Terreno de pousada levada por lama em Brumadinho vai virar memorial
Órfão dos donos da hospedagem destino de celebridades pretende transformar área em pomar com espaço de meditação aberto à comunidade
Minas Gerais|Pablo Nascimento, do R7
Parte do terreno onde ficava a Pousada Nova Estância, levada pela lama de rejeitos da barragem da Vale, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, vai se tornar um memorial em homenagem às vítimas da tragédia que completa um ano neste sábado (25).
No local serão plantadas 272 árvores para representar cada um dos mortos e desaparecidos. Dados oficiais contabilizam 270 vítimas, contudo, dois arbustos serão colocados a mais em memória aos dois bebês que estavam em gestação no dia do rompimento.
O projeto foi pensado por Paulo Mascarenhas, filho do casal de donos da hospedagem, que também foram levados pela onda de minério. O empresário preferiu não gravar entrevista, mas detalhou a proposta para o R7. Além do pai e da mãe, Paulo perdeu um irmão que também estava no local.
A ideia é que o pomar seja um espaço aberto à comunidade, onde as pessoas possam caminhar, fazer atividades ao ar livre e meditar. Segundo informações dos herdeiros da família Mascarenhas, o projeto ainda não tem data para ser concluído, mas deve começar ser executado nos próximos meses.
Enquanto isso, os sobreviventes da equipe que trabalhava na Nova Estância e os familiares das vítimas vão se reunir no terreno neste sábado para homenagear as 17 pessoas que morreram na hospedaria às 12h28 do dia 25 de janeiro de 2019.
Mortos na pousada
José Antônio Soares, ex-supervisor da estalagem, está ajudando a preparar o ato que vai acontecer no terreno da própria pousada. Cruzes representando cada um dos 17 serão colocadas no espaço. O homem explica que o objetivo não é provocar um protesto de revolta, mas ter um momento de respeito e carinho em relação aos entes que se foram.
— A revolta está dentro de cada um de nós. A manifestação vai ser silenciosa.
Soares, além de trabalhar, morava com a família em uma casa que ficava na mesma propriedade. A filha dele, Lays Gabrielle, então com 14 anos, estava no imóvel e morreu afogada na lama.
O supervisor hoje mora em um hotel com a mulher, Alessandra de Souza, e a cunhada Talita Cristina Oliveira de Souza, de 16 anos. A adolescente foi a última ferida a deixar o hospital após seis meses internada. O resgate dela foi feito de helicóptero e registrado com exclusividade pela Record TV Minas.
— Espaço para mim hoje não é problema porque quando você perde tudo aprende a viver com limitações.
Entre os soterrados pela lama também estavam Adriano da Silva, de 61 anos, os filhos dele, Camila e Luiz Taliberti, de 33 e 31 anos, a mulher dele, Maria Lurdes Bueno, 58, e a mulher de Luiz, Fernanda Damian, 30, então grávida de 5 meses.
A família morava em São Paulo, mas estava de Férias em Brumadinho. O grupo optou por se hospedar na pousada destino de celebridades como Caetano Veloso e outros famosos que iam visitar o Instituto Inhotim - um dos maiores museus a céu aberto do mundo.
A estabelecimento ficava a 20 minutos do museu. A página do grupo na internet o apresentava como um local "criado para ser um refúgio do dia-a-dia e proporcionar uma experiência cultural e gastronômica". A estalagem já havia sido reconhecida com ao menos dois prêmios do setor hoteleiro.
As demais vítimas são mais seis funcionários do hotel e outros dois familiares de empregados.
Mantendo distância
Apesar do ato que acontece no próximo sábado representar um momento de homenagem, nem todos os atingidos pela tragédia vão participar por não se sentirem preparados.
Uma dessas pessoas é a coordenadora de restaurantes Paloma Prates da Cunha, de 23 anos, viúva do auxiliar da pousada Robson Máximo Gonçalves, também engolido pelo rejeito. A jovem preferiu marcar uma viagem para a época em que o estouro completa um ano e estará com uma prima em Porto Seguro, litoral baiano.
Além do marido, Paloma perdeu o filho Heitor Prates Máximo da Cunha, de 1 ano e seis meses, e a irmã mais nova, Pâmela Prates da Cunha, de 13 anos. A família também vivia em uma casa dentro da pousada. Paloma é a mulher que aparece em um vídeo sendo resgatada com a ajuda de uma corda, debaixo de uma ponte e com o corpo tomado por lama.
— Hoje eu não consigo passar na estrada que dá acesso á [comunidade] de Córrego do Feijão que me lembro de tudo.
Um anos após o colapso, a jovem está afastada do emprego, toma medicamentos para dormir, além de antidepressivos, e mora em uma casa alugada pela Vale. Em conversa com o R7, a sobrevivente desabafou que não sabe o que vai fazer do futuro, mas a única coisa que pensa é construí-lo em uma área rural longe de Brumadinho.
— Brumadinho não faz bem pra gente. Qualquer lugar fora dessa cidade é melhor. Penso em me mudar assim que receber a indenização.
Relembre como era a pousada Nova Estância: