Entenda as formas legais de destituir Trump do poder nos EUA
Presidente norte-americano só deixa o cargo em caso de renúncia, impeachment ou pela 25ª Emenda
Internacional|Giovanna Orlando, do R7
Desde novembro, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, havia deixado claro que não reconheceria a derrota ao candidato democrata Joe Biden e não entregaria o poder tranquilamente.
De lá para cá, o presidente tentou tudo o que podia: recontagem de votos em estados chave, 60 ações na Justiça para invalidar votos e para atrasar o reconhecimento da vitória de Biden, pressionou a Suprema Corte, o Colégio Eleitoral, o secretário republicanos na Geórgia e até o vice-presidente, Mike Pence.
Se antes a pressão e as ameaças de Trump pareciam apenas um grito no vácuo, a invasão ao Capitólio na quarta-feira (6) mudou esse cenário. A recusa do presidente de reconhecer a derrota e as inúmeras alegações de que as eleições tinham sido fraudadas incitaram milhares de apoiadores do presidente a invadir o prédio do Congresso em uma tentativa extrema de impedir que Biden fosse certificado como novo presidente dos Estados Unidos.
Nos últimos dias, democratas e políticos norte-americanos analisam estratégias legais para que Donald Trump deixe o poder em duas semanas. Um processo de impeachment pode estar em curso e a 25ª emenda, que deve ser solicitada pelo vice-presidente e o gabinete de Trump, chegou a ser cogitada.
Mesmo parecendo pouco tempo, duas semanas podem mudar radicalmente a democracia nos Estados Unidos. Por um lado, políticos podem conseguir garantir o afastamento definitivo de Trump do poder, e por outro, Trump pode usar o poder de forma autoritária, analisa a professora de Relações Internacionais da ESPM, Denilde Holzhacker.
“Há uma pressão muito forte entre os democratas e alguns republicanos sobre essas incitações do Trump, é preciso que as instituições dêem alguma resposta, mostrar que não se aceita que se abale a democracia do país”, diz Holzhacker.
“O presidente cometeu um atentado aos princípios democráticos. Ele fez um juramento para defender as instituições, o povo e a democracia.”
Nos Estados Unidos, existem três formas de tirar um presidente do poder: através do processo de impeachment, pela 25ª emenda ou uma renúncia. A última opção não está sendo cogitada, nesse caso.
Possível novo impeachment de Trump
Em 2018, a Câmara dos EUA deu início a um processo de impeachment de Trump por abuso e obstrução de poder, depois que Trump condicionou uma ajuda à Ucrânia caso o país investigasse Joe Biden, na época possível candidato à presidência dos EUA.
O processo ficou travado no Senado, que tinha maioria republicana, e Trump foi absolvido. Agora, em 2020, este cenário muda, já que na quarta-feira (6), o Partido Democrata conquistou a maioria no Senado.
O novo processo de impeachment já está em andamento, com a coleta de assinaturas acontecendo e podendo ser iniciado em breve. Caso o processo prossiga, ele pode garantir a inelegibilidade de Trump para as próximas eleições. O ainda presidente já afirmou que pretende concorrer à presidência em 2024.
“A estratégia do impeachment seria melhor, porque inviabiliza a candidatura de Trump. O uso da 25ª emenda não dá esse poder”, explica a professora.
A 25ª emenda
Até então desconhecida do grande público, a 25ª emenda se tornou centro de discussão nos últimos dias, já que é a forma mais rápida de destituir o presidente. Com a emenda, o vice-presidente e a maioria do gabinete do então presidente alegam que o líder não tem mais condições de continuar o mandato, e então, o vice assume.
O problema, porém, é que “Mike Pence já sinalizou que não tem intenção de fazer isso”, disse a professora.
Até agora, Pence deu apoio às alegações de Trump sobre a fraude das eleições, mas mantém uma postura mais neutra que outros republicanos aliados ao presidente. Na quarta-feira (6), Trump havia pressionado publicamente o vice para não seguir a Constituição e não certificar a vitória de Biden. O vice não acatou à pressão.
Mais estratégico que Trump, Pence analisa os próximos passos para não afetar a carreira e seus interesses, além de desestruturar ainda mais o Partido Republicano
“Também tem a dificuldade de conseguir o apoio do gabinete inteiro do presidente. Muitos dos secretários são leais ao Trump”, conclui a especialista.
Leia também
Como vota o partido republicano?
Mesmo tendo a maioria, os democratas podem precisar dos republicanos para aprovar o impeachment. Enquanto as alas mais conservadoras e moderadas do partido haviam sinalizado que queriam a destituição de Trump, ainda não dá para afirmar como o partido vai se comportar, diz a especialista.
Na noite de quinta-feira (7), Trump fez um discurso em que afirmou que vai trabalhar para uma transição pacífica de poder. Como em todos os discursos, ele manteve uma retórica agressiva e negacionista, mas se comprometeu a ajudar.
“Agora, vai depender de qual foi a percepção e a reação ao discurso de ontem, se ele, de fato, não vai abusar dos seus limites constitucionais”, analisa a professora.
Trump e seu autoperdão
Na noite de quinta-feira (7), também foi publicado que Donald Trump estava discutindo se é possível que ele se dê o perdão presidencial. Ainda não se sabe como isso funcionaria, já que seria um feito inédito na história dos Estados Unidos, mas o perdão presidencial tem uma série de especificidades a serem levadas em conta.
“Ele é a última instância na Justiça, só acontece depois que a pessoa foi julgada, condenada e cumpriu parte da sentença, além de só funcionar para alguns crimes”, explica a professora da ESPM.
Não se sabe, também, se o perdão funcionaria apenas nas duas últimas semanas do mandato do republicano ou se ele perdoaria todos os processos no qual Trump é réu e foram paralisados enquanto ele era presidente.
“Trump estaria se colocando acima da lei. Não existe nenhum precedente de um presidente americano de se auto perdoar. Isso é característica de líder autoritário”, conclui a especialista.