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Samu recebe mais de 87 mil trotes por ano na Grande São Paulo

Para os profissionais de saúde, as ligações sobrecarregam principalmente o trabalho dos técnicos do atendimento telefônico

São Paulo|Letícia Dauer, do R7

Em 2022, o Samu de São Paulo recebeu em média 188 trotes por dia
Em 2022, o Samu de São Paulo recebeu em média 188 trotes por dia

Nos últimos cinco anos, o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) recebeu mais de 238 trotes por dia apenas na região metropolitana de São Paulo. Neste período, 435.050 das 9.652.402 ligações atendidas eram trotes, ou seja, 4,5% do total. São mais de 87 mil por ano.

O levantamento exclusivo do R7 contabilizou os números das 39 prefeituras que compõem esta região. É importante ressaltar que alguns municípios não possuem este serviço de emergência ou o sistema informatizado para somar as ligações recebidas nos últimos anos, por isso os números podem ser maiores.

O trote pode parecer uma brincadeira descontraída para crianças e adultos, mas pode colocar a vida de pacientes em risco e prejudicar o trabalho dos atendentes.

Para os profissionais de saúde ouvidos pelo R7, essas ligações falsas atrapalham, principalmente, o fluxo de trabalho nas centrais de atendimento, além de sobrecarregar o trabalho dos operadores de telefone.


"Enquanto o funcionário está atendendo essas pessoas [que passam trotes], pacientes em estado grave deixam de ser acolhidos", critica Admilson Máximo dos Santos, coordenador médico da central de regulação do Samu de São Paulo.

Como funciona o Samu?

Qualquer pessoa pode acionar o Samu ligando para o 192. O serviço é gratuito e funciona 24 horas. O atendimento começa pelo telefone, quando os técnicos identificam o tipo de emergência e coletam as primeiras informações da vítima. 


Em seguida, as chamadas são direcionadas aos médicos e enfermeiros reguladores, que prestam orientações de socorro. Caso julguem necessário, uma ambulância é encaminhada para o endereço do paciente.

Segundo o Ministério da Saúde, o acionamento do resgate é apenas disponibilizado para vítimas em alguma situação de urgência ou emergência que possa levar a sofrimento, a sequelas ou até mesmo à morte. São consideradas urgências situações, por exemplo, de natureza clínica, cirúrgica, obstétrica e pediátrica.


Pandemia

Analisando os dados entre 2018 e 2022, é possível perceber uma queda drástica do número de trotes no período da pandemia. Em 2019, foram contabilizadas mais de 117.992 ligações. Enquanto no ano seguinte, o número caiu para 60.738 (-48,5%). 

Para o médico Caio Genovez Medina, diretor do Departamento de Atenção Hospitalar, Urgências e Emergências de São Bernardo do Campo, durante a pandemia, a imagem do sistema público de saúde, inclusive do Samu, ficou mais simpática a população. "Os serviços ficaram muito sobrecarregados, o que pode ter contribuído para essa sensibilização frente ao cenário da Covid", afirma.

A enfermeira Soraia Barros, responsável pelo núcleo de educação e estatística do Samu de Taboão da Serra, também aponta que o perfil das ligações mudou durante a pandemia. "Em 2020, as pessoas deixaram de acionar o Samu para ocorrências simples como dor de barriga, dor de dente, quedas no interior da casa".

Em 2019, a cidade de Taboão da Serra, por exemplo, recebeu 5.782 trotes. Enquanto, em 2020 e 2021 (anos de pandemia), o número caiu para 3.738 e 3.165, respectivamente. 

Além do aumento da gravidade das solicitações, a adoção de medidas sanitárias de combate à Covid, como a restrição de circulação da população e o fechamento de comércio pelo governo estadual, influenciou na queda de acidentes nas cidades e, consequentemente, o número de ligações para o Samu, de acordo com Barros.

Identificação de ligações

Segundo os profissionais de saúde, a maioria dos trotes são identificados por meio das ligações telefônicas, na primeira etapa de atendimento. São raras as ocasiões nas quais uma ambulância é despachada ao endereço da falsa solicitação. Entretanto, provocam sobrecarga de trabalho nas centrais de atendimento.

Ao R7, a enfermeira do núcleo de educação e estatística do Samu de Taboão da Serra explicou que os técnicos conseguem identificar os trotes quando o solicitante não sabe transmitir informações básicas como o endereço, dizem coisas aleatórias ou percebem a voz de crianças. 

O médico Caio Genovez Medina também contou que o município de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, recebe trotes de crianças, que costumam fazer as ligações depois de voltar da escola, e até mesmo de maníacos sexuais que assediam as funcionárias.

"Eles [os técnicos do atendimento telefônico] são muito bons e bem treinados. Às vezes no primeiro ‘alô’, já sabem que é um trote. Não há muito gasto com essas ligações, mas há um desgaste grande dos funcionários", afirma Medina.

Adultos também passam trotes

Diferente do cenário esperado, na capital paulista, os adultos são os que mais passam trotes para o serviço de emergência. 

Em 2019, o Samu recebeu 87.837 trotes, sendo 66.109 realizados por adultos e 21.728 por crianças. No ano de 2020, foram 37.792 ligações falsas, sendo 25.603 e 12.189, respectivamente. Enquanto, em 2021, foram atendidos 72.368, sendo 39.507 e 32.861. 

De acordo com o coordenador médico da central de regulação do Samu de São Paulo, a pandemia alterou os tipos de serviços e chamados. "Todo mundo ficou mais confinado. As crianças eram mais vigiadas e não tinham acesso tão livre ao telefone, enquanto o adulto pode extravasar", aponta.

Trote é crime

Passar trotes aos serviços de emergência é um crime previsto pelo artigo 266 do Código Penal. O infrator pode pegar de um a seis meses de prisão. Crianças e adolescentes também podem ser punidos.

"O ato prejudica o atendimento às ocorrências emergenciais verídicas. Esses episódios colocam vidas em risco ao congestionar o sistema e direcionar equipes para locais sem ocorrências, o que pode ser agravado pelas distâncias que precisam ser percorridas numa cidade com as dimensões de capital paulista", complementa a Prefeitura de São Paulo.

Quando chamar o Samu?

- Na ocorrência de problemas cardio-respiratórios;

- Intoxicação exógena e envenenamento;

- Queimaduras graves;

- Na ocorrência de maus tratos;

- Trabalhos de parto em que haja risco de morte da mãe ou do feto;

- Em tentativas de suicídio;

- Crises hipertensivas e dores no peito de aparecimento súbito;

- Quando houver acidentes/traumas com vítimas;

- Afogamentos;

- Choque elétrico;

- Acidentes com produtos perigosos;

- Suspeita de Infarto ou AVC (alteração súbita na fala, perda de força em um lado do corpo e desvio da comissura labial são os sintomas mais comuns);

- Agressão por arma de fogo ou arma branca;

- Soterramento, Desabamento;

- Crises Convulsivas;

- Transferência inter-hospitalar de doentes graves;

- Outras situações consideradas de urgência ou emergência, com risco de morte, sequela ou sofrimento intenso.

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