“Me sinto pequena e subjugada, mas fortalecida”, diz deputada assediada
Vídeo gravado por câmera da Alesp registrou o momento em que o deputado se aproxima da parlamentar, passa a mão na altura de seu seio e da cintura
São Paulo|Fabíola Perez e Guilherme Padin, do R7
A deputada Isa Penna (PSOL) afirmou nesta sexta-feira (18), durante coletiva de imprensa, que o assédio sexual sofrido por ela após ato do deputado Fernando Cury (Cidadania) a fez se sentir pequena e subjugada enquanto mulher.
"Toda mulher que passa por isso e não tem consequências se sente pequena, subjulgada. Eu também tenho já o couro grosso. Não é a primeira vez nem a décima em que eu passo por uma situação parecida com essa. Me sinto tudo isso que qualquer mulher se sente, mas também me sinto muito fortalecida", disse a deputada ao ser perguntada sobre a Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) julgar o caso apenas em fevereiro próximo.
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"O presidente da Alesp tem a prerrogativa de instaurar o processo de apuração, de transformar em processo de ofício. Ele não fez, sequer se pronunciou", destacou Isa Penna.
Após o episódio de assédio, a deputada escreveu em suas redes sociais agradecendo o apoio que recebeu. "Hoje o dia foi difícil e a noite de ontem também. Queria agradecer todas as demonstrações de apoio. Amanhã a luta seguirá nossa. Não é por mim, é por todas, até que nenhuma mulher mais seja assediada em nenhum espaço!"
De acordo com a doutoranda e mestre em ciência política pela Universidade de São Paulo, Hannah Maruci, violência de gênero e raça vem sendo denunciada sistematicamente nos espaços de poder. "O que mais incomoda nessa situação revoltante é o quanto estamos denunciando isso de diversas formas", diz.
Veja também: 'Me sinto enojada', diz Isa Penna sobre assédio sexual de deputado
"Como marco da violência política de gênero e raça, temos o homicídio da Marielli Franco, as ameaças contra Talíria Petroni e inúmeras vereadoras negras, trans, mulheres em geral ameaçadas por serem eleitas. A violência de gênero, infelizmente, não é novidade", afirma ela que também é co-idealizadora da Tenda das Candidatas, espaço dedicado a cursos de formação de política para mulheres e ao apoio a candidaturas femininas.
"Infelizmente precisamos de um vídeo que prove que isso ocorre para gerar algum tipo de comoção. A pergunta é: quantas mulheres precisamos para provar que a violência de gênero é real?", questiona. "É uma estrutura machista que coloca uma opressão às mulheres, distanciando-as dos espaços de poder e ao mesmo tempo impondo medo, porque ninguém acredita. São casos que se relacionam a Mari Ferrer, à Dani Calabresa."
Durante a coletiva, Penna também afirmou que o deputado Fernando Cury (Cidadania) estava bêbado no momento do assédio. "Ele estava completamente bêbado, isso ficou claro. Mas o problema (neste caso) não era a bebida. Não acho que isso determinou a conduta do deputado", disse a deputada, que relatou ter sentido o cheiro de álcool quando o parlamentar se aproximou.
Cury afirmou no plenário que não houve tentativa de assédio. "Não houve da minha parte tentativa de assédio. Se a deputada Isa Penna se sentiu ofendida com o abraço que eu lhe dei eu peço de início desculpas. Se eu a constrangi, desculpa. Eu ví o vídeo, vocês viram o vídeo. O que tem de errado ali? Só se o seu entendimento é diferente do meu", disse.
Ao ser questionada durante a live sobre ninguém ter manifestado apoio no momento do assédio, Isa Penna afirmou que a assembleia é um ambiente "corporativista no sentido da proteção dos pares".
"Tem a ver com a manutenção de seus privilégios, consciente por parte de uns e inconsciente por parte de outros, e isso ficou de forma muito manifesta. E também tinha muita coisa acontecendo no plenário naquele momento", afirmou.
Por meio de nota, o partido Cidadania afirmou que analisa as imagens do vídeo. "Com relação ao episódio envolvendo o deputado estadual Fernando Cury, o Cidadania analisando as imagens, exige as devidas explicações do parlamentar e encaminha o caso ao nosso Conselho de Ética, para que ouvido o representado, sejam tomadas providências cabíveis e efetivas."
A legenda afirmou ainda que "não tolera qualquer forma de assédio e atuará fortemente para que medidas definitivas sejam adotadas. Temos uma história de luta em defesa dos direitos da mulher que nenhuma pessoa pode macular."
A deputada estadual ainda fez críticas ao governador João Doria, destacando a falta de políticas públicas de combate à violência contra a mulher: "para o governo do Estado de São Paulo, a luta das mulheres não existe".
Ela apontou que é papel do Estado fornecer dados amplos a respeito da violênca de gênero, oferecer acolhimento às vítimas e campanhas de prevenção a partir de, por exemplo, educação para as crianças. "Queremos ensinar todos os meninos e meninas que amor e violência não têm a ver uma coisa com a outra, que brincadeira e assédio não têm a ver", afirmou.
Isa Penna também fez um apelo para que os cidadãos assinem a petição pela cassação do mandato de Fernando Cury:
“É por mim que eu peço, enquanto uma mulher machucada e ferida, que teve seu espaço e intimidade invadidas, mas é [também] por nós todas. É pela Marri Ferrer que passou por uma situação da sentença absurda de estupro culposo, é pela Dani Calabresa, que recentemente publicou nas redes dela o que ela passou, é pelas vereadoras negras recém-eleitas, que foramameaçadas de morte. É pela nossa realidade, e acima de tudo pelas que virão”.
Assédio na Alesp
A deputada Isa Penna (PSOL) afirma ter sido assediada pelo deputado Fernando Cury (Cidadania) dentro da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), durante sessão extraordinária, na última quarta-feira (16).
Um vídeo gravado por uma câmera da Alesp registrou o momento em que o deputado se aproxima da parlamentar, quando ela está próxima à mesa da presidência. Cury posiciona por trás da deputada, e passa a mão na altura de seu seio e da cintura. A parlamentar então, retira a mão do colega. Em seguida, Cury põe a mão no ombro de Penna, que afasta novamente a mão dele.