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Blocos irão às ruas de São Paulo na próxima semana mesmo sem o aval da prefeitura

Organizadores afirmam que não haverá divulgação e que festa será para comunidade, sem trio elétrico ou grandes estruturas

São Paulo|Joyce Ribeiro, do R7

Mesmo sem estrutura da Prefeitura de SP, blocos vão às ruas no feriado de Tiradentes
Mesmo sem estrutura da Prefeitura de SP, blocos vão às ruas no feriado de Tiradentes

Mesmo após a negativa da Prefeitura de São Paulo em ajudar na infraestrutura para a realização dos desfiles do Carnaval de rua, os organizadores de blocos garantem que a festa vai acontecer no feriado prolongado de Tiradentes. Mas a folia deve reunir cerca de 5% dos 800 blocos cadastrados, e não haverá divulgação dos locais e nem trio elétrico. A ideia é que a festa seja direcionada a moradores de bairros. Já a administração municipal diz buscar uma nova data para a festa de forma consensual.

"São blocos comunitários, que saem a pé, com estrutura pequena e pouco impacto para a cidade. Ninguém desistiu, vamos sair e temos "know how" de Carnaval. No passado, fazíamos sem autorização da prefeitura e nunca aconteceu nada. Vamos pagar varredores na concentração e acionar os catadores de recicláveis para diminuir o lixo", explica Marco Ribeiro, coordenador do Bloco do Fuá e do Arrastão dos Blocos.

Alessa, uma das representantes da Comissão Feminina do Carnaval de Rua de São Paulo, afirma que nada impedirá a folia. "A prefeitura acha que ela faz o Carnaval, mas quem decide é o povo, de forma espontânea. Não é uma Virada Cultural. Vai acontecer, quer eles queiram ou não. Nosso papel é alertar. Não temos o poder de adiar de novo. Há um espírito de Carnaval em abril, mas o direito está sendo privado", enfatiza.

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O desfile das escolas de samba do Grupo Especial no Sambódromo do Anhembi, na zona norte da capital, está marcado para os dias 22 e 23, depois de ter sido adiado por causa da pandemia. 


No início do mês, Abasp (Associação das Bandas Carnavalescas de São Paulo), Arrastão dos Blocos, Comissão Feminina do Carnaval de Rua, Fórum dos Blocos, Ocupa SP Carnaval de Rua e Ubcresp (União dos Blocos do Carnaval de Rua do Estado de São Paulo) divulgaram um manifesto que tornou pública a intenção dos organizadores de fazer os desfiles de rua.

No documento, intitulado Manifesta Carnaval de Rua com Diversidade e Democracia contra a Violência Policial e contra a Censura, os organizadores dizem não ver motivos para o cancelamento da festa de rua. 


"Nos dias atuais, o cenário sanitário parece promissor e estável. Festivais, campeonatos esportivos, eventos religiosos e de negócios estão acontecendo normalmente. O sambódromo já está com a festa marcada e não há justificativa para proibir Carnaval de rua livre, diverso e democrático neste abril", escreveram. 

Não queremos apanhar e que a polícia haja com truculência. Já sabemos que a prefeitura não vai dar a estrutura

(Marco Ribeiro, do Arrastão dos Blocos)

Após a divulgação do manifesto, a prefeitura se reuniu no último dia 8 com entidades do Carnaval de rua, mas não houve acordo. A administração municipal manteve a posição de que os desfiles não deveriam ocorrer e que não haveria tempo hábil para organização. Mas os organizadores dos blocos afirmam que o diálogo foi encerrado repentinamente.


"A prefeitura consegue fazer a gestão de redução de impacto para manifestações. Serão uns 30 desfiles e não 800, mas ela não quis saber quantos são. É muito frustrante. Falaram em diálogo, mas foi um desrespeito com foliões e o setor. Os blocos sabem que não vai ser aquele Carnaval, com licitação e patrocínio de cervejaria. Queremos uma solução nova porque esse abril vai ser inédito", cobra Alessa.

