A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, entidade ligada ao MPF (Ministério Público Federal), enviou uma representação ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmando que a lei que implementou as escolas cívico-militares no estado de São Paulo fere o modelo de educação previsto na Constituição Federal. Segundo a procuradoria, a estrutura afronta os princípios de liberdade de pensamento e da gestão democrática das escolas. A procuradoria pediu a Gonet que questione a constitucionalidade da lei ao STF (Supremo Tribunal Federal). O governo de São Paulo informou que o projeto está em conformidade com a legislação e prestará todos os esclarecimentos ao Supremo Tribunal Federal.A lei que criou as escolas com gestão mista foi aprovada pela Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) em 21 de maio de 2024, e sancionada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) no dia 27 do mesmo mês. O texto estabelece que a Secretaria de Educação vai ser responsável pelo currículo pedagógico das unidades, e a Secretaria de Segurança Pública vai indicar policiais militares da reserva para atuar na organização disciplinar e segurança das unidades.A representação é assinada pelo procurador federal dos Direitos do Cidadão, Nicolao Dino, que defende que a eficácia da lei seja suspensa. Segundo ele, a medida é necessária pois “conterá os prejuízos sociais e econômicos decorrentes da implantação do programa de militarização instituído naquele estado, bem como impedirá a violação frontal da ordem jurídica pátria, haja vista que a manutenção da eficácia do ato normativo ora analisado configura grave risco ao Estado de Direito”.No documento, o procurador afirma que “a Constituição Federal não permite aos estados estabelecerem modelo de educação diverso daquele definido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional”. Ele também questiona o fato de a Alesp ter aprovado a lei. De acordo com Dino, “não está no escopo da competência legislativa concorrente dos entes federados a criação de um programa híbrido alternativo, como esse cívico-militar de São Paulo”.Leia mais: Como vão funcionar as escolas cívico-militares em SP? EntendaOutro problema apontado por Dino é a previsão de dois núcleos, um civil e um militar, para atuar dentro das escolas. Ao prever a seleção de policiais militares da reserva sem aprovação em concurso público ou formação específica, ele diz que a lei afrontaria o princípio de valorização dos profissionais de educação.“Em grande verdade, as somas a serem recebidas por policiais da reserva a título de gratificação superarão o valor percebido por professores que atuam na Rede de Ensino de Educação Básica do Estado de São Paulo, considerando o piso salarial atual da categoria, de R$ 5.300,00″, afirma a representação.O procurador também defende que a designação dos militares configura desvio de função e extrapola os limites constitucionais impostos. “Desse modo, considerando a incompatibilidade da coordenação de atividades educacionais por militares frente ao que foi estabelecido pela Constituição, a designação de militares da reserva para o exercício de funções pedagógicas configura desvio de função da força militar estadual, bem como extrapola os limites constitucionais impostos às suas atividades”, justifica.Na representação, Dino ressalta a importância de projetos pedagógicos que possibilitam a pluralidade de ideias, formação de espírito crítico e transparência. Segundo ele, o modelo cívico-militar abre uma brecha para a “implantação de vetores próprios da formação/educação militar, com o consequente arrefecimento do espaço crítico para diálogo e desenvolvimento livre do pensamento no ambiente escolar“.O que diz o outro lado?“O Estado de SP, assim que solicitado, prestará todos os esclarecimentos ao STF. O Programa Escola Cívico-Militar na rede paulista de ensino está em conformidade com a legislação vigente, e sua adesão é voluntária, sendo definida pela comunidade escolar.”