‘Criminosa e inaceitável’, diz Sou da Paz sobre abordagem que culminou na morte de homem no SE
Genivaldo de Jesus, que tinha esquizofrenia havia 20 anos, morreu asfixiado depois de abordagem da PRF e deixa esposa e um filho
Cidades|Do R7
O Instituto Sou da Paz qualificou como criminosa e inaceitável a abordagem da PRF (Polícia Rodoviária Federal) que culminou na morte de um homem em Umbaúba, em Sergipe.
Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, tinha esquizofrenia havia 20 anos e estava afastado do trabalho. Durante a ação da PRF, como mostra um vídeo registrado por testemunhas, o homem foi colocado à força no porta-malas de uma viatura pelos agentes.
Nas imagens, uma fumaça branca não identificada sai do veículo e, instantes depois de gritos de Genivaldo serem ouvidos, ele fica desacordado. Genivaldo morreu asfixiado e deixa esposa e um filho.
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Em nota divulgada nesta quinta-feira (26), o Sou da Paz afirma que as cenas registradas durante a abordagem configuram tortura, e o instituto cita a anuência de toda a equipe presente na operação policial.
“Segundo laudo do IML, o motivo da morte foi asfixia mecânica e insuficiência respiratória, causas diretamente relacionadas à atuação dos três policiais rodoviários que aparecem na imagem”, aponta o Sou da Paz, que também faz críticas à postura da PRF sergipana perante o caso.
Em posicionamento divulgado acerca do caso, a corporação havia afirmado que as técnicas utilizadas são de imobilização, que os materiais não possuíam potencial ofensivo e que abriu um procedimento para averiguar a conduta dos policiais envolvidos, agora afastados das funções, bem como as razões da morte de Genivaldo.
“Não há espaço em nenhuma sociedade moderna, e muito menos em uma democracia, para execuções e torturas cometidas por agentes que deveriam preservar e salvar vidas. A responsabilização dos policiais envolvidos neste caso de tortura que resultou em homicídio é apenas a primeira medida a ser tomada”, escreve o instituto.
O órgão, que possui atuação voltada para políticas públicas de segurança e prevenção da violência, demanda que o treinamento das forças policiais seja modificado, bem como a supervisão externa e interna das atividades seja ampliada, a fim de garantir que as fiscalizações não evoluam para casos de morte.
“Em um cenário de graves violações cometidas cotidianamente por agentes das polícias estaduais durante o policiamento ostensivo em áreas socialmente mais vulneráveis, a conduta da PRF neste caso é efeito e alerta para os descaminhos que o país vem trilhando no campo da segurança pública nos últimos anos”, conclui a nota.
Especialistas condenam abordagem
A abordagem realizada em Sergipe foi condenada por especialistas em direito, que classificaram de repugnante a ação dos policiais.
Guilherme Rodrigues da Silva, residente da Comissão de Direito Criminal, Política Criminal e Penitenciária da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB, disse que a PRF falhou também na “vergonhosa nota oficial” divulgada sobre o caso.
“Quem autorizou a nota certamente não viu o vídeo e, sobretudo, as reações dos agentes de segurança, a condição da vítima e do público a algo mais do que evidente: o sofrimento e a morte. Perdeu a PRF – talvez uma das polícias mais respeitadas do país – a oportunidade de dizer o óbvio, que a ação foi lamentável e digna de apuração imediata das responsabilidades administrativas e criminais, limpando a sujeira deixada por alguns de seus agentes”, ponderou Rodrigues da Silva.
O advogado ainda afirma que o que se observou após a contenção de Genivaldo foram cenas de crime de tortura com o resultado morte, cuja pena pode ser de oito a 16 anos de prisão.
“Genivaldo foi bombardeado em ambiente fechado, mínimo até mesmo para a estrutura de um corpo humano, com gás. O ambiente confinado tornou-se uma verdadeira câmara de gás, nos mesmos moldes do conceito nazista de produção industrial de óbitos. Foi submetido a intenso sofrimento, verdadeira tortura a céu aberto, perante transeuntes”, prossegue o advogado.
Belisário dos Santos Júnior, ex-secretário de Justiça do estado de São Paulo, membro da Comissão Internacional de Juristas e da Comissão Arns, também pondera que o que se viu em Umbaúba se configura como crime de tortura. “É inafiançável”, destaca.
“Absurdo se alguma dessas consequências (condenação, perda do cargo e prisão) não ocorrer em relação a policiais rodoviários federais que, devendo cuidar da proteção da vida, desprezam um ser humano dessa forma. A participação da PRF em sucessivas operações policiais recentes com resultado morte é grave sintoma de que a tropa pode estar enferma”, termina Santos Júnior, ao pedir apuração rigorosa da ação e prisão imediata dos envolvidos.