A segunda testemunha da acusação a ser ouvida no julgamento do Carandiru foi também um sobrevivente do massacre. O ex-detento Marco Antônio de Moura contou que foi baleado no pé por um policial na cela durante a invasão da tropa de choque. Ele também contou que ouviu a frase “Deus cria, a Rota mata” de alguns policiais no momento da invasão. Ainda de acordo com Moura, quando os detentos foram retirados das celas, policiais teriam pedido para os presos gritarem “Viva o Choque” durante o trajeto até o pátio, onde ficaram reunidos sem roupa. Ali, Marco Antônio contou que ficaram até o anoitecer. Ele, que estava ferido, disse que chegou a ter medo de pedir socorro. — No pátio, ficamos muitas horas sentados e os policiais falavam para os feridos erguerem as mãos e eles acabavam de matar. [Depois] Levavam embora e ninguém mais via [os feridos baleados]. Leia mais notícias de São PauloSobrevivente de massacre no Carandirú chora e diz que alguns presos "morreram só de olhar para os policiais" Marco Antônio afirmou também que nenhum preso estava armado e a briga que teria motivado a rebelião foi um acerto de contas entre líderes de quadrilha. Segundo ele, os detentos não foram baleados no enfrentamento à tropa. — Não tem como atacar policial armado até o dente.Helicóptero O sobrevivente também contou que, naquele 2 de outubro de 1992, até um policial usando uma metralhadora atirava de um helicóptero. Moura disse também acreditar que muitos detentos que foram até o telhado para tentar fugir acabaram sendo baleados pelo PM que estava no helicóptero e morreram. Marco Antônio estava preso no Complexo Penitenciário do Carandiru por roubo. Ele foi condenado a cinco anos e quatro meses. O sobrevivente foi solto em 1994 e disse que nunca mais foi processado por algum outro tipo de crime. O ex-presidiário ficou internado no pavilhão 4 após o massacre, depois chegou a retornar ao pavilhão 9 da Casa de Detenção de São Paulo e foi transferido. — Um mês depois, ainda tinha cheiro de carnificina.Réus No júri desta segunda-feira são réus os PMs que estavam no 2º pavimento (primeiro andar) do pavilhão nove. São eles: Ronaldo Ribeiro dos Santos; Aércio Dornelas Santos; Wlandekis Antonio Candido Silva; Roberto Alberto da Silva; Antonio Luiz Aparecido Marangoni; Joel Cantilio Dias; Pedro Paulo de Oliveira Marques; Gervásio Pereira dos Santos Filho; Valter Ribeiro da Silva (morto); Marcos Antonio de Medeiros; Luciano Wukschitz Bonani (morto); Paulo Estevão de Melo; Haroldo Wilson de Mello; Roberto Yoshio Yoshikado; Fernando Trindade; Salvador Sarnelli; Argemiro Cândido; Elder Tarabori; Antonio Mauro Scarpa; Marcelo José de Lira; Roberto do Carmo Filho; Zaqueu Teixeira; Osvaldo Papa; Reinaldo Henrique de Oliveira; Sidnei Serafim dos Anjos; Eduardo Espósito; Maurício Marchese Rodrigues; Marcos Ricardo Poloniato. Eles respondem por homicídio qualificado — com uso de recurso que dificultou a defesa da vítima — de 15 detentos durante a ação policial realizada no dia 2 de outubro de 1992 para conter uma rebelião da Casa de Detenção em São Paulo. Ao todo, 111 presos foram mortos.