Polícia Federal investiga suposta vacinação de Bolsonaro em São Paulo
Ex-presidente teria tomado a vacina na capital paulista em julho de 2021, mas estava em Brasília no dia
Brasília|Ana Isabel Mansur, do R7, em Brasília
A operação da Polícia Federal sobre falsificações em certificados de vacinação contra a Covid-19 considera que Jair Bolsonaro (PL) teria se vacinado em três ocasiões — uma em São Paulo (SP), em 2021, e duas em Duque de Caxias (RJ), em 2022.
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De acordo com a PF, quatro certificados de vacinação foram emitidos com o nome do ex-presidente no ConecteSUS, plataforma que integra dados dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS). Os três primeiros documentos foram gerados antes de Bolsonaro ir para os Estados Unidos, em 30 de dezembro de 2022 — em 22, 27 e 30 de dezembro de 2022. O último é de 14 de março de 2023, 16 dias antes de o ex-presidente retornar ao Brasil.
Há, ainda, inconsistência nos locais onde Bolsonaro teria se vacinado. Em 19 de julho de 2021, quando supostamente foi imunizado com a dose da Janssen, ele estava em Brasília, não na capital paulista. Uma reportagem do R7 feita no dia mostra que o ex-presidente conversou com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada.
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A investigação aponta que Bolsonaro não estava em Duque de Caxias em um dos dois dias indicados como de recebimento de uma dose da vacina da Pfizer (veja nas imagens abaixo).
Os cartões, contudo, têm dados diferentes, conforme destacou a PF. Os primeiros dois registros, emitidos em 22 e 27 de dezembro de 2022, apontam que Bolsonaro foi imunizado contra a Covid-19 três vezes. A primeira vez em 19 de julho de 2021, com a vacina da Janssen, de aplicação única. Um ano depois, em 13 de agosto de 2022, ele recebeu a primeira dose da Pfizer; em 14 de outubro de 2022, foi vacinado com a segunda dose da Pfizer.
Por meio do sistema do Ministério da Saúde, o R7 comprovou os locais de aplicação das vacinas em Bolsonaro, com o código do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES). A dose da Janssen teria sido administrada no bairro de Parque Peruche, na Zona Norte da capital paulista. O ex-presidente teria recebido os imunizantes da Pfizer no centro de Duque de Caxias (RJ).
Os dois últimos certificados — gerados por Bolsonaro em 30 de dezembro de 2022, dia em que saiu do Brasil, e em 14 de março de 2023, cerca de duas semanas antes de retornar ao país — mostram apenas a dose da Janssen. Os documentos mantêm o dia e o local de aplicação: 19 de julho de 2021, em São Paulo (confira nas imagens abaixo).
Segundo a PF, a exclusão dos dados foi feita por uma servidora da prefeitura do município fluminense. "[...] Os registros das vacinas [...] foram excluídos do sistema do Ministério da Saúde, às 20h59 de 27/12/2022 [...], sob a justificativa de 'erro', conduta praticada possivelmente para dificultar a identificação do proveito do crime de inserção dos dados falsos no sistemas, qual seja, a emissão do certificado de vacinação contra a Covid19, contendo três doses, em nome de Jair Messias Bolsonaro, tornando consolidada a vantagem adquirida", destaca o texto da corporação.
Entenda a Operação Venire
A Polícia Federal cumpriu nessa quarta-feira (3) 16 mandados de busca e apreensão e seis mandados de prisão preventiva na Operação Venire, que investiga a inserção de dados falsos de vacinação contra a Covid-19 no sistema ConecteSUS, do Ministério da Saúde. Entre os beneficiados estariam Bolsonaro e a filha dele, Laura Bolsonaro.
Os policiais cumpriram mandados de busca e apreensão inclusive na casa de Jair Bolsonaro e de Michelle Bolsonaro. O celular do ex-presidente foi apreendido.
Foram presos os ex-ajudantes de ordens de Bolsonaro Mauro Cid e Luis Marcos dos Reis; Max Guilherme de Moura e Sergio Cordeiro, seguranças do ex-presidente; Ailton Moraes Barros, candidato a deputado estadual pelo PL no Rio de Janeiro em 2022; e João Carlos de Souza Brecha, secretário da Prefeitura de Duque de Caxias (RJ).
De acordo com a Polícia Federal, as inserções falsas foram feitas entre novembro de 2021 e dezembro de 2022. O crime teria sido praticado para burlar restrições sanitárias e viajar para países como os Estados Unidos, que exigiam vacinação à época para entrar no país. As informações foram excluídas posteriormente.
"A apuração indica que o objetivo do grupo seria manter coeso o elemento identitário em relação a suas pautas ideológicas, no caso, sustentar o discurso voltado aos ataques à vacinação contra a Covid-19", afirma a corporação.
Os envolvidos são investigados por crimes de infração de medida sanitária preventiva, associação criminosa, inserção de dados falsos em sistemas de informação e corrupção de menores. As ações ocorrem dentro do inquérito policial que investiga as chamadas “milícias digitais”, supostas organizações de difusão de informações falsas na internet com objetivo de influenciar resultados eleitorais e atentar contra a democracia.
O nome da operação deriva do princípio jurídico “venire contra factum proprium”, que significa “ninguém pode comportar-se contra seus próprios atos”. De acordo com nota da Polícia Federal, “é um princípio base do direito civil e do direito internacional, que veda comportamentos contraditórios de uma pessoa”.
O ex-presidente afirmou que não existe adulteração por parte dele no documento de vacinação e reafirmou não ter tomado o imunizante por "decisão pessoal". "Fico surpreso com a busca e apreensão com esse motivo", completou.