Um dos fundadores e coordenador do Fórum de Blocos de São Paulo, José Cury, disse acreditar que a prefeitura tenta ganhar tempo diante da pressão sofrida e cogita diferentes datas para a festa de rua.

"Se a prefeitura tem uma nova data, ela que apresente e discuta com os blocos o Carnaval fora de época, mas vamos sair entre 21 e 24 de abril. Não é uma proposta de chamamento dos blocos, mas uma declaração que a gente não sabe de onde sai a ideia, falaram junho, depois setembro. Não há boa vontade e nem diálogo", diz.

De acordo com a prefeitura, a reunião com os organizadores foi encerrada por causa da "exaltação dos ânimos e até hostilidade de alguns dirigentes das entidades que representam os blocos".

Proposta é que blocos saiam a pé, sem caminhões de som, e sejam comunitários
Proposta é que blocos saiam a pé, sem caminhões de som, e sejam comunitários

Organização

Os organizadores do Carnaval de rua estão comprometidos a viabilizar os desfiles. Não haverá trio elétrico, os carros serão de tração manual, os músicos deverão ir no chão e seguir devagar. Como não haverá divulgação dos locais de concentração e horários, são esperados menos foliões e mais moradores da região.

"Vamos instruir blocos sobre as melhores práticas. Se a prefeitura não fechar a rua, a recomendação é seguir a mão da rua, não fazer desfiles extensos, que façam trânsito ou impeçam circulação de ambulâncias e bombeiros. Mas precisamos saber quantos são os blocos para fazer a estratégia para que todos tenham segurança jurídica", ressalta José Cury. 

Marco Ribeiro lembra que adaptações nos trajetos serão necessárias para minimizar o impacto no trânsito: "Temos medo de represálias, por isso não vamos divulgar data. Antes reunia de 2.000 a 3.000 pessoas. Hoje acho que virão umas 1.000. É uma questão de diversão da comunidade, no Bixiga já estão acostumados".

Não é Carnaval para a cidade%2C é para os moradores locais%2C com bloquinhos territoriais%2C que podem sair sem represálias

(José Cury, do Fórum de Blocos)

A Abasp assinou o manifesto, mas nenhuma das 12 bandas vai desfilar. De acordo com Candinho Neto, presidente da associação e carnavalesco, a entidade apoia a manifestação cultural, mas a prefeitura não liberou os R$ 235 mil, previstos no orçamento.

"A verba está suspensa e a Abasp tem direito de saber como será o Carnaval de rua, será em setembro? O prefeito não falou claramente o que vai fazer, só sinalizou datas. Se oficializar, entramos com pedido para garantir a verba. Ela não é suficiente, mas é um incentivo. Do total, 10% vão para despesas da associação e o restante é dividido com as bandas, dá uns R$ 15 mil para cada", detalha.

Segundo Candinho, cada uma das bandas tem colaboradores, recebe diferentes doações, mas, neste ano, nem orçamento foi feito por causa da pandemia e com a chegada da Ômicron. A entidade disse que toparia fazer o evento em locais fechados, seguindo protocolos contra a Covid-19 como uso de máscara, álcool em gel, aferição de temperatura, entre outros.

"Junho não resolve o problema de abril. Abril é uma realidade. Serão blocos bem menores, sem grandes estruturas de som, mais de batucada. Só vamos fazer divulgação interna e aparecer na rua. Pode acontecer de bares reunirem pessoas, com DJ ou roda de samba, e elas saírem às ruas. Fazemos Carnaval há muito tempo e os organizadores são cuidadosos, mas há uma incógnita sobre o fechamento de ruas", elenca Alessa.

Repressão

Um dos grandes receios dos organizadores é que haja repressão policial aos blocos, com apreensão de instrumentos e possíveis confrontos. Eles citam a Constituição Federal para assegurar o direito à ocupação da via pública em manifestação cultural.

"Não é Carnaval para a cidade, é para os moradores locais, com bloquinhos territoriais, que podem sair sem represálias. Se a PM chegar para intimidar, teremos um plantão da Defensoria Pública enquanto os blocos estiverem na rua. A Defensoria pediu dados, mas disse que está junto com a gente", destaca José Cury.

