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Cientistas do mundo todo trabalham para desenvolver uma vacina e encontrar remédios que sejam eficazes contra a covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Entretanto, o processo de busca por um medicamento é complexo e envolve diversas etapas que começam em laboratório
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O grande desafio é entender como o vírus age, quais células ele infecta e como elas respondem à infecção, de acordo com o professor Pedro Manoel Vieira do Departamento de Genética, Microbiologia e Imunologia do Instituto de Biologia da Unicamp. Ele explica que todo vírus precisa dominar a maquinaria da célula humana para se replicar, ou seja, fazer cópias de si mesmo. "Às vezes, ele usa um lipídeo [molécula de gordura] ou uma proteína para se replicar. Então, a saída é achar um medicamento capaz de inibir a célula de produzir essa proteína", exemplifica
Reprodução/IOC/Fiocruz
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Os antivirais, em geral, têm como alvo as proteínas: pode ser uma que pertença ao vírus ou à célula do hospedeiro e possibilita a replicação viral. "Mas a maioria dos antivirais disponíveis no mercado não tiveram efeito contra o novo coronavírus", ressalta. Vieira explica que existem bibliotecas comerciais com cerca de 14 mil medicamentos. Se houver grande quantidade de dinheiro para investimento, é possível testar como cada um deles age nas células
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Os testes começam em laboratório. As primeiras células utilizadas vêm do tecido de macacos. "São células do epitélio [tecido de revestimento] renal do macaco. O vírus tem um efeito muito evidente nessas células", explica. Se a droga mostrar eficácia, começam os testes com animais para verificar se ela é tóxica. "No caso da covid-19, o melhor seria testar [os medicamentos] em primatas", pondera o professor da Unicamp. "A gente testa várias concentrações para ver qual [quantidade] tem efeito. Mas até testar em humanos é um longo processo", esclarece
Hugh Kinsella Cunningham / EFE/EPA - 06.03.2020
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Só após constatar que o medicamento não tem efeito tóxico em animais, é possível dar início aos ensaios clínicos. É nessa fase que começam as investigações dos efeitos em seres humanos. "Eles envolvem, no mínimo, 40 pessoas. Quanto mais, melhor". ressalta Vieira. Foi esse o processo realizado com o vermífugo Nitazoxanida, que é chamado comercialmente de Annita e chegou a ser anunciado pelo Ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, como o medicamento sigiloso testado contra a covid-19
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A cloroquina, por sua vez, se mostrou ineficaz durante um estudo feito com 1.300 pessoas em Nova York, nos Estados Unidos, e publicado na revista científica New England Journal of Medicine. Esta é a maior pesquisa feita até agora. "O estudo mostrou que a cloroquina causa efeitos deletérios no sistema cardiovascular", observa Vieira
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Segundo o especialista, existem dois critérios principais para determinar se um remédio é seguro para combater determinada doença. Um deles é a toxicidade: o ideal é que o medicamento não tenha efeito tóxico, mas, se houver, deve ser brando. "De repente, ele [remédio] funciona para matar o vírus, mas vai te dar vários outros problemas que é melhor não tomar. Efeitos colaterais como taquicardia e distúrbios neurológicos não são aceitáveis", exemplifica Vieira. O outro é a eficácia. "Não necessariamente ele vai ser eficaz para atacar o vírus, mas pode servir para minimizar os efeitos virais no organismo e melhorar os parâmetros clínicos do paciente", afirma o professor
Agência Estado
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O especialista acredita ser mais fácil encontrar uma vacina do que um medicamento eficaz e seguro contra a covid-19. "Já fizemos isso para outros vírus, como o influenza [causador da gripe]", explica. Entretanto, ele usa o vírus HIV para exemplificar que o processo é demorado. "A gente conhece o HIV desde os anos 1980 e até hoje não há vacina ou um medicamento capaz de curar a doença. Então, não vamos resolver a questão da covid-19 em um curto espaço de tempo. É muito complicado", avalia
Carl Recine/Reuters - 30.04.2020