MP denuncia homem que foi amarrado por PMs por furto, resistência e corrupção de menor
Denunciado foi preso após levar alimentos de um mercado na zona sul de capital; durante a prisão, ele foi amarrado por PMs
São Paulo|Letícia Dauer, do R7
O MP-SP (Ministério Público de São Paulo) denunciou, nesta sexta-feira (16), o homem negro que foi amarrado com cordas e carregado por policiais militares até uma viatura pelos crimes de furto qualificado, corrupção de menor e resistência. Ele, outro homem e um adolescente são acusados de pegar alimentos de um mercado na Vila Mariana, zona sul da capital.
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Em 5 de junho, o denunciado, de 32 anos, foi preso em flagrante com duas caixas de bombons. Durante a abordagem, dois agentes amarraram os pés e as mãos dele. Um vídeo registrou a cena, que foi amplamente divulgada nas redes sociais. Nas imagens, é possível vê-lo gritando de dor. (Veja o vídeo abaixo.)
De acordo com a denúncia, da promotora de Justiça Margarete Cristina Marques Ramos, o homem "primeiramente ingressou no mercado e colocou diversas mercadorias numa cesta. Como o funcionário já o conhecia por outros furtos no estabelecimento, acionou o botão de pânico".
Ramos também afirma no documento que o denunciado confessou a prática do crime. Segundo os policiais, ele teria desobedecido às ordens e, por isso, tiveram de usar força para contê-lo. Ele ainda teria dito que "arrancaria a arma dos policiais e atiraria neles”.
A denúncia também aponta que o homem é reincidente e estava cumprindo pena por roubo, por isso a liberdade provisória não poderia ser concedida. Na semana passada, o TJSP (Tribunal de Justiça de São Paulo) também negou o pedido de habeas corpus.
Tortura
Para entidades de defesa dos direitos humanos e o advogado de defesa José Luiz Oliveira Júnior, o denunciado foi torturado ao ser amarrado pelos pés e pelas mãos e carregado pelos policiais. Além de apontar a ilegalidade da prisão, o advogado alega que o crime foi um furto famélico, ou seja, um furto praticado por uma pessoa sem condições financeiras para adquirir o alimento.
Em relação ao comportamento dos agentes, a promotora de Justiça afirma que "a conduta dos policiais militares não tem o condão de anular os crimes cometidos e será devidamente apurada em procedimentos próprios, vez que já enviadas cópias do presente aos órgãos competentes para tanto".
Durante a audiência de custódia, em 5 de junho, a juíza Gabriela Marques Bertoli — que decretou a prisão preventiva do investigado — também reiterou que não houve tortura na prisão.
Questionado sobre a decisão da promotora, o advogado respondeu em nota:
"Defendemos o Estado Democrático de Direito a toda uma comunidade preta empurrada desde a formação do Brasil para as periferias, que desconhece as regras sórdidas desse jogo de cartas marcadas, justamente para encarcerá-los. Não há reabilitação, não há segunda chance. Há castigo sem reflexão e estigma para sempre. E o recado é claro: desocupem nossas belas ruas, praças e locais dos cidadãos de bem; e, pois, se necessário, os amarraremos, arrastaremos por aí e nada há de nos acontecer. Esse é o recado. Ratificado pela Justiça? Ainda há esperança! Cremos. A decisão exarada pelo MP e pela Justiça, até então, é mais fácil do que discutirmos socialmente uma questão que não é apenas criminal, mas deveras social".
Versão dos policiais
Os policiais militares relataram, de acordo com o boletim de ocorrência, que o homem estava bastante alterado e não acatou as ordens. Os agentes, então, pediram apoio a outra viatura, e foram necessários quatro policiais para contê-lo. Mesmo algemado, ele ainda teria resistido à prisão e, por isso, os PMs teriam usado uma corda.
Por meio de nota, a Polícia Militar lamenta o caso. "Foi instaurado um inquérito para apurar todas as circunstâncias relativas às ações dos policiais envolvidos no episódio. Todos foram preventivamente afastados das atividades operacionais, uma vez que as ações estão em desacordo com os procedimentos operacionais da instituição."