Avenida Paulista vive onda de roubos e tem rotina alterada
Além de roubos de celular, região tem concentrado também ataques de dia a pessoas com joias e bolsas. Estudantes contam que se juntam para ir ao Metrô
São Paulo|Julia Girão*, do R7
Grupos de ladrões, em alguns casos formados por crianças e adolescentes, têm realizado roubos e furtos na região da avenida Paulista, o principal cartão-postal da cidade. Casos de pessoas que tiveram correntes, bolsas, colares e carteiras levados por criminosos se tornaram recorrentes, em especial nas proximidades da estação Trianon-Masp. Eles se somam aos também comuns roubos de celular por ladrões de olho em transferências por Pix.
Os relatos de ataques são constantes nas redes sociais e por quem anda pela avenida. A estudante Melissa Venturini, de 19 anos, teve seu colar arrancado do pescoço quando ia em direção à estação Trianon-Masp, após sair da aula, no período da manhã. “Eles me cercaram. Eram umas cinco crianças. Aí eu fui descendo as escadas [da estação] e, quando fiquei na altura de um deles, um dos meninos puxou a corrente”, relatou. Assustada, ela conta que agora só vai ao metrô acompanhada.
A doméstica Vanda Lopes afirma que presenciou um idoso sendo roubado na calçada da Paulista, bem ao lado do Masp (Museu de Arte de São Paulo), outro marco da cidade. "Chegou um grupo e arrancou a corrente que ele usava no pescoço. Uma covardia", conta. Outro estudante, Leonardo Kenji, também foi roubado na região. Entre os assaltantes, um adolescente o obrigou a entregar o dinheiro que tinha no bolso.
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Além de forçar a criação de grupos que andam juntos até o Metrô — o que antes parecia impensável em uma avenida tão movimentada —, a onda de violência também faz com que os frequentadores andem com medo e evenvualmente busquem refúgio contra assaltos. Foi o caso da professora Jéssica Peixoto, que contou nas redes sociais como escapou de um assalto. O vídeo viralizou, com mais de 40 mil curtidas e 5.000 compartilhamentos.
Na publicação, ela conta que foi seguida por um suspeito desde a altura da estação Trianon-Masp até uma travessa da Paulista, a rua Peixoto Gomide. Foi quando entrou em uma cantina e pediu ajuda aos garçons. O homem aguardou a saída dela por alguns minutos, do lado de fora, até desistir do crime e deixar o local.
Celulares
Os relatos corroboram números que mostram que a via se tornou um dos principais alvos de criminosos na cidade. Um estudo da Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado) apontou a avenida Paulista como o local com mais roubos de celular na capital em 2021. O levantamento, feito com base nos boletins de ocorrência registrados pela polícia, detectou 2.417 assaltos na região, o dobro do segundo local com mais casos, a praça da Luz — que fica próxima à região conhecida como Cracolândia.
A polícia de São Paulo já identificou que a facção criminosa PCC passou a atuar no roubo de celulares na região da Paulista e em outras áreas nobres da capital em razão da presença do público de classe média e alta. A aposta é que as transferências via Pix com celulares roubados podem render grande quantidade de recursos financeiros aos criminosos.
Em abril, o Setor de Inteligência da Polícia Militar prendeu dois irmãos e apreendeu um menor de idade suspeitos de atuar nos roubos. Eles estavam em um condomínio residencial da rua Major Diogo, na Bela Vista, com notebooks e outros equipamentos que seriam usados para desbloquear o acesso aos celulares e facilitar a entrada na conta bancária das vítimas.
Subnotificação e questão social
Para Erivaldo Vieira, professor de economia e coordenador do Depec (Departamento de Pesquisas em Economia do Crime) da Fecap, a razão da subnotificação é a falta de "custo-benefício" para as vítimas. “A vítima tem o custo de registrar a ocorrência, custo de tempo e custo emocional, mas não recupera seus bens”, afirma. Além disso, para o professor, não existe incentivo para as vítimas registrarem o boletim de ocorrência, e a polícia fica sem informações.
Para Ariel de Castro Alves, especialista em direitos humanos e membro do Indica (Instituto Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), a situação é um problema social, extremamente grave e complexo, que precisa ser solucionada. “Além dos riscos para as pessoas que estão sendo alvo de tentativas de furtos e roubos consumados, nós temos o risco também de linchamentos e agressões contra essas crianças e adolescentes”, explica.
De acordo com o artigo 101 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), crianças menores de 12 anos não podem ser apreendidas pela polícia, que deve se limitar a chamar os pais ou responsáveis para informar o ocorrido, mediante assinatura de termo de responsabilidade.
“O trabalho precisa ser feito nas abordagens, na educação social de rua, visando ao restabelecimento dos vínculos com a família, o retorno das crianças à escola. E também a necessidade de que as famílias estejam incluídas no auxílio. Geralmente, quando temos uma criança em situação de risco, também temos uma família em situação de risco”, afirma Ariel de Castro Alves.
Já o artigo 173 do Estatuto afirma que maiores de 12 anos serão encaminhados à presença de autoridade policial, sendo adotadas medidas cabíveis para a natureza da infração. “Se eles tiverem mais de 12 anos de idade e forem apreendidos cometendo roubo, por exemplo, podem ser encaminhados para unidades da Fundação Casa”, diz especialista.
Policiamento
Em nota, a SSP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) disse que o policiamento foi intensificado na região da avenida Paulista por meio de diversas ações, como a Operação Sufoco, focada em combater a criminalidade em áreas com maior incidência de ocorrências e pontos de desordens.
A secretaria também afirmou que, durante o mês de abril, três adolescentes, de 12, 14 e 15 anos, além de uma criança, de 11 anos, foram apreendidos depois de roubarem um celular. Os pais não foram localizados, e a polícia acionou o Conselho Tutelar, que encaminhou a criança para um abrigo em uma instituição. Os adolescentes foram levados para a Fundação Casa. O celular foi devolvido à vítima.
O Metrô, também em nota, disse que intensificou a atuação da segurança nas áreas internas e acessos à estação Trianon-Masp. E pediu aos passageiros que comuniquem qualquer caso aos funcionários do Metrô, ou pelo aplicativo Metrô Conecta e SMS (11 973332252), e registrem boletins de ocorrência para auxiliar na atuação da segurança.
*Estagiária do R7, com supervisão de Márcio Pinho