar para julgamento coletivo.
O presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defende o debate e alega que a medida é legítima, além de ser papel do Poder Legislativo alterar regras processuais para contribuir "para A evolução do próprio país, dando mais celeridade e legitimidade às decisões" da Corte. O parlamentar afirmou também que a proposta seja discutida "à luz do dia, sem pressa, sem atropelos, sem objetivar retaliações de qualquer natureza".
A PEC faz parte de um conjunto de proposições cuja tramitação ganhou força em razão de um conflito de competências entre Judiciário e Legislativo. Alguns congressistas julgam que os ministros têm atuado para invalidar leis aprovadas pelo Congresso.
Marco temporal
Para esses parlamentares, o caso mais citado é o marco temporal das terras indígenas, no qual o Congresso e o STF tomaram caminhos diferentes. O Legislativo aprovou uma lei que prevê só poderem ser demarcadas reservas em terras já ocupadas na data de promulgação da Constituição vigente — 5 de outubro de 1988. A Corte, por outro lado, rejeitou a tese por 9 votos a 2.
Segundo a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), há 736 terras registradas no país em vários estágios de demarcação. Essas áreas somam pelo menos 13,75% do território brasileiro e estão localizadas em todas as cinco regiões do país (Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste e Sul). Dessas, 477 já chegaram ao processo final — a regularização. Outras 259, entretanto, aguardam a finalização.
Outros temas
A alegação de ativismo judicial também está presente no debate da descriminalização do porte de maconha, tema que pode ser julgado pelos ministros do STF neste primeiro semestre de 2024. Os magistrados analisam, por exemplo, a quantidade do produto por pessoa para a conduta ser diferenciada do tráfico de drogas. Na contramão, o Senado encabeça uma PEC que prevê considerar crime o porte e a posse de substância ilícita em qualquer quantidade.
A proposta parlamentar diverge do entendimento parcial do STF. O placar da ação está em 5 a 1 pela descriminalização, mas o julgamento foi suspenso após pedido de vista, ou seja, mais tempo para analisar o tema. A sinalização do Supremo, na visão do Pacheco, é "algo que o Senado, por sua maioria, é contra". O senador argumenta que ser crime o porte e posse de droga ilícita em qualquer quantidade é uma definição constitucional e política.
Outro tema de embate entre Legislativo e STF é a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gravidez, medida defendida por alguns ministros. A Corte suspendeu a análise virtual de uma ação sobre o assunto para levá-la à discussão presencial.
No Senado, a oposição oficializou um pedido de plebiscito sobre a descriminalização ou não do aborto. "Esse é o assunto que não pode simplesmente ser resolvido por 11 juízes, com toda a legitimidade que porventura tenham. É um assunto que, necessariamente, precisa ser discutido neste Parlamento e referendado pela população brasileira através de uma consulta popular, e é o que nós estamos propondo", declarou o líder da oposição no Senado, Rogerio Marinho (PL-RN).