Após cinco meses, famílias de vítimas da tragédia na boate Kiss falam em "sensação de injustiça"
Para marcar a data, 242 pessoas vão se deitar embaixo de um viaduto e soltar balões
Cidades|Vanessa Beltrão, do R7
Após cinco meses de uma das maiores tragédias da história do País, o incêndio na boate Kiss, no Rio Grande do Sul, que terminou com 242 pessoas mortas, o sentimento ainda é de injustiça, segundo o presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria, Adherbal Alves Ferreira.
— Nós estamos vivenciando um momento de sensação de impunidade, de injustiça. Até agora, nos tiraram tapetes em todos os sentidos e a sociedade que está vendo isso, não é mais os pais, o problema agora virou social.
Ferreira, que perdeu uma filha na tragédia, diz que esse sentimento é causado também pela decisão da Justiça do Rio Grande do Sul que concedeu, em maio deste ano, liberdade aos quatro homens presos acusados de envolvimento no incêndio. Para a decisão, o relator, desembargador Manuel José Martinez Lucas, alegou que os réus não apresentam riscos à sociedade e que depois de quatro meses o clamor público teria esfriado. Os outros dois desembargadores acompanharam o voto do relato. Os sócios da casa noturna, Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, e os integrantes da banda Gurizada Fandagueira, Marcelo dos Santos e o produtor Luciano Bonilha Leão estavam presos na Penitenciária Estadual de Santa Maria.
— Foi uma grande infeliz surpresa para todos nós. A sensação é de impunidade mesmo, porque foi vergonhoso a ação que os desembargadores fizeram. Eles definiram tecnicamente, o ser humano é ser humano, tem alma, sentimento, coração. Isso transpareceu que a Justiça é cega. E é cega mesmo.
O processo criminal está em curso na Justiça. Sobreviventes e uma funcionária da boate começaram a ser ouvidos nesta semana. No início deste mês, oito bombeiros foram indiciados por supostas omissões na fiscalização na casa noturna antes do incêndio.
Famílias de vítimas da boate Kiss ocupam Câmara de Veredores de Santa Maria há mais de 24 horas
No meio de todas as dificuldades, Ferreira diz acreditar que a tragédia contribuiu para uma mudança no País. Isso, segundo ele, porque após o incêndio na boate, casas noturnas foram fechadas por falta de segurança.
— O País se mobilizou de uma forma diferente.
Cinco meses
Para lembrar os cinco meses da tragédia, 242 pessoas vão se deitar embaixo do viaduto Evandro Behr, em Santa Maria, (RS) e soltar balões às 18h. O objetivo é fazer referência aos corpos das vítimas amontoados. Sinos também irão badalar no horário.
Do local, uma caminhada será realizada até a basílica Medianeira para a realização de uma celebração religiosa. Os familiares também ocupam desde a noite da terça-feira (25) a Câmara de Vereadores de Santa Maria (RS). O objetivo é pressionar a Casa a afastar integrantes da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) que investiga responsabilidades públicas pela tragédia na boate Kiss.
Incêndio
O incêndio dentro da boate Kiss no centro de Santa Maria, cidade a 290 km da capital, Porto Alegre, aconteceu na madrugada de 27 de janeiro. O número de mortos chegou a 242.
Boate Kiss: mais 13 sobreviventes da tragédia devem ser ouvidos pela Justiça nesta quinta-feira
O fogo começou porque, durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira, um dos integrantes acendeu um artefato pirotécnico — uma espécie de fogo de artifício chamado "sputnik" — que, ao ser lançado, atingiu a espuma do isolamento acústico, no teto da boate. As chamas se espalharam em poucos minutos.
Para pai de vítima, CPI da boate Kiss estava sendo camuflada por vereadores
A casa noturna estava cheia na hora que o fogo começou. Cerca de mil pessoas estariam no local. O incêndio provocou pânico e muitas pessoas não conseguiram acessar a saída de emergência. Os donos não tinham qualquer autorização do Corpo de Bombeiros para organizar um show pirotécnico na casa noturna. O alvará da boate estava vencido desde agosto de 2012, afirmou o Corpo de Bombeiros.