Entenda por que Reino Unido e Alemanha têm acusado a Rússia de ameaçar seus satélites
Países apontam interferências de russos em seus dispositivos; França e EUA já haviam feito outras acusações anteriormente
Internacional|De Lauren Kent, da CNN Internacional
LEIA AQUI O RESUMO DA NOTÍCIA
Produzido pela Ri7a - a Inteligência Artificial do R7

Alemanha e Reino Unido alertaram sobre a crescente ameaça representada por satélites espaciais russos e chineses, que têm sido regularmente vistos espionando satélites usados por potências ocidentais.
Os países destacaram, nas últimas semanas, casos frequentes de perseguição, interferência e bloqueio de seus satélites no espaço por parte da Rússia.
“As ações da Rússia, especialmente no espaço, representam uma ameaça fundamental para todos nós. Uma ameaça que não podemos mais ignorar”, disse o ministro da Defesa alemão, Boris Pistorius, em uma conferência em Berlim de líderes da indústria espacial em setembro.
O direcionamento a satélites de comunicação pode impactar em aspectos como imagens de satélite, telecomunicações e acesso à internet via os dispositivos. A interrupção de sistemas de navegação e posicionamento pode afetar operações militares, bem como a aviação civil, segundo a corporação americana RAND.
Os alertas surgem na esteira da invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia, agora em seu terceiro ano. Autoridades ucranianas dizem que Moscou aumentou seu nível de cooperação com a China, com Pequim realizando reconhecimento por satélite do território ucraniano em seu nome.
Veja o que autoridades e especialistas dizem sobre as ameaças de satélites no espaço.
O que a Rússia tem feito?
Pistorius observou que dois satélites de reconhecimento russos foram recentemente vistos rastreando dois satélites da IntelSat, que são usados pelas Forças Armadas alemãs e seus aliados. A IntelSat é uma fornecedora de serviços comerciais de satélite cuja frota é utilizada por governos e empresas nos EUA e na Europa.
“Rússia e China expandiram rapidamente suas capacidades de guerra espacial nos últimos anos: eles podem bloquear, cegar, manipular ou destruir satélites de forma cinética”, acrescentou Pistorius, anunciando um aumento de bilhões de euros no financiamento para programas espaciais alemães.
O chefe do Comando Espacial do Reino Unido também soou o alarme, dizendo que satélites russos estão perseguindo ativos britânicos no espaço, além de bloqueá-los de forma “semanal”.
“Eles têm cargas úteis a bordo que podem ver nossos satélites e estão tentando coletar informações deles”, disse o Major-General Paul Tedman à BBC no mês passado. O bloqueio é realizado usando infraestrutura terrestre. A Rússia passou anos desenvolvendo capacidades de guerra eletrônica em meio à guerra na Ucrânia.
Separadamente, o secretário-geral da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), Mark Rutte, voltou a alertar, neste ano, sobre os planos da Rússia de desenvolver armas nucleares no espaço para desativar e destruir satélites.
O presidente russo, Vladimir Putin, declarou publicamente que Moscou não tem intenção de implantar armas nucleares no espaço. Mas a Rússia também vetou uma resolução do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) que pedia aos Estados-membros que não desenvolvessem armas nucleares espaciais em 2024. A China se absteve de votar.
Como funciona a “espionagem” por satélite e como ela é detectada?
Em geral, é relativamente simples para as forças espaciais detectarem e localizarem satélites estrangeiros, mas é difícil determinar suas capacidades exatas e intenções.
As autoridades fazem suposições sobre a intenção dos satélites russos com base em onde o satélite está no espaço, o que está próximo e padrões históricos do que satélites semelhantes fizeram, segundo o especialista Clayton Swope, vice-diretor do Projeto de Segurança Aeroespacial do (CSIS) Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, em português) em Washington, DC.
Por exemplo, se um satélite russo permanece por um longo período próximo a um satélite europeu de comunicações, as autoridades podem inferir que ele está lá para espionar.
Especialistas acreditam que os satélites russos que se aproximaram dos dois satélites da IntelSat usados em parte pela Alemanha estavam lá para interceptar sinais.
Enquanto isso, em órbitas mais baixas, satélites russos já testaram “coisas que parecem armas e dispararam projéteis”, disse Swope à CNN. As autoridades podem identificar satélites que se parecem com aqueles equipados com projéteis para determinar se representam uma ameaça física aos ativos de outros países.
“Os russos têm um histórico de ter esse tipo de satélite seguindo outros satélites de uma forma que as pessoas podem pensar que é uma célula adormecida, esperando para atacar a qualquer momento”, disse Swope.
“É muito difícil distinguir entre uma ameaça no sentido de uma arma e uma ameaça no sentido de coleta de inteligência”, acrescentou. “Às vezes, você realmente está apenas fazendo suposições sobre quais são as capacidades de um satélite, bem como as intenções do operador.”
A agência espacial russa já minimizou anteriormente o perigo de seus testes de armas no espaço.
Há quanto tempo existe a ameaça da Rússia?
Alemanha e Reino Unido são apenas os países mais recentes a soar o alarme. Estados Unidos e França alertaram pela primeira vez há mais de uma década que satélites russos pareciam estar espionando e coletando informações sobre seus ativos, incluindo satélites operados comercialmente.
O Departamento de Defesa dos EUA disse, em 2015, que um satélite militar russo havia se posicionado próximo a dois satélites da Intelsat, levando os EUA a contatar Moscou sobre seus movimentos, que muitos na época descreveram como “misteriosos”.
