O senador Aécio Neves (PSDB-MG) disse nesta quarta-feira (12) que o partido pretende entrar na Justiça contra o projeto do governo federal que permite alterar a meta do superavit primário.
— Nós vamos discutir, inclusive do ponto de vista judicial, quais as demandas cabíveis porque a presidente da República incorre em crime de responsabilidade se não cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Aécio pediu para o Congresso não aprovar o projeto, que seria um "cheque em branco" para a presidente Dilma Rousseff alterar a meta, o que pode se repetir anualmente.
— Se aprovada uma medida como essa, o sinal que estamos dando é de que não há mais lei a ser cumprida. Basta que, no momento em que o governante não cumpre a lei, alterar a lei com sua maioria. Espero que o Congresso se respeite, respeite suas prerrogativas e impeça essa violência.
O tucano disse também que o projeto enviado pelo governo comprova que houve "estelionato eleitoral" da presidente Dilma Rousseff que negou ao longo da campanha que faria mudanças na meta fiscal.
— Se houvesse um Procon das eleições, a presidente Dilma estaria sendo hoje instada a devolver o mandato que recebeu. Porque ela vendeu aos brasileiros um país que não necessitava do aumento da taxa de juros, porque não tinha inflação; que apresentaria dados de diminuição do desmatamento; que estava permanentemente diminuindo a miséria no país; e que tinha suas contas em ordem.
O tucano disse que, se a proposta for aprovada, governadores e prefeitos poderão seguir o mesmo modelo do governo federal, alterando metas e descumprindo prazos.
Entenda o caso
Com gastos maiores, arrecadação menor e dificuldades para cumprir a meta fiscal de 2014, o governo federal enviou um projeto de lei ao Congresso para modificar suas obrigações orçamentárias. Com as contas no vermelho, o governo quer anular a meta prevista de superávit primário para, assim, cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal.
O projeto de lei enviado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão pretende alterar a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2014 para que todos os investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e as desonerações tributárias possam ser descontadas do superávit primário — que é a poupança do governo para o pagamento dos juros da dívida.
A LDO já permite esses descontos, mas com limite de R$ 67 bilhões. Se a lei for aprovada e esse limite acabar, vai ficar mais fácil para o governo terminar o ano com as contas aprovadas.
A lei orçamentária de 2014, aprovada no fim do ano passado, determinava um superávit primário de R$ 167,4 bilhões para o poder público consolidado (governo federal, empresas estatais, estados e municípios), sendo R$ 116,1 bilhões para o governo central (Tesouro Nacional, Previdência e Banco Central) e o restante para Estados e municípios.
No entanto, no início do ano, o ministro da Fazenda Guido Mantega anunciou uma nova meta, de 1,9% do PIB (o mesmo resultado de 2013), estimando em R$ 99 bilhões o superávit primário: R$ 80,8 bilhões para o governo central e o restante para Estados e municípios.
Com os descontos de R$ 67 bilhões permitidos em lei, faltaria ao governo federal uma economia de R$ 13,8 bilhões para atingir a meta anunciada pelo ministro — ou R$ 49,1 bilhões para cumprir a meta prevista na lei.
O problema é que, de janeiro a setembro, o resultado primário do governo central ficou negativo em R$ 15,7 bilhões (para o setor público consolidado, o resultado é R$ 15,286 bilhões negativos no período), o primeiro resultado negativo na série histórica do Banco Central, iniciada em 2002. São esses números que explicam a manobra do governo.
Se o Congresso aprovar o projeto de lei enviado hoje, a meta, então, já estará cumprida. Isso porque, de janeiro a setembro, os gastos com o PAC somaram R$ 47,2 bilhões e as desonerações chegaram a R$ 75,7 bilhões, segundo dados do Tesouro Nacional. O montante total alcança R$ 123 bilhões, superior ao exigido na lei para a meta do governo central. E esses gastos devem subir ainda mais até o fim do ano.
Com a mudança, o governo tenta garantir o cumprimento da meta e da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas sem fazer o esforço fiscal prometido para 2014.