'Vi o comportamento do meu filho mudar', diz mãe de menino vítima de abuso sexual por professor
Crimes ocorreram na cidade de Cotia, na Grande São Paulo, há seis anos. Autor foi preso, mas a família decidiu sair do país
São Paulo|Letícia Dauer, do R7
Sessenta dias. Esse foi o tempo para que Mariana*, mãe de uma criança abusada sexualmente pelo professor de educação física, José Pedro de Andrade, preso na segunda-feira (12) no município de Cotia, na Grande São Paulo, começasse a perceber indícios de que o filho havia sido vítima de um crime na escola em que estudava. "Vi o comportamento do meu filho mudar", disse a mãe em entrevista ao R7.
Os abusos ocorreram ao longo do mês de junho de 2016 na área interna do Colégio Sigma, também localizado em Cotia, onde Mariana e José Pedro trabalhavam como professores. Cinco anos após o assédio, a família decidiu deixar o país para tentar superar o trauma.
À reportagem, Mariana afirmou que começou a trabalhar na instituição em janeiro daquele ano, quando a direção da escola ofereceu uma bolsa integral ao filho Matias*, de 10 anos na época.
Leia também
O menino deveria ter sido matriculado no 5° ano, porém a escola era nova e só oferecia aulas até o 4° ano. Mesmo assim, a mãe o levou para a instituição, seguindo a orientação do diretor. “Em maio, uma professora de matemática disse que estava difícil dar aulas [ao Matias] devido à diferença de idade e de conhecimento em relação aos outros alunos. Ele se dispersava muito.”
Como sugestão da direção, o professor de educação física começou a dar aulas individuais ao menino duas vezes por semana. O refeitório, localizado no andar superior e distante da secretaria de ensino, foi transformado em sala de aula.
Segundo Mariana, que criava o filho sozinha, José Pedro se apresentava como uma pessoa religiosa, sensata, educada e amiga no trabalho, por isso ela não desconfiava dos abusos sexuais.
Mudança de comportamento
“Ele era muito independente, porém começou a pedir para dormir comigo. Também me agarrava quando eu ia sair de casa. Percebi que tinha algo estranho acontecendo”, relatou a mãe.
Matias costumava acordar feliz para ir à escola, mas passou a não querer ir mais. No final das férias escolares, em julho, ele teve alguns pesadelos. “Um dia ele acordou gritando, falando que a cueca estava cheia de sangue”, disse Mariana com a voz embargada.
Ao perceber o nervosismo do filho a caminho da escola, no dia de voltar às aulas, em agosto, a mãe decidiu conversar e perguntar o que estava acontecendo. “É o professor Pedro”, respondeu a criança.
Abusos
Os abusos, segundo Matias, ocorreram durante as aulas individuais de matemática e no banheiro que fica próximo à quadra de esportes ao longo do mês de junho.
Em um dos episódios, o menino estava em uma das cabines do banheiro, que não tem tranca para segurança dos alunos, quando foi surpreendido pelo educador. Ele colocou o órgão genital para fora e obrigou a criança a tocá-lo, enquanto segurava a porta com o pé.
Em outra ocasião, no mesmo ambiente, José Pedro obrigou Matias a abaixar as calças e esfregou as partes íntimas por trás. Posteriormente, a avó da vítima percebeu que ele estava "assado" e avisou a filha. Na época, Mariana não desconfiava de nada e acreditava que o filho não tinha se limpado corretamente.
À reportagem, Mariana também disse que um dia o filho chegou com a marca de um dedão no braço. No dia, para despistar a mãe, ele afirmou que tinha se machucado na aula de educação física. Entretanto, na verdade, o professor havia segurado Matias com força e o obrigado a segurar seu pênis.
Na época dos abusos, uma funcionária da escola, que trabalhava na limpeza, contou a Mariana que desconfiava dos crimes. Um dia, ela esqueceu a vassoura e o balde no refeitório, espaço usado para as aulas particulares de matemática, e a porta estava fechada.
Segundo o relato da mulher à professora, ela bateu na porta e tentou abri-la sem êxito. Então, ela desceu até a secretaria para questionar quem havia trancado a porta. Após alguns minutos, José Pedro saiu do cômodo, onde estava supostamente dando aula ao Matias. Nesse dia, o menino havia sido abusado mais uma vez.
Demissão
Depois de descobrir os abusos, Mariana denunciou o colega de profissão à direção da escola. Inicialmente, o diretor ficou incrédulo com a informação, pois José Pedro, em sua visão, tinha um ótimo comportamento com as crianças. “Poderia ser qualquer um, menos o Pedro.”
Questionado pelo superior, o professor de educação física se justificou, afirmando que era apenas “uma brincadeira de mão”. Em seguida, ele foi demitido.
A pedido do filho, Mariana e Matias continuaram no colégio por mais cinco anos até ele se formar no ensino fundamental. “Ele tinha medo de ser abusado em outra escola, por isso ficamos até ele completar o 9° ano. Dessa forma, eu também estava próxima a ele.” Após esse período, a família deixou o país.
Condenação
No início deste mês, José Pedro foi condenado por estupro de vulnerável em segunda instância a 14 anos de prisão em regime fechado e preso preventivamente na segunda-feira (12).
Ele foi localizado por uma equipe da Guarda Civil Municipal na Escola Estadual Roque Celestino Pires, no bairro Caucaia do Alto, em Cotia, onde trabalhava como professor de educação física.
A Secretaria Estadual de Educação decidiu extinguir o contrato do educador. “Cabe esclarecer que no ato da contratação a investigação corria sob segredo de Justiça não sendo possível a DE saber a natureza", afirmou a pasta por meio de nota.
Outro lado
Por meio das redes sociais, o Colégio Sigma afirmou que “repudia veemente todo e qualquer ato de violência praticado contra o ser humano e que todos os esforços e cuidados profissionais em prol das nossas crianças sempre foram e são observados”. A instituição ainda alegou que a denúncia de Mariana seria uma fake news.
Até a publicação desta reportagem, a defesa de José Pedro de Andrade não foi localizada.
* O nome da vítima e da mãe foram alterados para preservar sua identidade