Depois, em 2017, após França e Itália lançarem conjuntamente um satélite de inteligência, satélites russos logo se aproximaram para observá-lo, segundo Juliana Suess, pesquisadora de políticas de segurança no SWP (Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança, em tradução).
“Então, esses tipos de comportamentos não são totalmente novos, mas acho que também precisam ser vistos no contexto da Ucrânia, e no contexto das violações do espaço aéreo que vemos a Rússia cometendo em relação ao espaço aéreo da OTAN”, disse Suess à CNN sobre os relatos recentes de espionagem e interferência por satélite. “Todas essas coisas devem ser vistas em um contexto mais amplo.”
A China também representa uma ameaça?

A China é tão ameaçadora quanto a Rússia, senão mais, disseram especialistas à CNN.
Embora as ameaças da Rússia sejam mais urgentes para a Europa devido à proximidade, “a potência espacial muito maior é obviamente a China”, disse Suess. Analistas observaram algumas manobras sofisticadas da China no espaço com o objetivo de se aproximar de outros satélites, “em velocidades incrivelmente altas e com uma precisão que, acredito, realmente chamou a atenção no Ocidente”.
Algumas das capacidades da China geraram preocupações internacionais, segundo a analista do SWP. Por exemplo, a China testou um satélite com um braço robótico que pode deslocar outros satélites para uma órbita diferente.
A China também tem “muito mais dinheiro para atuar no espaço”, disse Suess. “Não veremos muito mais crescimento espacial vindo da Rússia no momento. Seus recursos estão muito sobrecarregados para isso.”
As atividades de Pequim no espaço são muito intensas e seus objetivos são mais opacos, segundo Swope, o analista do CSIS.
“Nem sempre sabemos o que eles estão fazendo, e eles estão fazendo muitas coisas diferentes que deixam muita gente coçando a cabeça”, acrescentou Swope.
A resposta europeia é adequada?
A Alemanha afirmou que vai destinar até 35 bilhões de euros (cerca R$ 216 bilhões, na conversão atual) nos próximos cinco anos para projetos espaciais.
“É um número grande, com certeza. Acho que também reflete uma espécie de vontade política de agora correr atrás e, sabe, realmente fazer as coisas acontecerem”, disse Suess. Mas ela também enfatizou que a corrida espacial é um processo contínuo, sem linha de chegada à vista. “A Europa como um todo tem muito a recuperar. A Alemanha certamente tem muito a recuperar.”
Um porta-voz do Ministério da Defesa da Alemanha disse à CNN que suas medidas de aquisição relacionadas ao espaço somarão cerca de €1,9 bilhão (aproximadamente R$ 11,7 bilhões, atualmente) em 2025, “mas crescerão significativamente nos próximos anos.”
O governo do Reino Unido também anunciou um compromisso de aumentar os gastos com defesa neste ano, e uma revisão estratégica das capacidades britânicas destacou que “deve-se dar maior atenção aos domínios espacial, cibernético e eletromagnético.” O Reino Unido anunciou, em outubro, que está testando sensores para detectar ameaças de laser no espaço como parte das medidas para proteger os satélites britânicos.
Mas uma análise do órgão Chatham House, com sede em Londres, argumentou que é necessário um investimento ainda maior no curto prazo, e que a revisão estratégica falhou em reconhecer a urgência real das ameaças no espaço, colocando o país em risco de ficar para trás.
Enquanto isso, a França tem “sido muito vocal sobre a necessidade de ter o que eles chamam de ‘satélites guarda-costas’, ou seja, satélites cuja função é proteger outros satélites”, disse Swope. Como esses satélites serão ainda é uma questão em aberto, acrescentou, com o desenvolvimento em andamento.
Os EUA ainda têm uma vantagem histórica no espaço após investir muito mais nos últimos anos, disseram analistas. Mas os aliados europeus podem se beneficiar disso por meio da cooperação no âmbito da Organização do Tratado do Atlântico Norte e outras alianças.
Leia mais
A OTAN declarou, em 2019, que o espaço é um “domínio operacional” para a aliança transatlântica e, anos depois, anunciou que o Artigo 5 se aplicaria ao espaço. O Artigo 5 é o princípio de que um ataque a um membro da OTAN é considerado um ataque a todos os membros. Analistas da RAND argumentaram, no entanto, que a OTAN precisa “acelerar” sua atuação no espaço ou corre o risco de ficar aquém em um momento crítico.
Embora ficar para trás seja uma preocupação real, particularmente em comparação com os avanços da China, também há evidências de que a Rússia não integrou seus sistemas de satélite à sua infraestrutura militar tão bem quanto muitas outras potências espaciais.
Suess citou como exemplo um caça russo abatido na Ucrânia que foi encontrado com um sistema de navegação russo embutido, mas também com um GPS comercial colado no painel. Analistas também observaram evidências de que a Rússia está adquirindo imagens de satélite comerciais no mercado privado — uma indicação de que suas próprias capacidades não estão a altura.
“Vimos, por evidências anedóticas na Ucrânia, que a Rússia não tem o nível de confiança que normalmente se esperaria em seus próprios sistemas”, acrescentou Suess.
Fique por dentro das principais notícias do dia no Brasil e no mundo. Siga o canal do R7, o portal de notícias da Record, no WhatsApp
