As possíveis rotas de fuga para afegãos após a retirada dos EUA
Caso o Talibã não cumpra a promessa de liberar a saída de afegãos e estrangeiros, alternativa seriam rotas por terra
Internacional|Fábio Fleury, do R7
Nesta terça-feira (31), tem início uma nova era no Afeganistão. Após a saída definitiva das tropas e civis norte-americanos e de outros países, encerrada com a decolagem dos últimos voos, o país deverá ser governado pelo Talibã. No entanto, muitos afegãos e possivelmente alguns estrangeiros prosseguem no território, sem ter tido acesso a um dos aviões de transporte.
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Os talibãs afirmam que haverá possibilidade para muitas dessas pessoas saírem futuramente. A comunidade internacional, no entanto, ainda não tem certeza de até que ponto será possível confiar nas palavras do grupo, que governou o Afeganistão com mão de ferro de 1996 até 2001, quando foi tirado do poder pela invasão recém-encerrada dos EUA.
Os líderes sabem que o Talibã precisa de legitimidade internacional para manter abertos canais de cooperação e investimentos estrangeiros. Daí vêm as promessas de que os direitos das mulheres serão mais respeitados, que não haverá retaliação contra a população que colaborou com a ocupação norte-americana e que quem tiver condições, poderá deixar o país.
Agora, no entanto, chegou o momento de ver se essas palavras serão transformadas em ações. Para Áureo Toledo, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), que estuda o Talibã e o Afeganistão há mais de uma década, é um momento decisivo para o grupo extremista. Se ele cumprir o que prometeu, pode haver muito mais legitimidade.
"É uma aposta. Da mesma forma que não se sabe se dá para confiar que eles vão respeitar os direitos das mulheres e das minorias étnicas, também tem essa questão, se vão deixar quem tem a documentação sair. Acho que se eles não cumprirem pode gerar custos altos e desnecessários para a reputação deles, eles precisam de recursos para se manter no poder", explica ele.
De acordo com o especialista, a atuação de entidades estrangeiras como a ONU e ONGs que trabalham no país pode ser importante, desde que elas tenham capacidade, recursos e o espaço necessário para agir no território afegão além, claro, de uma liberação do Talibã.
Rotas de fuga
Com relação a possíveis rotas de fuga, para o caso do aeroporto de Cabul não ser um ponto de saída válido para as pessoas que desejam deixar o país, é necessário levar em conta a geografia do Afeganistão, de acordo com Toledo. O país da Ásia Central não tem litoral. Faz fronteira ao oeste com o Irã, ao norte com Uzbequistão, Tajiquistão e Turcomenistão e tem uma imensa divisa com o Paquistão ao sul e leste.
"As fronteiras do Afeganistão são muito extensas. Na época do primeiro governo talibã, era muito comum a rota de fuga pelo Irã, o governo iraniano inclusive já demonstrou preocupação em receber um fluxo de refugiados. Também havia uma rota para o norte, mas ali o Talibã já controlou tudo e os governos do Uzbequistão, Tajiquistão e Turcomenistão estão negociando acordos com eles", ressalta o professor.
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Uma fuga pelo Paquistão, ao sul, também tem seus riscos, indica ele. Por um lado, o Talibã se refugiou nessa região durante os anos da guerra contra os EUA e seus aliados. Por outro, é uma região imensa e difícil de vigiar, por onde se desenvolvem transportes ilícitos de outra natureza.
"Tem uma rota ilegal famosa pela região do Baluquistão (a maior província do Paquistão, que fica no oeste do país e tem uma grande divisa com o Afeganistão), por onde passa a maior parte do tráfico de drogas da região", comenta Toledo. É por esse caminho que passa a maior parte da produção de papoulas do Afeganistão, usadas na produção de ópio, heroína e outras drogas.