Em meio a críticas, região central de SP terá câmeras de monitoramento facial
Tecnologia chegou a ser questionada na Justiça pela possibilidade de discriminação racial e risco à privacidade de dados
São Paulo|Do R7
Dentro de dois meses, a região central de São Paulo, inclusive na avenida Paulista, deverá ter 200 câmeras de monitoramento espalhadas por escolas, postos de saúde e parques. Esse é o primeiro passo do Smart Sampa, projeto de videomonitoramento e reconhecimento facial na segurança pública da cidade.
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A assinatura do contrato do projeto, realizada na manhã desta segunda-feira (7) pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) na região central, encerra uma longa polêmica sobre o uso das câmeras. A tecnologia chegou a ser questionada na Justiça, pela possibilidade de discriminação racial e pela reprodução do racismo estrutural, além do risco à privacidade de dados.
A aquisição dos equipamentos é uma das apostas da gestão Ricardo Nunes para enfrentar o consumo e o tráfico de drogas na Cracolândia e reduzir a sensação de insegurança na região central. A meta é instalar 20 mil câmeras até 2024; no centro, serão 3.300. O custo mensal do consórcio vencedor da licitação será de R$ 9,8 milhões por mês.
As imagens servem principalmente para o reconhecimento de pessoas procuradas pela Justiça, como egressos do sistema penitenciário, além de pessoas desaparecidas. O sistema armazena informações de reconhecimento facial e a localização das pessoas, o que permite saber se alguém esteve em algum ponto da cidade e em qual horário.
Nunes afirmou que a captação de imagens de eventuais suspeitos de crimes não será transferida automaticamente para as forças policiais. Os registros devem passar primeiro por um comitê, com a participação da Controladoria–Geral do Município. O comitê será composto de sete pastas, entre elas a de Segurança Urbana, Transportes, CET e SPTrans e eventualmente terá a participação da Polícia Civil e da Polícia Militar.
É necessária a similaridade de 90% entre os pontos biométricos da face captados pelas câmeras e as imagens do banco de dados para a emissão de um alerta para um agente de segurança, que fará a abordagem. "O reconhecimento não significa uma sentença", afirma Junior Fagotti, secretário-adjunto de Segurança Urbana. No caso dos delitos, as imagens são enviadas imediatamente para as forças de segurança.
Programa enfrenta críticas
O programa divide opiniões. A tecnologia de reconhecimento facial é alvo de críticas e processos na Justiça. Entidades defensoras de direitos humanos afirmam que a ferramenta pode ter viés discriminatório contra pessoas negras. Especialistas em proteção de dados colocam em dúvida as garantias de proteção dos dados dos cidadãos.
Em São Paulo, o processo também foi polêmico. A primeira versão do edital, publicada em novembro de 2022, alegava que "a pesquisa de imagens deve ser feita por diferentes tipos de características, como cor, face e outras características", e também que "a identificação do comportamento ocorre com base em situações de ‘vadiagem’ e ‘tempo de permanência’ do suspeito em um local".
Fagotti afirma que a falha aconteceu em função da "tradução literal dos manuais da câmera, e que essas características nunca fizeram parte do projeto".
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Entidades como Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) se mostraram contrárias ao alegar que os recursos de reconhecimento facial representam risco para o direito à privacidade e risco de discriminação para as populações mais vulneráveis, em especial pessoas negras.
Em abril de 2023, o edital foi parcialmente modificado, e o TCM (Tribunal de Contas do Município) liberou a retomada para a compra das câmeras. A Bancada Feminista, mandato coletivo do PSOL na Câmara Municipal de São Paulo, conseguiu uma liminar na Justiça. No dia 18 de maio, o pregão foi novamente suspenso pelo juiz Luis Manuel Fonseca Pires, que poderia violar a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e apresentar risco de reprodução do racismo estrutural no uso do sistema.
O CESeC (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania), que monitora o reconhecimento facial no Brasil, revela que cerca de 90% das pessoas presas com a tecnologia utilizada no Rio de Janeiro eram negras, em 2018.
Rafael Alcadipani, professor titular da Fundação Getulio Vargas e associado pleno ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública, considera o projeto positivo, mas mostra preocupação com estigmatizações. "O processo tem de ser conduzido de forma técnica e profissional, para evitar injustiças e estigmatizações de grupos vulneráveis."