Nobel da Paz foi 'politicamente acertado', diz professor
Em um ano marcado pela pandemia do novo coronavírus, OMS e líderes engajados no combate à doença eram favoritos pelo prêmio
Internacional|Giovanna Orlando, do R7
Na manhã desta sexta-feira (9), foi anunciado que o Programa de Alimentos da ONU, que combate a fome em regiões fragilizadas, era o grande vencedor do Prêmio Nobel da Paz.
A escolha surpreendeu um pouco, já que 2020 foi marcado pela pandemia do novo coronavírus, e organizações e líderes que se dedicaram a combater o vírus eram as grande apostas para o prêmio, como a Organização Mundial da Saúde e a primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Arden, que decretou a quarentena mais rígida do mundo e foi o primeiro país a erradicar a doença por mais de 100 dias.
Apesar do choque inicial, a escolha do prêmio para o programa de combate à fome foi “politicamente acertada”, segundo o professor de relações internacionais da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) de Porto Alegre Gabriel Adam.
“Qualquer programa da ONU pode ganhar. Se era para premiar alguma organização, a OMS seria a mais indicada, mas eu entendo que, em algum momento, essa foi uma escolha política”, diz.
“Caso a OMS ganhasse, isso poderia levar a um boicote ainda maior dos Estados Unidos aos programas da ONU”.
O presidente norte-americano, Donald Trump, foi indicado para o prêmio depois do acordo histórico entre países do Oriente Médio e é um grande crítico da OMS, que diz ter sido “comprada” pela China, país que ele responsabiliza pela pandemia do novo coronavírus.
No primeiro semestre do ano, Trump suspendeu as doações à OMS, mas segue colaborando e doando para outros programas da ONU.
Prêmio pode trazer ajuda financeira
Com a vitória do programa de combate à fome, é esperado que mais países doem e ajudem financeiramente a iniciativa, que em 2016 teve sérios problemas financeiros e precisou suspender a produção de parte das refeições, porque não tinha verba, explica o professor.
“Esse programa é cada vez mais relevante, porque desde 2011 nós estamos tendo um grande fluxo migratório no mundo, com guerras civis e conflitos. Isso faz com que o programa tenha cada vez mais pessoas para alimentar”, diz.
Na África, no Oriente Médio e parte da Ásia, os conflitos armados e guerras civis fazem com que milhões de pessoas precisem se deslocar para sobreviver.
Com países fragilizados pela guerra, a economia paralisa, e governos não conseguem dar assistência à população, que acaba dependendo de programas humanitários para se alimentar.
Com uma escolha neutra como vencedor neste ano, as críticas ao Nobel da Paz poderão ser mínimas.
“Não tem como criticar um programa que salva a vida de milhões de pessoas por dia”, analisa o professor.
Um prêmio disputado por líderes mundiais
A lista de nomeados para o Nobel da Paz não é divulgada publicamente. Neste ano, mais de 300 candidatos concorriam ao prêmio, incluindo Trump, o presidente russo Vladimir Putin e Jacinda Arden.
Enquanto o critério para escolher uma organização vencedora são mais claros, como “programas que evitem conflitos, acabem com um ou lidem com os efeitos de uma guerra”, como o programa contra a fome da ONU, a avaliação de líderes é um pouco mais vaga, explica o professor.
Os indicados podem ter encerrado conflitos regionais; terem assinado importantes tratados de paz, como no caso do vencedor de 2019, o premiê etíope Abiy Ahmed Ali, que atuou na resolução do conflito com a Eritreia; ou terem estabelecido importantes alianças políticas, que leve o líder a ser reconhecido mundialmente.
Em anos anteriores, o ex-presidente Barack Obama venceu o prêmio, logo no primeiro ano de mandato, o que rendeu críticas.
Outro caso polêmico foi o caso de Aung San Suu Kyi, líder de Mianmar e ativista política que levou o prêmio em 1991, e hoje permite que exista um genocídio contra a população rohingya do país, e se tornou alvo de pedidos para que o Nobel da Paz fosse revogado.
Com isso, o comitê acaba sendo um pouco mais cuidadoso com quais mandatários podem levar o prêmio e as chances de líderes levando o Nobel da Paz acaba sendo mais tímida.