Barulho de obras tira sono de vizinhos das futuras estações do Metrô em São Paulo
Segundo moradores de Perdizes e Pompeia, geradores, sirenes, apitos, caminhões e guindastes são ouvidos 24 horas por dia
São Paulo|Do R7

Barulho de geradores, sirenes, apitos, caminhões e guindastes 24 horas por dia. É assim que moradores dos bairros de Perdizes e Pompeia, na zona oeste de São Paulo, descrevem o dia e a noite em suas residências desde 2021, com o retorno, após quatro anos, das obras de construção da Linha 6-Laranja do Metrô, que ocorrem até nas madrugadas. A entrega do novo ramal está prevista para 2025.
Os vizinhos alegam que não conseguem dormir e pedem o fim do "terceiro turno" das obras. Lucas Baccelli, de 38 anos, empresário e subsíndico de um dos prédios próximos da futura Estação PUC-Cardoso de Almeida, em Perdizes, diz ter entrado com pedido no Ministério Público para investigar crime sonoro e há ainda um abaixo-assinado com a adesão de mais de 150 moradores. A vizinhança diz não ser contra a obra, mas pede que ela seja feita só durante o dia.
"Durmo três horas por noite", diz Baccelli. Ele relata que sua saúde física e mental foi afetada. "Comecei a ter sintomas gastrointestinais e fiz vários exames, mas todos estavam ótimos. Contei ao médico que estava dormindo pouco por causa do barulho da obra e ele me disse que os problemas gastrointestinais podem advir da ansiedade que adquiri por não conseguir descansar", afirma o empresário, que também tem a rotina de trabalho prejudicada por estar em home office.
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Carla, que pediu que seu nome verdadeiro não fosse divulgado, mora próximo de Baccelli, em um prédio ao lado da obra, e decidiu se mudar do próprio apartamento, mesmo sem saber se vai conseguir alugá-lo. Ela, que tem 31 anos, relata que o estresse causado pelo barulho tem prejudicado não só a saúde dela e a do marido, como também a tentativa deles de ter um filho.
"Desenvolvi colesterol alto sem ter nenhum outro fator associado, então o médico constatou que era pelos picos de estresse. E meu marido teve muitas crises de ansiedade e também precisou entrar com medicamento." Os remédios que eles tomam, diz Carla, podem atrapalhar a fertilidade. O casal chegou a instalar janelas antirruído, que não vedaram completamente o barulho.
Ela comprou um medidor de decibéis e conta que o ruído diário costuma alcançar mais de 70 dB à noite, tendo chegado a 105 dB um dia. Na cidade de São Paulo, é proibido que obras gerem ruídos acima de 59 dB depois das 19h. A prefeitura, contudo, informou que obras públicas não têm limite de horário ou ruído.
Em Perdizes e na Pompeia, moradores relatam que vários vizinhos têm procurado se mudar, entregando ou colocando apartamentos à venda, e contam que locatários reclamam da dificuldade em alugar imóveis nos dois bairros.
Dor de cabeça
Vizinha de Carla, a dentista Aline Ferreira, de 36 anos, conta que os problemas respiratórios e alérgicos têm aumentado por causa da grande quantidade de poeira que entra em seu apartamento. Mas o que mais incomoda sua família é o barulho de conversas na madrugada, vindo da casa de apoio aos trabalhadores da obra. "Todo dia acordo com dor de cabeça. Chego ao trabalho sonolenta, não consigo ter o mesmo desempenho", diz Aline, cuja filha, de 12 anos, tem autismo e acorda diversas vezes na madrugada.
"Como a maioria dos autistas, ela tem sensibilidade auditiva. Fica mais nervosa, estressada. Tivemos de trocar o horário da escola dela do período da manhã para o da tarde, para ver se ela consegue dormir um pouco mais", acrescenta.
A situação de Flávia Angi, de 48 anos, que mora a um quarteirão da futura Estação Sesc-Pompeia, também na zona oeste, é parecida. A fisioterapeuta relata que ela e os filhos passam o dia com fones de ouvido, seja para trabalhar, seja para escutar músicas que disfarcem os ruídos externos. Mas o que mais a incomoda é a madrugada. "Fica difícil dormir. Às vezes tenho de tomar remédio indutor de sono e uso tampão, mas nem sempre resolve porque quando está calor não consigo fechar a janela", explica.
Síndica de um prédio na rua Cardoso de Almeida, Jacqueline Toledo também reclama das obras da futura Estação Sesc-Pompeia, que trazem diariamente barulho e poeira para dentro de seu apartamento. Ela conta ainda que é impossível dormir sem fechar todas as janelas, uma vez que as luzes do local ficam acesas à noite.
Concessionária
A Linha Universidade, concessionária responsável pelas obras por meio de PPP (parceria público-privada), informou que cumpre a regulamentação referente aos níveis de emissão sonora em obras civis. Disse ainda que as empresas envolvidas informam antecipadamente a possível ocorrência de ruídos no entorno, além de adotar medidas mitigadoras como a manutenção periódica dos equipamentos, a atenuação do sinal sonoro dos caminhões e guindastes e a instalação de barreira acústica.
Segundo a empresa, também há treinamento dos colaboradores sobre o comportamento adequado nas atividades noturnas. Sobre o turno da madrugada, ela não deu previsão de término, mas disse que o trabalho nesse horário é essencial para as obras da linha, que transportará mais de 630 mil pessoas por dia.
Já a Secretaria de Transportes Metropolitanos disse que, conforme o contrato, a concessionária deve seguir a lei e as boas práticas referentes a barulho em obras civis na cidade e, entre outras ações, "informar antecipadamente os moradores do entorno sobre a possibilidade de ruído próximo a canteiros e adotar medidas mitigadoras" nas atividades à noite.

