SP: mais de metade das refugiadas está fora do mercado de trabalho
Entre a população total de refugiados no estado, índice dos que se encontram sem ocupação chega a 38%. Maioria recorre a empregos informais
Internacional|Ana Luísa Vieira, do R7
Mais da metade das mulheres refugiadas no estado de São Paulo encontra-se sem ocupação no mercado de trabalho ou conta com empregos informais. O dado é do Atlas de Migração do Estado de São Paulo, do Núcleo de Estudos de População da Unicamp (Universidade de Campinas).
Entre as refugiadas, o índice desocupação gira em torno de 55%. Já entre a população total de refugiados no estado, o número chega a 38%, segundo Rosana Baeninger, uma das autoras do estudo.
"Chegamos a esse número com base nos refugiados que obtiveram seu RNE (Registro Nacional de Estrangeiro) na Polícia Federal em São Paulo. No que diz respeito às mulheres refugiadas no mercado de trabalho, existem questões de gênero que precisam ser superadas. Para as empresas, muitas vezes, não é simplesmente oferecer um emprego: a mulher tem um conjunto de atribuições a serem consideradas — família, filhos, etc. É a desigualdade de gênero que acontece na migração refugiada assim como em outros setores da sociedade", pondera a pesquisadora.
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O Conare (Comitê Nacional para os Refugiados) aponta que, dos 5.134 refugiados com registro ativo no Brasil atualmente, 52% (aproximadamente 2.269) moram em São Paulo. Outro obstáculo para que essa população se insira formalmente no mercado de trabalho, segundo Rosana, é o grau de escolaridade. Para a maioria dos refugiados, é difícil revalidar diplomas e comprovar o grau de instrução, o que dificulta a procura por empregos nas mesmas funções exercidas nos seus países de origem.
"Alguém que ocupava um cargo específico em outro país pode se tornar, no Brasil, assistente de alguma coisa. Um contabilista, por exemplo, pode ser registrado aqui como auxiliar de escritório, porque o nível de escolaridade dele não é compatível com a classificação da ocupação no Brasil”, explica.
Fora da área
A moçambicana Lara Lopes, 34, mora no Brasil há cinco anos, mas só conseguiu seu primeiro trabalho depois de um ano procurando. Ainda assim, o emprego não era em sua área de formação.
"Sou formada em tecnologia da informação e fui trabalhar como camareira. Àquela época, eu só tinha o número do protocolo com a solicitação de refúgio, não o status de refugiada, e era um problema muito grande para ser aceita em empresas", conta Lara.
"Depois que consegui, ainda sofri muito preconceito. Tinha sempre que justificar aos colegas porque eu larguei tudo, porque escolhi o Brasil. E uma hóspede chegou a dizer que não queria ter uma negra refugiada limpando seu quarto", relembra.
Atualmente, Lara trabalha como gestora de recursos humanos em uma organização que busca garantir oportunidades de trabalho para refugiados.
"A questão do trabalho é difícil porque existe uma ignorância em relação ao estado de refúgio. Demora até que você explique e o empregador compreenda e processe sua situação", conclui.
Problema generalizado
Fora do estado de São Paulo, a situação não é muito diferente. Surirma Piamo, 50, chegou da Venezuela em fevereiro de 2017 e até hoje não conseguiu emprego fixo.
O filho, de 31 anos, já trabalha como caseiro em uma fazenda no Brasil, enquanto a filha, de 29, é dona de casa.
Surirma mora em Boa Vista, no estado de Roraima, e faz serviços como diarista para sobreviver — mesmo que já conte com o status de refugiada e possua, inclusive, uma carteira de trabalho brasileira.
"Na Venezuela, eu tenho mais de 20 anos de experiência na área de recursos humanos. Aqui no Brasil, já enviei meu currículo para ser auxiliar em loja, atendente de farmácia, muitas coisas. Às vezes eu mando uma mensagem perguntando sobre a vaga e as pessoas simplesmente respondem que não querem venezuelanos. E eu sei que essa é a situação de muitos refugiados no Brasil", diz.
Já em Volta Redonda, no Rio de Janeiro, Yesibel Aladejo, 23, envia currículos para desempenhar funções diversas em lojas, restaurantes e até meios de comunicação desde que chegou ao Brasil, há três meses.
"Sou comunicadora social formada e falo inglês fluentemente. Só que não tenho status de refugiada, apenas visto de trabalho do Mercosul, com validade de dois anos. Por enquanto, acabei de receber uma resposta de uma rede de lanchonetes fast-food e devo começar a trabalhar no próximo 1º de julho. Mas espero conseguir algo na minha área em uns seis meses, assim que melhorar meu portugês. Em Caracas, a situação está muito ruim. Minha família precisa de muita ajuda."