Guerra dos aplicativos: empresas tradicionais reclamam de pirataria
Muitas firmas dizem que disputa é desleal e apelam na Justiça para manter controle
Economia|Joyce Carla, do R7, com agências
As novas tecnologias, principalmente os aplicativos que surgem a cada dia, estão trazendo dor de cabeça para algumas empresas tradicionais. Além da disputa entre taxistas e Uber em várias cidades do mundo, outros setores estão sentindo a chegada de concorrentes e reclamam de disputa ilegal e até de pirataria.
Alguns exemplos são o setor de hospedagem que se queixa do aplicativo AirBnB, a Telefônica alegando que o WhatsApp é pirataria, e a associação de TV por assinatura criticando a Netflix.
Leia mais sobre Economia e ajuste suas contas
Confira abaixo alguns aplicativos que estão gerando uma guerra com muitas polêmicas
Uber
O aplicativo, que oferece serviço de motorista particular, simboliza essa disputa. Taxistas de todo o mundo o acusam de concorrência desleal e de transportar passageiros ilegalmente. O Uber chegou a ser banido na Alemanha e já causou diversos protestos nos Estados Unidos.
No Distrito Federal, o Sindicato dos Taxistas contabiliza perdas de 30% após a entrada do sistema no mercado e considera que se trata de uma concorrência ilegal. A presidente da entidade, Maria do Socorro Bonfim Pereira, afirma que existem leis que impedem que pessoas que não têm permissão de prestar o serviço.
Governador veta projeto que proíbe uso do aplicativo Uber no Distrito Federal
A empresa Uber se defende alegando que as atividades desenvolvidas por meio do aplicativo e a dos taxistas são distintas, e que a nova alternativa no mercado não atrapalha o trabalho dos taxistas e nem configura concorrência ilegal.
— O táxi oferece um serviço público individual de transporte, ou seja, qualquer pessoa que tenha dinheiro pode pegar um táxi na rua, fazendo um movimento com a mão. Por isso que os carros têm marcações e avisos. Já a Uber oferece uma plataforma tecnológica que conecta motoristas parceiros que promovem o compartilhamento para realização do transporte individual privado.
R7 Play: assista à Record onde e quando quiser
O presidente da Telefônica Brasil, Amos Genish, disse no início deste mês que o aplicativo não tem regras fiscais, jurídicas e regulatórias, e que reduz a possibilidade de monitorar as mensagens, o que abriria espaço para o uso em atividades ilegais.
— O fato de trabalharem contra as leis brasileiras é pirataria pura e uma parceria com eles não combina com a nossa lógica. Não vai acontecer nunca uma parceria com o WhatsApp e gostaria que outras operadoras acordassem rápido para não cooperar com uma empresa que vai contra as leis brasileiras.
O impacto na receita ou no tráfego na rede da Telefônica Brasil, entretanto, não pôde ser medido até o momento.
Outro presidente de operadora, José Felix, da América Móvil Brasil (que controla a Claro), disse que há um enfrentamento entre WhatsApp e as operadoras tradicionais, por conta da falta de "isonomia regulatória".
— Não sou contra, nem a favor, mas me preocupa a falta de equilíbrio. É inegável do ponto de vista da receita de SMS e de voz que há um impacto, mas não tenho números para quantificar esse efeito.
Felix diz ainda que a receita de voz — valor que a empresa recebe por ligações efetuadas por seus clientes — tem se enfraquecido nos últimos tempos, embora não seja possível ver qual parcela disso vem do uso do WhatsApp.
No sentido oposto, outras operadoras, como a TIM, fazem parcerias para oferecer pacotes específicos para os consumidores usarem o aplicativo na troca de mensagens, mas não incluem ligações feitas pela ferramenta nesse plano.
O SindiTelebrasil, sindicado que reúne as operadoras de telefonia, afirma que não pode se manifestar sobre o assunto, já que as empresas têm posições diferentes e que refletem a estratégia comercial de cada uma.
Netflix
Outro serviço que também está gerando polêmica é a Netflix. A ABTA (Associação Brasileira de Televisão por Assinatura) afirma que a assimetria tributária e regulatória na competição com as novas formas de entrega de vídeos (over the top – OTT) é um dos desafios para o setor de TV por assinatura.
O setor reclama que serviços como a Netflix e o iTunes, por exemplo, distribuam filmes e séries sem as mesmas regras tributárias e regulatórias das empresas brasileiras de TV por assinatura.
Em nota, a ABTA diz que “o setor de TV paga não pede privilégios, mas espera que o governo federal e as agências reguladoras encontrem soluções que garantam uma competição com isonomia entre os serviços”.
A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) afirma que os chamados OTTs são enquadrados em uma classificação diferente das operadoras de TV por assinatura e seguem regras diferentes.
AirBnB
No setor de hospedagens, a ferramenta que está causando incômodo é o AirBnB, site de aluguel de quartos e imóveis por temporada. Nos EUA, o aplicativo está em uma batalha na Justiça contra o Estado de Nova York, que acusa o serviço de competição desleal com hotéis e de prática ilegal por não pagar os impostos previstos para negócios do ramo hoteleiro.
O AirBnB tem conversado com órgãos reguladores para começar a pagar impostos hoteleiros já neste ano em mercados como Nova York e São Francisco, o que resultaria em uma cifra de cerca de US$ 21 milhões em impostos retroativos. Mas a empresa alega que a indústria hoteleira não parece interessada nisso e estaria se esforçando para o serviço não conseguir esse direito.
Aqui no Brasil, a legislação é mais flexível. O AirBnB se encaixa na lei do inquilinato, já que atividade é considerada sublocação. A lei não proíbe a prática, mas exige autorização do dono do imóvel antes do aluguel.
Mesmo assim, entidades representantes do setor hoteleiro já discutem como lidar com o aluguel por temporada. O presidente da ABIH (Associação Brasileira da Indústria de Hotéis), Enrico Fermi, diz que o crescimento desse tipo de hospedagem é explicado pelo aumento do poder aquisitivo da população.
— É uma questão incipiente e que nos causa preocupação porque são serviços ilegais, que fazem uma concorrência desleal e não pagam impostos. Tínhamos um mercado centralizado em classes A e B e tivemos um surto emergente, com 35 milhões de brasileiros que passaram a consumir turismo e, muitas vezes, recorrem a esse tipo de serviço.
Skiplagged
Esse aplicativo é pouco conhecido no Brasil, mas já está causando irritação em grandes companhias aéreas nos Estados Unidos. O que ele faz é encontrar passagens baratas para “cidades escondidas” no meio de um trajeto longo. A companhia aérea United entrou com um processo de R$ 260 mil (US$ 75 mil) na Justiça contra o Skiplagged (significado similar a abandonar um trecho) alegando competição desleal e desrespeito às regras do serviço.
Por exemplo: um passageiro quer ir de São Paulo a Brasília, mas a passagem direta é cara. No entanto, há um voo de São Paulo para Fortaleza, com escala em Brasília, que é mais barato. Assim, o aplicativo indica ao passageiro que compre essa passagem e desça do avião em Brasília. Deixando o restante da viagem (de Brasília a Fortaleza) sem usar.
Por mais que para o consumidor seja estranho imaginar que uma viagem mais distante seja mais cara do que uma bem mais curta, é comum que passagens com escala sejam mais baratas do que os voos diretos.
O lado negativo é que o passageiro não pode comprar a ida e a volta juntas, porque quando deixa de usar um trecho, toda a passagem é cancelada. E não pode despachar bagagem, porque a mala só vai ser retirada no destino final.