Ação de Brumadinho terá tradução alemã com o objetivo de notificar réu ainda não citado pela Justiça
Após cinco anos da tragédia, ninguém foi julgado e ex-presidente da Vale pode ser retirado do processo criminal
Minas Gerais|Ezequiel Fagundes , da Record TV Minas
O rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, completa cinco anos, nesta quinta-feira (25), sem nenhum réu julgado. O processo criminal tramita na Justiça e não há previsão de data para julgamento final.
Dos 16 réus, pelo menos um ainda não foi citado. É o alemão Chris-Peter Meier, então gerente da Tüv Süd, consultora europeia que atestou a estabilidade da barragem antes do rompimento.
O procurador da República Bruno Nominato, do MPF (Ministério Público Federal) em Minas Gerais, revela que toda ação está sendo traduzida para o alemão com o objetivo tentar notificar o denunciado.
Meier já teve um pedido de prisão solicitado e seu nome chegou a ser incluído na lista de procurados da Interpol. Agora, a missão das autoridades brasileiras é encontrá-lo na Alemanha para prosseguir com a fase de instrução do processo e evitar futuros pedidos de nulidade.
"A citação normal é feita pelo oficial de Justiça. Ele se desloca até o endereço do acusado e tenta notificá-lo. Quando o acusado está no exterior, é necessário um procedimento que se chama carta rogatória. Ou seja, tem que se expedir um documento para a autoridade do país estrangeiro para que ela faça a diligência, dê ciência que ele é acusado para que ele possa oferecer a sua defesa. As citações no exterior têm um complicador por causa disso. Não é algo que depende da Justiça brasileira", explica o procurador.
De acordo com Nominato, não está descartada a possibilidade de desmembramento do processo criminal, se as autoridades demorarem para citar Chris-Peter Meier.
"Isso envolve uma avaliação. O ideal é que o processo corra contra todos porque já queima umaa etapa. Quando você separa o processo, vai ter que ter outra instrução relacionada ao acusado específico", detalhou.
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O cenário gera sensação de impunidade entre os familiares das vítimas. “A minha esperança é de vê-los presos. Eles sabiam o que estava acontecendo. Somos 270 famílias, somos humanos e estamos sofrendo com isso. Será que o dinheiro fala mais alto?", lamenta Tânia de Oliveira, prima da Nathália de Oliveira Porto Araújo, uma das três desaparecidas.
A reportagem tenta contato com Meier. Em nota, a Tüv Süd disse que segue "profundamente abalada pelo trágico colapso da barragem em Brumadinho".
"Nossos pensamentos permanecem com as vítimas e suas famílias. Mesmo cinco anos após o trágico colapso, as causas do rompimento da barragem ainda não foram esclarecidas de forma conclusiva. Contudo, a TÜV SÜD está segura de que não tem responsabilidade legal pelo rompimento da barragem. A responsabilidade da operadora da barragem de Brumadinho já foi estabelecida", completa o comunicado da empresa alemã.
Ex-presidente da Vale
Outro ponto que preocupa os parentes das vítimas é a possibilidade do então presidente da Vale, Fabio Schvartsman, ser retirado do processo. Ele apresentou um recurso alegando que não existe nos autos qualquer ato ou omissão que possa lhe incriminar. O pedido é analisado pela Justiça Federal em Minas Gerais. Schvartsman já tem um voto favorável. O julgamento foi suspenso e deve ser retomado em fevereiro deste ano. A reportagem procurou a defesa do ex-dirigente da mineradora e aguarda retorno.
"A forma como Schvartsman organizou a empresa permitia que esse sistema funcionasse sem cuidados. Ele montou uma estrutura em que a priorização seria o lucro da empresa em detrimento da segurança. Temos nos autos uma mensagem anônima interna de uma pessoa da empresa declarando problemas na barragem e a postura dele enquanto presidente foi de não apurar aquilo que tinha acontecido", avalia o procurador Nominato Bruno.
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Trocas
Inicialmente, o processo corria na Justiça Estadual, em Minas Gerais. O órgão chegou a tornar réus as empresas Vale, Tüv Süd e as 16 pessoas — entre elas, dirigentes e ex-dirigentes das companhias. Entretanto, um recurso de Schvartsman no STF (Supremo Tribunal Federal) fez o processo ser encaminhado para a Justiça Federal.
Após a decisão do Supremo Tribunal Federal, todos os réus do processo tiveram que ser citados novamente. Como eles respondem por homicídios qualificados, além de crimes ambientais, o caso deve ser levado a júri popular.
Após a citação, apresentação de defesa, oitivas de testemunhas e realização de diligências se inicia a fase de pronúncia, que é quando o juiz define se o réu pode ou não ser levado a júri. Para o procurador, em 2024 pode-se encerrar a fase de instrução preliminar de pronúncia.
"As pessoas devem confiar na Justiça. O Ministério Público vai trabalhar firme para que as pessoas que cometeram esse crime sejam responsabilizadas. Gostaria de dizer também para os familiares trazerem para o Ministério Público todos os fatos relacionados ao caso, porque é um processo que vai demorar. O julgamento da chacina de Unaí, que foi conduzido pelo Ministério Público Federal, foi um processo bem demorado, mas no final a Justiça acabou prevalecendo", completou.
Por meio de nota, a Vale declarou que segue comprometida com a reparação de Brumadinho, "priorizando as pessoas, as comunidades impactadas e o meio ambiente".
A empresa afirmou que desde 2019, mais de 15,4 mil pessoas fecharam acordos de indenização. A companhia eliminou 13 barragens a montante, com a conclusão de mais de 40% no Programa de Descaracterização e tem apoiado projetos para a diversificação da economia na região impactada.
A mineradora disse ainda que dentro do Acordo Judicial de Reparação Integral (AJRI), a Vale executou, até o momento, 68% dos R$37,7 bilhões previstos.
"A Vale reafirma seu respeito às famílias impactadas pelo rompimento da barragem e segue comprometida com a reparação dos danos, o que vem avançando de forma consistente e nas bases pactuadas no acordo judicial de reparação integral e em outros compromissos firmados para indenização individual, todos com participação de instituições de justiça", ressalta.
"Com relação ao julgamento criminal, após decisão e determinação do Supremo Tribunal Federal, a denúncia foi recebida pelo órgão judicial competente em janeiro de 2023, e o processo segue seu curso regular. A Vale reforça que, desde o início das investigações, sempre colaborou com as autoridades e continuará colaborando", completou em nota.