Trios elétricos não vão desfilar
Trios elétricos não vão desfilar

Para Marco Ribeiro, o importante é garantir o direito à livre manifestação: "Não queremos apanhar e que a polícia haja com truculência. Já sabemos que a prefeitura não vai dar a estrutura. Vamos distribuir rosas amarelas e vermelhas de papel crepon para que não tenha confronto".

Na terça (12), a Defensoria Pública, por meio do Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos, oficiou a Prefeitura de São Paulo e o comando da Polícia Militar sobre informações do Carnaval no feriado de Tiradentes e para que não haja repressão aos grupos.

"Há receio de eventual uso desproporcional da força policial e ameaças ao direito de reunião e manifestação cultural durante as festividades programadas entre os dias 21 e 24", escreveu.

No ofício, a Defensoria pede que sejam adotadas as providências necessárias para garantir que as forças policiais e de segurança municipal não atuem na repressão "considerando seu caráter público e comunitário". O documento também questiona qual protocolo será seguido pela Polícia Militar em caso de eventual dispersão de aglomeração de foliões e quer saber se há planejamento de alguma operação específica para o período.

O órgão também solicita que sejam prestadas informações como a ausência de suporte financeiro e material aos blocos por parte do poder público e se há possibilidade de disponibilizar banheiros públicos e agentes de limpeza para os locais de comemoração.

A Defensoria Pública, no entanto, ainda não definiu se haverá um plantão jurídico para apoiar os blocos no feriado, como disseram os organizadores.

O Carnaval de rua virou tema de debate na Comissão de Cultura da Câmara de Vereadores. Também o deputado Emidio de Souza, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo, emitiu uma nota solicitando ao secretário de segurança e ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) garantias de que não haverá uso das forças da PM e GCM na dispersão dos blocos.

"A data é a mesma para a qual a prefeitura transferiu o desfile oficial das escolas de samba. A autorização, no entanto, não foi dada aos eventos populares de rua. Reconhecemos o direito constitucional à reunião, à livre expressão e ao uso dos espaços públicos pela cidadania", escreveu o parlamentar.

Sem divulgação externa, blocos devem reunir menos foliões e mais moradores da região
Sem divulgação externa, blocos devem reunir menos foliões e mais moradores da região

Prefeitura de São Paulo

Em nota, a Prefeitura de São Paulo pediu "bom senso aos dirigentes dos blocos para garantir a segurança não só dos participantes, mas também da população".

Segundo a administração municipal, o diálogo está aberto com as entidades: "A disposição da gestão municipal, que defende as manifestações culturais e democráticas, está empenhada em encontrar uma data consensual com tempo hábil para planejar o evento e, assim, garantir a segurança e a infraestrutura necessárias".

A prefeitura lembrou que o Carnaval de rua foi cancelado em função da variante Ômicron e da impossibilidade de cumprir os protocolos sanitários diante da expectativa de público de 15 milhões de pessoas. 

A administração municipal insiste que o planejamento é grandioso por envolver roteiros, alterações no sistema viário e transporte público, infraestrutura, policiamento e serviços médicos. Mas não respondeu como pretende auxiliar na organização durante os desfiles.

Segundo a prefeitura, a regra específica prevê que a realização de eventos dos blocos, cordões, bandas e demais manifestações do Carnaval deverá ser previamente autorizada pelos órgãos competentes com informações sobre organizadores, horário, locais e períodos de duração.

A gestão cita o decreto 49.969/2008, que regulamenta a expedição de alvará de autorização para eventos públicos e temporários, e estabelece antecedência mínima de 30 dias da data de realização do evento.

"O Carnaval do Sambódromo foi adiado e a realização postergada num entendimento democrático e transparente com as entidades que representam as escolas de samba. Isso demonstra de forma inequívoca que, quando não há intransigência e eventuais motivações ideológicas, o interesse público prevalece, os consensos são construídos e todos os setores da cidade de São Paulo são beneficiados", concluiu em nota.

A reportagem também procurou a PM e a Secretaria da Segurança Pública, que não responderam aos questionamentos.

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