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O bom diálogo entre o maior general de Israel e fundadores do Hamas

Moshe Dayan buscava compreendê-los, segundo historiador, ao mesmo tempo em que sempre defendeu as fronteiras israelenses

Nosso Mundo|Eugenio Goussinsky, do R7

Dayan aperta a mão do jordaniano Abdullah el-Tell por um cessar-fogo em 1948
Dayan aperta a mão do jordaniano Abdullah el-Tell por um cessar-fogo em 1948 Dayan aperta a mão do jordaniano Abdullah el-Tell por um cessar-fogo em 1948

Até 1993, a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) era considerada por Israel uma entidade terrorista. Comandada por Yasser Arafat, a organização se negava a reconhecer Israel, orquestrando, de suas bases no Líbano, Síria e Jordânia, atentados no território israelense.

Era o retrato de um extremismo que acabava tendo mais visibilidade do que vários outros períodos de convivência entre populações árabes e judaicas, em Israel, antes da Independência de 1948.

A situação é complexa, mas é fato que muitos judeus já habitavam a região havia séculos. As ondas imigratórias, urgentes em função da brutal perseguição que os judeus sofriam na Europa, intensificaram a presença da comunidade na região, que nos anos 20 estava sob o mandato britânico.

É verdade que a convivência era permanentemente arranhada por grupos e comunidades que se revoltavam com a presença judaica, que geraram as famosas revoltas de 1929 e 1936. E culminaram com a negação árabe em relação à Partilha da Palestina, gerando a sangrenta Guerra de Independência de Israel.

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Mas, neste período, assim como agora, a coexistência era algo presente. Um terceiro conflito, em 1933, foi evitado por causa disso, segundo conta o escritor Leon Uris, em seu livro Exodus.

"Em 1933, os líderes árabes conclamaram uma greve geral de protesto contra a nova imigração judaica. Tentaram provocar novos distúrbios, mas ambas as coisas fracassaram. A maioria dos árabes continuava a transacionar com os judeus; dependiam economicamente uns dos outros."

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As manifestações em cidades israelenses neste momento se assemelham a esses conflitos antigos. A diferença é que, com um Estado estruturado, as comunidades judaicas não estão mais vulneráveis como eram os kibutzim e aldeias judaicas dos anos 20, 30 e 40, sempre alvos de ataques dos chamados fedayin (guerrilheiros).

O general Moshe Dayan (1915-1981), considerado o maior militar da história moderna de Israel, atuando, entre outras funções, como Chefe do Estado-Maior (1953-1958) e Ministro da Defesa (1967-1974), valorizava a importância de se conhecer bem os dois lados em um conflito.

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Nos anos 40, Dayan foi preso, quando seu comboio foi flagrado levando armas, o que era proibido pelo exército britânico. Alguns foram torturados, mas Dayan, com argúcia, conseguiu se manter na liderança dos prisioneiros.

Na prisão, em Acre, ele fez amizade com membros que fundaram o Hamas, adeptos do xeque Izz-a-Din Kassam, também em uma época em que eles negavam a presença de judeus em Israel.

Quem conta o episódio é o escritor Martin van Creveld, na biografia Moshe Dayan, de sua autoria.

"Ao contrário dos outros integrantes da Hagana (que viria a ser o exército israelense), que os chamavam de 'escória da Terra', Dayan não odiava nem desprezava essa gente, mas sim tentava compreendê-los e procurava estabelecer um bom relacionamento com eles. Em uma das cartas (escritas para a sua mulher), ele descreveu como havia celebrado com eles a festa muçulmana do Id el Fitr; entupindo-se de toda comida que conseguiram comer e conversando interminavelmente sobre política. Atraía-o particularmente um grupo conhecido como os kassamitas, ou barbudos. Eles eram seguidores do xeque Izz-a-Din Kassam, um professor árabe que virara terrorista e fora assassinado pelos britânicos, alguns anos antes; muito tempo depois, ele se tornaria o padroeiro do grupo terrorista islâmico, o atual Hamas", contou Creveld.

O historiador completa a afirmação, contando que o rigor da prisão de Acre, mantida pelos britânicos, era desumano, tanto com árabes quanto com judeus. Dayan, segundo ele, compreendia isso.

"Dayan, que os observava (árabes, entre eles os kassamitas), notou o quanto aqueles que estavam no corredor da morte encaravam estoicamente o seu destino; o que era difícil superar eram os gritos e o pranto de suas famílias. Nem todos os árabes eram condenados à morte, e em 1942 Dayan chegou a ir ao casamento da irmã de um homem que havia sido libertado."

Na Guerra da Independência, Dayan negociou um cessar-fogo com Abdullah el Tell, comandante militar jordaniano de Jerusalém Oriental e se encontrou, em 1949, com o rei Abdullah da Jordânia (avô do atual rei Abdullah) para iniciar um acordo de paz, que acabou se concretizando em 1994.

Nos anos 1990, a tática hostil de Arafat em relação a Israel se modificou. Assim como Shimon Peres e Yitzhak Rabin, então ministro das Relações Exteriores e primeiro-ministro de Israel, ele autorizou uma longa negociação nos bastidores, que culminou com um acordo e paz, reconhecendo a existência de Israel e abrindo caminho, com autonomia nos territórios ocupados por palestinos, para um Estado Palestino.

A iniciativa não teve continuidade, mas foi uma mostra de que judeus e palestinos poderiam sentar na mesa de negociações. E o que era impensável aconteceu. Arafat apertou as mãos de Rabin e Peres, no famoso acordo de 1993.

Anos antes, Dayan, que foi um dos idealizadores de Israel e sempre protegeu os interesses do país, mostrou que essa possibilidade de diálogo com o Hamas, que, até a trégua da última quinta-feira (21), lançou por 11 dias mísseis em Israel, com retaliações israelenses, também não é impossível.

Isto em uma época em que Israel estava muito mais desprotegida e os conflitos, quando interrompiam períodos de convivência, eram ainda mais virulentos. Neste momento, há um ponto em comum entre ambos.

Israel e Hamas reconhecem a OLP. E a Fatah, um dos partidos da OLP, é a base da atual Autoridade Palestina, presidida por Mahmoud Abbas. A Fatah reconhece a existência de Israel. Um caminho inicial, assim, se apresenta. O pragmático Moshe Dayan, pelo menos, seguiu sempre essa linha de raciocínio. Era a tática do maior de todos os generais israelenses.

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