Aprovação do canabidiol no SUS em SP traz esperança de melhor qualidade de vida a pacientes
Ainda sem previsão de quando serão fornecidos pela rede pública, medicamentos à base de Cannabis podem ser usados para uma série de doenças
Saúde|Giovanna Borielo, do R7
"A minha qualidade de vida melhorou muito. Não porque as dores passaram, mas porque consigo ter um maior controle sobre elas. Tenho um sono de qualidade, algo que não acontecia, porque eu amanhecia muito cansada. Parecia que eu não tinha dormido por causa das dores, hoje eu consigo de fato descansar, e essa melhora pude perceber logo nos primeiros dias de tratamento", afirma Elian Bueno, de 60 anos.
Diagnosticada com fibromialgia há 12 anos, a professora de educação infantil encontrou no canabidiol um tratamento que surtiu efeitos melhores que os da medicação convencional.
Beneficiada pelo óleo de Cannabis, Elian faz parte dos mais de 187 mil brasileiros que buscam essa alternativa como tratamento para uma série de doenças, segundo dados divulgados pela Kaya Mind, empresa de inteligência de mercado no setor de Cannabis no Brasil e América Latina.
Porém, mesmo com a aprovação da Anvisa para a comercialização desses medicamentos, o acesso a eles ainda é difícil para os pacientes.
No caso de Elian, apenas 30 mg da substância custam R$ 480. Segundo a empresa, o preço de derivados nas farmácias pode variar de R$ 200 a mais de R$ 2.000.
De acordo com o Anuário da Kaya Mind, divulgado em novembro de 2022, atualmente os pacientes que fazem tratamento com Cannabis optam por três meios para obter seus produtos: mais de 91 mil pessoas a obtêm por meio de importação; 26 mil por meio de farmácias; e 70 mil via associações.
No fim do mês de janeiro, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), sancionou um projeto de lei que garante o fornecimento gratuito de medicamentos à base de canabidiolnas unidades de saúde pública estadual e privada conveniadas ao SUS (Sistema Único de Saúde).
A lei foi aprovada na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) em 21 de dezembro. No entanto, ainda não há uma data definida para a introdução dos tratamentos na rede pública de saúde.
“Estamos trazendo esperança para famílias que sofrem muito todos os dias com seus entes queridos tendo crises de epilepsia, problemas de desenvolvimento motor, de desenvolvimento cognitivo. Já temos comprovação científica de que o canabidiol resolve alguns problemas de algumas síndromes raras e temos que dar esse passo”, disse Tarcísio de Freitas, em comunicado divulgado pela Secretaria do Estado de Saúde de São Paulo.
De acordo com a pasta, a medida é de extrema importância para o estado, pois minimiza o impacto financeiro da judicialização e, sobretudo, garante a segurança dos pacientes, considerando protocolos terapêuticos eficazes e aprovados pelas autoridades de saúde.
As ações judiciais impactam diretamente o orçamento da saúde pública, privilegiando direitos individuais em detrimento das políticas públicas estabelecidas no SUS.
Além disso, obrigam o estado a fornecer produtos sem registro na Anvisa, delimitação de dose de segurança, evidência de eficácia, indicação terapêutica ou controle clínico do uso.
Tratamento com canabidiol
De acordo com o otorrinolaringologista André Cavallini, diretor clínico da Clínica Gravital, a primeira clínica médica 100% com foco em tratamentos à base de Cannabis medicinal do Brasil, os tratamentos à base de CBD (canabidiol) e THC (tetra-hidrocanabinol), dois compostos naturais encontrados em plantas do gênero Cannabis, atuam no SEC (sistema endocanabinoide).
Estudos científicos mostraram que o SEC funciona como uma espécie de sinalização celular por meio de transmissores corporais, além de ter influência direta na regulação de humor, dor, sono, regeneração muscular, função do sistema cardiovascular, respostas do sistema imune, metabolismo, sistema motor, inflamações e até na digestão. Eles atuam também nos receptores de dopamina, opioides e serotonina.
Entre os possíveis quadros em que o canabidiol pode oferecer tratamento, estão:
• Anorexia e definhamento associados a doenças crônicas (como câncer);
• Ansiedade;
• Sintomas associados ao TEA (transtorno do espectro autista);
• Dores de câncer;
• Náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia;
• Dor crônica;
• Depressão;
• Distonia (contração involuntária dos músculos);
• Epilepsia ou gerenciamento de convulsões;
• Síndromes intestinais;
• Fibromialgia;
• Enxaquecas;
• Dores neuropáticas;
• Neuropatias;
• Dependência de opióides;
• Cuidados paliativos;
• Doenças neurodegenerativas;
• Polimialgia reumática;
• Neuropatia pós-AVC;
• TEPT (transtorno de estresse pós-traumático);
• Radiculopatias;
• Artrite reumatoide;
• Espasticidade de condições neurológicas;
• Tremores.
O médico afirma que o uso de medicamentos à base de Cannabis não é recomendado para gestantes e na amamentação, pois as substâncias podem ser passadas para o feto ou pelo leite materno, e para pacientes com doenças hepáticas ou renais.
Cavallini ressalta que a maior dificuldade enfrentada pelos pacientes está na aquisição desses produtos.
"A maior dificuldade atual é conseguir importar óleos com maior teor de THC. A permissão, pela Anvisa, é de até 0,3% de THC, mas muitas doenças podem se beneficiar com proporções maiores", alega.
"Apesar de já existirem algumas medicações que podem ser adquiridas diretamente na farmácia, a maioria dos óleos, em suas variadas concentrações, só é possível pela importação. Existem associações brasileiras que cultivam e realizam a extração do óleo de Cannabis, porém a falta de testes de qualidade limita a prescrição por falta de segurança e padronização. Isso acarreta medicações com preço elevado, e a busca de nós médicos é trazer esse atendimento de forma universal e acessível a todos", completa.
Assim como o médico, Elian espera que, com a autorização do fornecimento dos produtos pelo SUS, mais pessoas tenham a possibilidade de fazer o tratamento de forma adequada, e que cada vez mais pessoas conheçam os benefícios de medicamentos à base de canabidiol e tenham esclarecimentos sobre a utilização deles.