A rua São Paulo é uma ladeirinha que liga a baixada do Glicério ao bairro da Liberdade, na região central da capital paulista. Sem lojas famosas, restaurantes ou galerias, ela não chama muito a atenção de quem passa pela região. Os prédios antigos com ares clássicos transformados, na sua maioria, em cortiços de preços populares são o lar de moradores humildes vindos de lugares distantes e que sonham em vencer na vida. Assim como a cidade que está comemorando 462 anos, a rua São Paulo é cheia de histórias, problemas e virtudes. Por não ser uma via de trânsito, um beco transversal no meio da rua São Paulo virou um ponto de concentração de usuários de crack. A falta de uma ação do Poder Público para resolver o problema da mini-cracolândia é uma das principais reclamações da vizinhança. "É de fazer pena", diz Antônio Hélio, dono de uma sapataria na rua. O nome oficial da via surgiu há cem anos, em 1916. Antes, ela aparecia nos mapas como rua dos Ingleses, por causa da família britânica Rademacher que tinha uma propriedade ali. Como a rua terminava no antigo Largo de São Paulo, onde foi construído o Cine Theatro São Paulo, as pessoas se referiam a ela como rua que "vai para o largo de São Paulo" ou "rua do largo de São Paulo" até que virou rua São Paulo. O balconista Marcos de Souza, 31 anos, mora na Bela Vista e trabalha há dois anos em um mercadinho na rua São Paulo. "Aqui é muito tranquilo. Às vezes a gente até esquece que está no centro da maior cidade do País. Para mim só falta uma ciclofaixa. Muitas ruas do centro têm uma, mas aqui não". Nos últimos dois anos, a prefeitura instalou 400 kms de ciclofaixas na cidade. Cada quilômetro tem um custo estimado de R$ 200 mil. Haitianos Os cortiços da rua São Paulo são o endereço de centenas de haitianos que buscam no Brasil um recomeço de vida. "Eles começaram a chegar há um ano e meio, mais ou menos, são ótimos vizinhos. Eles têm um ponto de encontro aqui na rua e nos finais de semana tem churrasco, muita música e dança. Eles trabalham muito durante a semana e esses encontros são bem concorridos. Acaba virando uma festa da rua toda", conta Ezequiel Dantas, 31 anos, dono de um bar na rua São Paulo. Dantas nasceu no Guarujá, no litoral paulista, e passou uma boa parte da vida dividido entre as duas cidades. "Morava dois anos lá e dois aqui. Eu era motoboy e decidi virar comerciante para tentar uma vida melhor. São Paulo, a rua e a cidade, pra mim são uma oportunidade de progresso". A analista de web Sara Catarina, 26 anos, mora na rua São Paulo desde os oito anos de idade. "É uma rua de pessoas pobres e com muitos problemas, mas não posso reclamar da infância. Tinha muitas brincadeiras e muitos amigos. Também tive exemplos de pessoas que moraram aqui e progrediram na vida", lembra. Atualmente, a rua não tem opções de lazer para as criança. Segundo Sara, um antigo morador tinha aprovado um projeto de rua de lazer aos domingo. "A rua era fechada com uns cones e as crianças podiam jogar bola, brincar de pular corda com toda a segurança. Depois que este morador morreu, há uns três anos, não fecharam mais a rua", comenta. Outro problema da rua São Paulo é a coleta irregular do lixo. "Colocaram contâineres por toda a rua, mas como mora muita gente aqui eles ficam cheios rápido. Se demora muito para recolher fica um odor horrível e aparecem ratos e baratas", contou o comerciante Ezequiel Dantas.Gigante O chapeiro Rodrigo dos Santos tem 16 anos e há dois deixou uma cidade pequena no interior da Bahia para viver e trabalhar em São Paulo. Ele veio com a família em um dos cortiços da rua São Paulo e desde muito pequeno ouvia histórias sobre a cidade. "Diziam que São Paulo era muito grande e que o inverno era frio demais. Eu não achei tão frio, mas os prédio são enormes e a cidade não termina nunca. Eu fiquei impressionado... É como entrar em um gigante". Santos tem sonhos e ambições em relação à cidade. Ele namora há um ano, mas não conhece os pontos turísticos da cidade. "Eu já fui no parque do Ibirapuera e gostei, mas não conheço a avenida Paulista e nunca fui ao cinema". O trabalho na lanchonete é, para ele, apenas uma etapa de vida. O seu plano é fazer um curso de auxiliar de enfermagem. "É um profissão bonita. Terei um salário melhor e mais tempo e dinheiro para conhecer e aproveitar a cidade. Depois quero comprar uma casa e sair do aluguel".