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Será que o nazismo acabou mesmo na Europa depois da 2ª Guerra?

Ataques recentes contra a população judaica  demonstram que o antissemitismo continua presente, de novo em momento de crise econômica

Nosso Mundo|Eugenio Goussinsky, do R7

Alemães usam quipá em solidariedade a judeus
Alemães usam quipá em solidariedade a judeus

O nazismo nunca morreu na Alemanha. Nem na Europa. Ele estava adormecido, enquanto o som das bombas, as imagens do campos de concentração e a sensação de vergonha dos alemães, diante do mundo, ainda se mantinham fortes nas mentes de muitos cidadãos locais.

E no momento em que dificuldades econômicas novamente se apresentam, somadas à xenofobia contra refugiados da Ásia e da África, a ira insana novamente desperta no continente.

Por outro lado, encontra uma resistência muito maior, que a faz recuar. Mas ela continua rosnando, não mais silenciosa, diante do "antiantissemitismo", que também tem crescido nesses momentos.

Quais as origens do mal? Sem levantar teses acadêmicas, porque nem cabem nesse espaço, o recrudescimento das perseguições é decorrente dos acontecimentos no continente em um passado recente: surgimento da União Europeia (o que acirrou nacionalismos), aperto financeiros dos países e ondas imigratórias.


Já se sabia que essa corrente continuava a existir, mas agora, com partidos organizados, grupos armados e líderes com eleitorado, ela se insinua, e tenta prevalecer.

Alemães vão às ruas vestindo quipá em protesto contra antissemitismo


Tudo isso, após a Europa passar várias décadas por um processo de inclusão social, miscigenação e afirmação da população. Esses processos inclusivos acenderam a resistência da tradicional "Europa branca e nacionalista", que apenas estava acuada, calada, esperando a primeira brecha para esbravejar. 

Esse é o motivo, segundo o professor Danilo Porfírio de Castro Vieira, de Relações Internacionais do Uniceub (Centro Universitário de Brasilia), para que ataques contra judeus, ainda que em menor grau, voltassem a fazer parte da rotina no continente, com fatos que mereceram destaque na mídia internacional nas últimas semanas.


— Com o triunfo dos aliados na Segunda Guerra, obviamente os americanos tentaram implementar na Europa um modelo de Estado liberal e democrático, mas esta tentativa de implementação de uma cultura procedimental de valorização do pluralismo, da democracia e dos valores republicanos lamentavelmente não se enraizou em culturas e tradições locais que tradicionalmente sempre foram discriminatórias.

O jornal alemão Tagesspiegel, baseado em dados do governo, informou que quatro crimes antissemitas foram registrados em média por dia em 2017. A maioria — 1.377 de 1.452 — teve como autores radicais de direita. Neste mês, ainda, o prêmio Echo de música foi entregue a um duo de rappers acusado de recitar letras antissemitas.

Na França, 11 judeus foram torturados até a morte, por razões antissemitas, no ano passado. Eles também têm sido alvos de ataques na rua, ameaças, xingamentos em alguns subúrbios, como em Saint-Denis, em Paris.

Dezenas de milhares de judeus acabaram deixando o bairro por essa razão. Em março último, a idosa Mirelle Knoll, sobrevivente de campo de concentração, foi morta em sua casa em Paris. A polícia descreve o crime como um ato antissemita. Em 2016, segundo a Agência Judaica, 7,9 mil judeus franceses se mudaram para Israel, para fugir da ameaça terrorista.

Também no Reino Unido, o Conselho de Deputados Judeus Britânicos e o Conselho de Liderança Judaica criticaram duramente o líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbin, por, segundo eles, se colocar com frequência ao lado de pessoas com opiniões antissemitas. Corbin nega apoiar tais opiniões.

Reações indignadas

Todo esse clima de ameaça, porém, tem causado uma reação indignada não só dos judeus mas também de grande parte das populações destes países. Isso mostra, por outro lado, que há uma mobilização humanitária e uma conscietização muito maior do que nos tempos da Segunda Guerra, que culminaram com o Holocausto nazista e com a instauração do fascismo na Itália.

A presença de Israel como um Estado forte e estruturado, que tem como missão também a proteção dos judeus pelo mundo é outro fator que amortece esse ímpeto antissemita. Além é claro da presença dos Estados Unidos, um histórico aliado de Israel, que ajuda no trabalho de combate a este tipo de manifestação.

Essa rede de apoio tem sido eficiente. Tanto que, na "Marcha da Quipá" na quarta-feira (25), milhares de pessoas foram às ruas de Berlim e de outras cidades alemãs, utilizando quipot (plural de quipá, que significa solidéu) em protesto contra o antissemitismo e em solidariedade a judeus vítimas de agressão.

Vários vencedores anteriores do prêmio Echo também devolveram seus troféus, além de a indústria fonográfica local cancelar as próximas edições do evento. E na França, além de protestos da sociedade como um todo, 300 personalidades locais fizeram um manifesto para alertar sobre os perigos do antissemitismo. Para Castro Vieira, o trabalho da comunidade judaica e Israel colabora para tal conscientização. Mas precisa prosseguir até atingir as classes menos favorecidas.

— Concordo que hoje não é o mesmo contexto, o discurso de discriminação não atinge as classes mais esclarecidas. Mas atinge as menos, o dito homem médio, comum. Há, por outro lado, todo um aparato que combate esse discurso. Os judeus sabem muito bem usar a história para relembrar, se mobilizam na persperctiva do esclarecimento, do conhecimento, da difusão do fato. Digo em minhas aulas que eles têm o holocausto como um escudo, de defesa e de conscientização.

A retomada do antissemitismo não tem relação direta com o aumento da população islâmica na Europa. Há uma ideia distorcida de que esse aumento poderia projetar no continente as hostilidades entre os dois povos. Trata-se de algo mais enraizado no nazismo e no fascismo europeus. Casos de ataques a judeus, realizados por cidadãos árabes, têm sido a minoria, como o que ocorreu na última semana, quando um refugiado sírio palestino, na Alemanha, agrediu um judeu, que havia sido amarrado com um cinto em um poste, por três pessoas. Os muçulmanos são tão vítimas quanto os judeus, conforme frisa Castro Vieira.

— Quando começaram as ondas de dicriminação contra muçulmanos na Europa, a primeira comunidade que se solidarizou com eles foi a dos judeus, no Brasil, na Europa, nos Estados Unidos. Os partidos são nazistas europeus, não têm nada a ver com muçulmanos. Os mesmos que estão agredindo muçulmanos são aqueles que agora estão abrindo um pouco a asa e indo atrás dos judeus também.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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