Eleições ucranianas marcam queda de braço entre Rússia e Ocidente
Retrato político mudou drasticamente em cinco anos. Se antes russos eram vistos como aliados, agora Putin é inimigo de maioria dos candidatos
Internacional|Da EFE
O resultado das eleições presidenciais da Ucrânia não só definirá quem governará o país durante os próximos cinco anos, mas também as possibilidades de uma entrada na Otan e na União Europeia (UE) e como serão as relações entre a Rússia e Ocidente.
Se há cinco anos a Ucrânia estava dividida em duas partes - uma europeísta e outra pró-russa -, a primeira agora é majoritária, como se viu na campanha eleitoral, na qual o presidente da Rússia, Vladimir Putin, é o principal inimigo de quase todos os candidatos.
O Kremlin perdeu a Ucrânia como parceira há cinco anos, mas não saiu de mãos vazias, já que recuperou a península da Crimeia e amarrou Kiev desde então, tanto política como economicamente, com o seu apoio aos separatistas pró-russos.
Enquanto isso, o Ocidente tem em Kiev um fiel aliado e não deixou de condenar as supostas violações russas do direito internacional, mas no plano prático não foi além de declarações de boas intenções, e o presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, nunca chegou a receber o armamento letal prometido.
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Durante a campanha eleitoral, as diplomacias ocidentais apoiaram claramente o atual presidente, já que é o candidato que garante a defesa de seus interesses, que consistem em conter o ímpeto da Rússia no mar Negro.
Considerado "o homem da guerra" pela propaganda russa, Poroshenko cumpre seu papel: negou-se categoricamente a dialogar com Putin, a quem acusou abertamente de dirigir uma máquina de guerra que se propõe, a qualquer momento, a invadir a Ucrânia.
Se havia alguma dúvida, a Otan e a UE concordaram em impor duas semanas antes do pleito uma nova rodada de sanções ao Kremlin pelo incidente naval de novembro do ano passado perto da Crimeia.
A captura de três navios da marinha ucraniana pela Guarda Costeira russa perto da península da Crimeia voltou a pôr sobre a mesa, de maneira muito conveniente para Poroshenko e o Ocidente, a ameaça que Moscou representa para seus vizinhos, desde o Cáucaso até a Ucrânia e os Bálticos.
O incidente obrigou Poroshenko a decretar estado de exceção e a mobilizar tropas nas regiões de fronteira com a Rússia e as banhadas pelos mares Negro e de Azov, o que lhe permitiu subir nas pesquisas de opinião antes do começo da campanha eleitoral.
Os Estados Unidos também não perderam a oportunidade de enviar um destróier da Sexta Frota ao porto ucraniano de Odessa, embora isso tenha limitado o reforço da presença da Otan no mar Negro, já que o acesso ao mar de Azov através do estreito de Kerch está proibido.
Tudo isso voltou a lembrar aos eleitores esquecidos que o país está em estado de guerra e que na hora de votar é preciso levar em conta quem dispõe de aliados poderosos em caso de uma agressão do vizinho do norte.
Em troca, Poroshenko incluiu em seu programa de governo a promessa de que a Ucrânia solicitará em 2023 a entrada na UE e na Otan. Pouco importa que ambos os objetivos sejam utópicos, algo do qual tanto em Bruxelas como em Kiev são conscientes.
Viver como os europeus é um chamariz muito atrativo para a maioria dos ucranianos, inclusive para os que vivem no leste do país, mas não há garantias de que, em um hipotético referendo sobre a Otan, o "sim" saia vitorioso.
A Rússia sabe muito bem. Um conflito no leste da Ucrânia é a garantia de que Kiev nunca fará parte da aliança militar.
Enquanto isso, a propaganda russa faz todo o possível para descredenciar todos os candidatos, com a exceção do pró-Rússia Yuri Boiko, ex-ministro no governo de Victor Yanukovich e o único que defende um diálogo franco com Moscou.
Putin, que no início estendeu a mão a Poroshenko para normalizar as relações, lhe deu as costas nos últimos tempos e o acusou diretamente de ser a favor de o conflito se eternizar no leste do país para ganhar votos.
Por isso, Poroshenko acusou desde o início do ano o Kremlin de ingerência na campanha eleitoral e proibiu por lei a entrada no país de observadores russos.
Seja como for, o Kremlin não tem muito a ganhar no pleito, já que os três candidatos com chances de passar para o segundo turno utilizam palavras de ordem anti-Rússia para ganhar votos e defendem a entrada o mais rápido possível nas instituições europeias.