O relator do processo contra o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no Conselho de Ética da Casa, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), afirmou, em entrevista ao R7, que a ação contra o peemedebista, por quebra de decoro parlamentar ao mentir na CPI da Petrobras, vai prosseguir no colegiado.
Nas últimas semanas, enquanto os holofotes estavam virados para o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff no Congresso Nacional, dois eventos colocaram em dúvida uma eventual punição a Cunha: a troca de um deputado contra Cunha e uma manobra de um aliado do presidente da Câmara.
Na semana passada, o deputado Fausto Pinato (SP), que trocou o PRB pelo PP, renunciou à sua vaga no colegiado e deu lugar à Tia Eron (PRB-BA). Ele havia votado pela aceitação do processo contra Cunha e Tia Eron ainda está neutra e não se posicionou.
Já o vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), decidiu limitar a investigação contra Cunha à suspeita de que ele omitiu contas no exterior – as supostas vantagens indevidas, por recebimento de propina, ficaram fora do pacote.
Apesar das manobras, o relator do processo contra Cunha no Conselho de Ética garante: “Pode haver no campo político e em outras instâncias, mas por parte do relator vai ser feito dentro das regras do processo e com base nas provas. Eu não participo de acordo”. Rogério lembra ainda que pesquisas de opinião apontam uma rejeição de 80% do presidente da Câmara.
Leia a entrevista com o relator do processo a seguir:
R7 – Todo mundo está com os olhos voltados para o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso. Mas como fica a questão de Eduardo Cunha no Conselho de Ética?
Marcos Rogério – Houve uma substituição dentro das regras regimentais. Saiu o deputado Pinato e entrou a deputada Tia Eron (PRB-BA). Considero desconfortável qualquer mudança no Conselho de Ética no curso de uma investigação. Qualquer mudança. Ela acaba criando um ambiente de suspeição, muitas das vezes injusta porque quem chega é logo rotulado: “esse é do lado do representado ou contra o representado”.
R7 – Existe alguma pista de que, com a mudança, Cunha será beneficiado?
MR - Às vezes, pode ser que não seja, pode ser que esteja ali para analisar as provas e fazer um julgamento adequado. Espero que seja esse o caso da deputada que chega, mas causa desconforto porque há essa suspeição. Você já conhecia as posições de cada um dos representantes que estavam no Conselho e essa mudança vem num momento decisivo do Conselho.
R7 – Não há uma demora excessiva para a votação do relatório final?
MR – O que eu posso garantir é que o nosso trabalho está sendo feito dentro do devido processo legal, obedecendo as regras, até para evitar qualquer tipo de questionamento que posterga ainda mais qualquer o de finalização desse processo. Estamos na fase de instrução agora, que é a coleta de provas, a busca de documentos, dos testemunhos, enfim, todo acervo probatório está sendo juntado neste momento. Eu tenho até o dia 19 de maio para concluir a instrução probatória. Na sequência, teremos 10 dias para fazer o parecer final, que vai à votação no Conselho de Ética.
R7 – Corre nos bastidores do Congresso a história de que está sendo costurado um acordo para livrar Cunha...
MR – Esse negócio de falar que está ocorrendo um acordo, uma blindagem, penso que qualquer acordo que não passe plenário é um acordo natimorto. Porque qualquer decisão do Conselho está sujeita a um recurso do plenário. Então, dizer que houve mudança de um parlamentar ou vai haver mais uma ou duas para mudar o resultado final, pode mudar no Conselho, mas se tiver recurso no plenário, ele é soberano e terá a palavra final.
R7 – Qual a imagem que Eduardo Cunha passa para a sociedade brasileira?
MR – Acho que o presidente Eduardo Cunha tem feito uma gestão que tem dado protagonismo para a Câmara, tem fortalecido o Parlamento do ponto de vista das ações do Parlamento, embora sua imagem contribua para um dano à imagem do Parlamento em razão de tudo o que está acontecendo. Mas ninguém aqui questiona a habilidade dele na condução da Casa, ninguém questiona a habilidade no uso do regimento e a liderança dele nesse processo de impeachment.
R7 – Algumas pessoas questionaram a isenção dele para liderar a votação do processo de impeachment de Dilma...
MR – Querer deslegitimar o processo de impeachment porque foi conduzido por Eduardo Cunha é de uma ignorância brutal com o que está acontecendo nas ruas. Não foi Eduardo Cunha que viabilizou o impeachment, as ruas estão pedindo uma posição do Congresso Nacional. Então, sendo ele ou outro o presidente da Casa, duvido muito que o resultado seria diferente. Acho até que se fosse outro presidente que estivesse na Casa, o placar seria maior, porque o argumento de muitos que votaram contra o impeachment ontem foi simplesmente o fato de Eduardo Cunha estar presidindo a Casa. Então, acho que querer misturar as coisas é ignorar as vozes das ruas.
R7 – Após a discussão do impeachment passar da Câmara para o Senado, quais os próximos passos do Conselho de Ética e o futuro de Cunha?
MR – Ele pode sair fortalecido do processo de impeachment porque conseguiu tocar o processo para frente, conseguiu controlar os ânimos, o que não é fácil, mas em relação ao processo contra ele no Conselho de Ética, a mim me parece na mudar nada. As pesquisas que foram feitas nas ruas durante as manifestações apontaram uma rejeição que ultrapassa os 80% dele também. Então, os mesmos que queriam uma investigação e uma eventual punição à presidente Dilma pelos crimes que cometeu, também faz essa mesma avaliação em relação a ele. Então, ontem [domingo], era o dia de julgar a admissibilidade do processo contra Dilma. Vai chegar um momento que vai ser o processo dele. Então, cada momento é um momento e cada decisão é uma decisão.
R7 – O senhor trocou de partido recentemente. O senhor mantém a posição que teve no relatório preliminar?
MR – Não existe hipótese de eu mudar meu voto. Sou o relator do processo e meu voto foi no sentido da admissibilidade da matéria. Com relação ao desfecho da matéria, não tenho voto preparado nem predisposição para condenar nem para absolver. A minha convicção sempre é formada a partir dos autos, a partir das provas do processo. Havendo provas, meu parecer é um parecer sem surpresas. Não havendo provas, também não condeno sem provas. Estou no Conselho desde que cheguei na Casa. Estou no segundo mandato e já fui relator de pelo menos três processos. Quem conhece meu trabalho no Conselho não se surpreende com os meus pareceres.
R7 – A cassação de mandato de Cunha seria exagero? Qual punição Cunha deve receber?
MR – Na condição de relator, tenho limitações nas minhas opiniões. Eu só falo de processos, de procedimento. A avaliação do conjunto probatório só será feita quando da análise para a confecção do relatório. Esta é a fase em que estou buscando as provas e, a partir das provas, eu elaborarei um relatório que será compatível com as provas. Sem acrescentar e sem reduzir.
R7 – E a hipótese de um “acordão” para livrar Eduardo Cunha de eventual punição?
MR – Posso te garantir que, da parte do relator, não tem caminho de acordo em processo que julga comportamento. Em processo que julga o cometimento de crime ou atentado de decoro da Casa, não compete acordo. Pode haver no campo político e em outras instâncias, mas por parte do relator vai ser feito dentro das regras do processo e com base nas provas que eventualmente forem coletadas. Eu não participo de acordo.
R7 – O Conselho de Ética volta a se reunir na próxima terça-feira (26). O senhor prevê mais alguma dor de cabeça com o processo contra Cunha nesses próximos dias?
MR – Eu acho que a parte mais pesada já passou.