As notícias falsas que atrapalham o combate à Covid-19
Um ano depois de iniciada a vacinação, a indústria das fake news não desiste de lutar contra a realidade da queda nos números de casos e mortes
MonitoR7|Do R7
Estamos prestes a completar um ano do início da vacinação em massa contra a Covid-19 em todo o mundo. Com países já tendo vacinado quase toda sua população, registrando forte queda nos números de casos e mortes e, com isso, retomando boa parte dos hábitos anteriores à pandemia. Mesmo assim, um mesmo inimigo acompanha as vacinas desde antes delas serem aprovadas pelos principais órgãos de saúde do mundo: a indústria de notícias falsas.
É possível encontrar de tudo em redes sociais e mensagens compartilhadas por aplicativos. De imagens de microscópio forjadas de "seres" ou microchips presentes nas vacinas, alegação de monitoramento por redes 5G, imagens de pessoas caídas nas ruas depois de serem vacinadas a dados manipulados para indicar mortes provocadas pelas vacinas.
O Monitor7 selecionou três das notícias falsas mais usadas na campanha de desinformação sobre as vacinas contra Covid-19 e ouviu um dos principais especialistas brasileiros no assunto. O pediatra Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, nos ajuda a avaliar cada uma dessas "notícias" que, muito provavelmente, você já viu compartilhada por aí.
Óxido de grafeno entre os ingredientes da vacina?
Em grupos de Telegram, inúmeras publicações afirmam que entre os componentes da vacina está o óxido de grafeno, o que tornaria a pessoa vacinada uma espécie de condutor magnético.
Para ‘comprovar’ o boato, pessoas passaram a publicar vídeos com moedas no braço, dizendo que um efeito colateral da vacina seria se tornar magnético.
Em consulta no site da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), é possível ver a bula de todas as vacinas aprovadas no Brasil para o combate à Covid-19 (Pfizer, CoronaVac, Astrazeneca e Janssen). Nenhuma delas contém a substância. E o mesmo ocorre com as demais vacinas contra Covid-19 usada em outros países.
“Não há nenhum tipo de ímã ou magnetismo que possa se colocar dentro de um produto. Não há essa plausibilidade biológica. O que você tem ali que as moedas grudam é porque o braço está úmido após passar álcool, qualquer umedecida que você der, gruda. Não há possibilidade de vacinas, remédios nem injeções deixarem a pessoa imantada de alguma maneira”, explica Renato Kfouri.
Vacinas contém proteína ‘fatal’ que prejudica o corpo humano?
A proteína Spike é tema de grande parte das informações falsas produzidas nas redes sociais. Segundo várias postagens, pessoas vacinadas produzem no seu corpo a proteína S (Spike), que entraria na circulação, causando coágulos sanguíneos, problemas cardíacos e infertilidade.
Muitos grupos anti-vacinas recomendam ainda manter distância de pessoas vacinadas, pois supostamente eles transmitiriam a proteína através do ar e de contato físico.
A proteína Spike existe e é parte do próprio coronavírus. Na imagem do Sars-Cov-2 que ficou conhecida, aquelas pontas que formam a "coroa" que dá nome ao vírus são formadas de proteína Spike. É através dela que o vírus entra nas nossas células, provocando a contaminação.
Por ter esse papel importante no processo, a proteína Spike foi um dos primeiros alvos de pesquisa, na tentativa de se chegar a uma vacina contra o coronavírus. Se fosse possível impedir que a proteína Spike fizesse esse conexão do vírus com o nosso organismo, seria evitada a contaminação.
As vacinas que usam a tecnologia de RNA mensageiro, como as Pfizer e da Moderna, contém traços dessa proteína Spike sintetizada, para que o corpo da pessoa vacinada conheça as caraterísticas da proteína e aprenda a combatê-la, evitando a contaminação.
O doutor Renato Kfouri cita as vacinas contra o sarampo e a meningite, que também usam componentes dos respectivos vírus para produzir defesa, para mostrar a segurança dessa tecnologia:
“A vacina é feita para apresentar ao nosso sistema imunológico a proteína S, sem causar doença e trazendo a resposta imune. Esse é o racional de qualquer vacina. Uma infecção natural ao Covid-19 nos expõe a ‘trilhões’ de vezes mais proteínas S do que aqueles pouquíssimos microgramas de proteína (do imunizante)”, esclarece o médico.
Porque pessoas com esquema vacinal completo morreram de Covid-19? Isso prova que a vacina não funciona?
Em grupos de mensagens, internautas usam casos de personalidades que foram infectadas pelo coronavírus e morreram, mesmo depois de tomar as duas doses da vacina. Essa seria a comprovação de ineficácia da vacinação.
Nenhuma vacina tem 100% de eficácia. Então, é inevitável que surjam casos de pessoas que contraiam a doença, tenham casos graves de Covid-19 e até morram em razão da contaminação. Mas, passado um ano do início da vacinação no mundo, não temos apenas estimativas. Temos dados reais que demonstram que os números de contaminações, casos graves e mortes são bem menores entre os vacinados que entre os não-vacinados.
No dia 12 de abril deste ano, quando o Brasil estava com a mais alta média de óbitos por Covid-19, com 3.124 mortes diárias, apenas 3,5% da população estava com o esquema vacinal completo. Passados oito meses, com 63% da população totalmente vacinada e grupos de risco já recebendo a terceira dose, foram registradas 200 mortes no último dia 2 e esse número vem ficando abaixo de 300 há mais de um mês.
“Hoje, a maioria dos hospitalizados com Covid-19 grave não estão com o esquema completo de vacinação”, aponta Renato Kfouri. O vice-presidente da SBIm explica que a avaliação dos resultados das vacinas deve ser sobre os “99% dos casos” que deram resultado, de pessoas que não adoeceram e não sobre o 1% da falha vacinal.
Mesmo se desconsiderarmos as estatísticas sobre mortes, a comparação dos efeitos da vacinação contra Covid-19 para a saúde dos brasileiros tem outros dados importantes, que mostram a falta de justificativa para o medo das vacinas.
Dados do Ministério da Saúde indicam que o risco de ser internado com SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) ao não ser vacinado é 257 vezes maior do que o de sofrer uma reação adversa após receber a vacina.
Segundo boletim epidemiológico do MS, foram notificados 5,1 eventos adversos para cada 100 mil doses de vacina aplicadas. Percentualmente, isso significa 0,005%. E boa parte dos efeitos adversos relatados é de uma leve dor no braço.